Entrevistas

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DO GALEGO AO PORTUGUÊS - ENTREVISTA COM ISABEL REI SAMARTIM

Entrevista em versos com José Acaci Rodrigues





ENTREVISTA COM WILARD MONTEIRO E OUTROS ARTISTAS POTIGUARES

ENTREVISTAS  EM EXPOSIÇÃO DE WILARD MONTEIRO


RENATO SILVA: SANTACRUZENSE, POTIGUAR E CIDADÃO DO MUNDO
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ENTREVISTA COM  ROBSON RAMON
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VINDA DE MÉDICOS CUBANOS, ENTREVISTA COM DR. PETRÔNIO SPINELLI
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ENTREVISTA COM O CINEASTA BUCA DANTAS
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ENTREVISTA COM O AUTOR DE MEIA PATA
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ERRADICAÇÃO DO ANALFABETISMO - ENTREVISTA COM Dra RITA JÚLIO

ENTREVISTA EM VERSOS COM O POETA ADEMAR MACEDO

REFORMA NA BANDEIRA DE JAPI - ENTREVISTA COM O PROFESSOR MACIEL - http://apoesc.blogspot.com.br/2012/11/reforma-na-bandeira-de-japi-entrevista.html

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ENTREVISTA COM MARTA FERRARO, UMA ITALIANA APAIXONADA POR SANTA CRUZ

RETORNO À EUROPA


ENTREVISTA COM CARLOS SALES (Fusquinha)  http://apoesc.blogspot.com.br/2012/04/entrevista-com-carlos-sales-fusquinha.html


ENTREVISTA COM A EDUCADORA, POETISA E MEMBRO DA ANLIC SIRLIA LIMA
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ENTREVISTA COM POETA HÉLIO GOMES SOARES - EX-VICE-PRESIDENTE DA ANLIC - http://apoesc.blogspot.com/2012/01/entrevista-com-o-poeta-helio-soares-ex.html


ENTREVISTA COM  EXPERT EM CANGAÇO E CULTURA POPULAR. LINK:  http://apoesc.blogspot.com/2011/10/entrevista-com-expert-em-cangaco-e.html


ENTREVISTA SOBRE EDUCAÇÃO COM  IVANILSON - http://apoesc.blogspot.com/2011/09/entrevista-sobre-educacao.html

GILBERTO: Caro José Mário: Peço-lhe, por obséquio, que inicie essa entrevista com uma breve apresentação. Fale-nos de sua formação, filiação e família.
JOSÉ MÁRIO: Sou advogado, formado pelo antiga Faculdade de Direito da UFRN, onde concluí o curso de Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais - Turma de 1971. Atualmente estou vinculado à Procuradoria Geral Federal, órgão que integra a estrutura da Advocacia Geral da União, ocupando o cargo de Procurador Federal, para o qual fui nomeado em 2001, após aprovação em concurso público prestado em Recife-PE, onde inicialmente fui lotado, encontrando-me hoje em Natal.
Sou filho de Cosme Ferreira Marques e Maria Pia Marques, casados em 1933, juntamente com mais 5 irmãos e 6 irmãs, nascidos entre agosto de 1939 e abril de 1959. Conheci e convivi com meus avós paternos (José Maria Marques, comerciário, e Isabel Oscarlina (dos Santos) Marques, professora),`ambos à época aposentados, e avós maternos (Mariano Araújo Barros e Serafina Maria da Conceição, agricultores no Sítio Riacho do Feijão, herdado de meu bisavô materno).
Meu avô paterno era natural de Bananeiras, filho de João Marques Ferreira, proprietário de antigo engenho de cana de açúcar que existia onde hoje é o campus da UFPB (antiga escola de Agronomia), naquela cidade. Ele com sua esposa e filhos, mudou-se para Santa Cruz em 1912, quando meu pai tinha 3 anos de idade, tendo em vista que minha avó aceitou vir trabalhar como primeira professora primária formada, tendo ela aqui desarnado várias gerações de santacruzenses, em sua escolinha pública que funcionou na Rua Elói de Souza, no primeiro quarteirão entre a Av. Rio Branco e a Praça Ezequiel Mergelino, em um antigo armazém que, coincidentemente pertencia ou pertencera a a meu bisavô materno, Manuel da Costa Palma, proprietário da fazenda Várzea Grande, no Vale do Trairi.
GILBERTO: Até que idade conviveu com seu pai Cosme Ferreira Marques? Vocês eram muito presentes na vida um do outro ou se mantinham meio que à distância?
JOSÉ MÁRIO: Convivi com meu pai desde meu nascimento em 1946, até seu falecimento em junho de 1959, sendo que, nesse ano, estava estudando em Caicó.
A convivência de meu pai com os filhos ocorria principalmente na primeira infância, quando ele, pela manhã, antes de se dirigir cedinho ao trabalho, se desvelava em dar toda a atenção ao pimpolho, ante os olhares curiosos dos irmãos menores, que também foram educados a tratarem os novinhos com todo o carinho e atenção.
(Criança nova em casa era período de festa. Começava com os preparativos para o "resguardo", durante o qual mamãe ficava absolutamente recolhida em seu quarto com o neném, amamentando-o e alimentando-se de comidas escolhidas, "não carregadas", no jargão da época, para não ocorrer qualquer complicação pós-parto. A essa altura, o recém-nascido passava a ocupar o leito do casal, com mais algum outro rebento nascido no ano anterior (aconteceu com frequência), enquanto outro um pouco mais velho era "instruído" a não mais escapulir para "o quarto de mamãe" - o que era também frequente -, por que havia criança nova e poderia ser machucada pelo intruso.)
Meu pai passava o dia no trabalho e somente o víamos nos horários de almoço e jantar, quando se sentava à cabeceira da mesa (imensa mesa que depois soube tinha sido "herdada" da escola da minha avó, quando ela se aposentou), e era cerimoniosamente servido por mamãe, em primeiro lugar, passando em seguida a servir os filhos mais novos, por ordem de idade, todos sentados em um antigo e comprido banco, que tomava toda a lateral da mesa e presumo também oriundo da mesma "herança".
Meu pai, a quem sempre vi servida uma refeição absolutamente frugal (uns dois ou três pedaços de carne cozida no feijão e farinha de mandioca, no almoço, e um prato de coalhada, com rapadura e pão, no jantar, seguidas ambas as refeições de uma generosa xícara de café, "forte de enrolar no dedo", como ele sempre gostava e pedia a mamãe, em voz forte, quando chegava em casa, eventualmente, durante o dia.
Suas refeições eram absolutamente frugais, e, até por isso, concluídas rapidamente, retirando-se em seguida, para o "batente" (Papai era o Agente de Estatística e tinha a seu cargo a Agência de Estatística do IBGE, em Santa Cruz, onde trabalhava o dia inteiro). Seu café da manhã sempre se restringia a uma simples xícara de café, das grandes, sempre muito forte. Não comia nada pela manhã.
Enquanto ele permanecia à mesa, todos os filhos ali reunidos permaneciam abolutamente silentes e respeitosos.
Após sua saída, da mesa e de volta ao trabalho, fumando um indefectível Astória - e quanto fumava! - começava a bagunça, principalmente com reclamações, ora contra a presença de um pedaço de cebola no prato, que alguns odiavam, ou de que a quantidade em seu prato havia ficado menor do que a do vizinho.
(Para mamãe isso representava uma tortura diária, pois nem sempre havia comida franca e eu vi, muitas vezes (e ainda hoje isso me revolta completamente) vê-la renunciar ao seu prato de comida em favor do reclamante, para não ficar ouvindo aquela litania. Mamãe preparava o último prato para si e este era só um pouco menos frugal do que o do meu pai, e sempre comia de pé, amassando bolinhos de feijão com a mão - pois assim é que sempre comia, com bastante farinha e uma pimentinha malagueta para temperar - mesmo sendo o feijão mulatinho, que era a regra, talvez com saudade do macaçar que raramente entrava lá em casa, pelo menos nas épocas das vacas gordas - houve também as das magras - pois ninguém gostava desse feijão. Em regra ela só comia dele, quando recebia um presente do tio Zué (Josué), ou outro irmão, que lhe trazia um cozinhado do sítio. A festa mesmo, para nós, era quando vinha um presente de espigas de milho verdinhos, para comê-las assadas, ou transformadas em deliciosa canjica ou para comê-las raladas e cozinhadas.)
Assim, até pelo grande número de filhos que tinha, meu pai se via forçado mesmo a manter uma certa distância dos filhos, o que acontecia mesmo também com mamãe, pois suas ocupações com cozinha e limpeza da casa, impedia-lhe de dedicar algum tempo aos filhos mais velhos, que ficavam cuidando os maiores dos menores, salvo quando tinha de intervir com umas boas chinelas para por ordem na bagunça após as discussões e brigas que facilmente ocorriam. Eu levei bastantes sovas, sem contar com os cascudos, tapas e safanões dos irmãos e irmãs mais velhas.
A distância também tinha o efeito de preservar a "aura" de autoridade, principalmente do pai, que era sempre convocado em situações mais graves para disciplinar os excessos e arroubos dos mais velhos que descobriam cedo como livrar-se das chineladas de mamãe, e esta perdia o controle da situação. Ao meio-dia a reclamação era feita e Papai algumas vezes aplicava umas boas "lamboradas" de cinturão, segurando o braço do incauto que se esforçava para fugir das lapadas, dadas sem dó nem piedade. E como doíam! :-)) A mim, lembro-me ter recebido de duas a três pisas, que nunca sairam de minha memória e me serviram bastante. Nunca tive raiva, nem de meu pai, nem de minha mãe, por essas sovas que foram bem aplicadas e realmente merecidas, e serviram para me por na linha, quando tive de enfrentar a barra que nos espera fora de casa.
Não havia diálogo entre mim e meu pai, mas tive a felicidade de conviver com ele sempre, logo que comecei a ficar crescido, por volta dos quatro anos de idade, pois ele me levava para o seu trabalho (acho que para facilitar a barra de mamãe, que à época tinha a seu cargo pelo menos 3 filhos pequenos), próximo da casa onde morávamos e "me entendi de gente", na rua, ao lado da Igreja Matriz, entre a casa de D. Carmen Andrade e de seu Zé Fonseca, pai adotivo de Terezinha Cury (ex-Diretora do Ginásio Normal), todos de saudosa memória.
A Agência de Estatística ficava na ruela que sai da frente da Igreja e leva até a Praça Ezequiel Mergelino, que à época era denominada de "Beco das Almas", pois por lá passavam todos os enterros em busca do velho cemitério e que à noite ficava às escuras e era percorrido em demanda da praça pelos meninos, às carreiras, com medo de assombrações. O maior terror era no meio do Beco das Almas, pois estas era cruzada por outro beco, escuro como breu e de onde acreditávamos vir a ser atacados pelos zumbis que por ali ficavam, quando os enterros passavam, sob o dobrar triste dos sinos da matriz. Mas isso é outra história - e não tão triste!
Mas lá na Agência de Estatística encontrei meu mundo, pois havia uma verdadeira biblioteca de livros os mais diversos que o IBGE editava e vários periódicos, entre os quais a revista "Sesinho" - editada pelo SESI, onde me deparei com as primeiras lições de Esperanto - mas então não as aproveitei! Quem diria, hein? Depois aprendi esse idioma, que tanto enriqueceu culturalmente a minha vida, saindo da mesmice do monoglotismo - sob os olhos compreensivos de meu pai, que me estimulava e me mostrava novidades, e até me deixava "brincar" na máquina de escrever "Underwood" da repartição, seu instrumento de trabalho, e em que, afinal, eu comecei a aprender a datilografar, sem precisar de fazer curso - que nunca fiz - de datilografia (como os tempos mudaram, agora é curso de digitalização!), fazendo os exercícios do "método de datilografia" que ele próprio me pôs à disposição, e lá se foi: asdfg asdfg asdfg asdfg etc.
GILBERTO: Conhecemos o Cosme Marques poeta e intelectual. Como era o pai Cosme Ferreira Marques? Ele tinha vícios?
JOSÉ MÁRIO: Era um pai preocupado com o futuro de seus filhos, sempre procurando incentivá-los ao estudo, pois não sendo rico e não tendo herança para deixar, como sempre ressaltava, via que cada um deveria procurar seu rumo, de acordo com as aptidões de cada um. Mas ele vibrava mesmo quando via um filho propenso aos estudos. Com que alegria ele me recebeu em seu leito de morte, apresentando-me aos amigos que lhe visitavam - e eram muitos! - com bastante orgulho, dizendo: está no seminário, estudando para ser padre! Seu maior orgulho não era ver seu filho padre - e claro que ficaria, pois era católico fervoroso, porém sem ser Carola. De fato, ele procurou de seu amigo Mons. Walfredo Gurgel (que celebrou seu casamento e esteve em Natal em 18 de dezembro de 1958, para celebrar a missa de Bodas de Prata do casamento de meu Pai (em clima de festa há apenas seis meses de sua morte, quem diria?) e dele obteve a promessa de uma bolsa de estudos para o Ginásio Diocesano, que eu, motivado pelo pré-Seminário mantido por Mons. Emerson Negreiros na Casa Paroquial, a que eu já estava vinculado, consegui transformar em minha ida para o Seminário Santo Cura d'Ars, onde estudei durante todo o ano seguinte, porém sem a bolsa - como só vim descobrir depois da morte de meu pai - tendo ele feito um esforço sobre-humano para pagar minha manutenção e preparar todo o - ainda que modesto enxoval - exigido por aquela instituição de ensino religioso.
O esforço ele fez porque sentia que eu era vocacionado para o estudo, porque alfabetizei-me pequenino, antes de ir à escola, e logo cedo, muito cedo, tornei-me um inveterado leitor e lia tudo o que me passava às mãos, lendo, às escondidas as fotonovelas da revista Capricho de minha irmã mais velha, e os livros da Biblioteca das Moças, que ela trazia da biblioteca paroquial.
Meu pai tinha muitos vícios... mas quem não os tem ou teve? Um deles, o pior segundo mamãe, era o de beber, mas sem nunca perder nem o tino - especialmente a verve do poeta e do intelectual, que ficava até mais apurada - nem o prumo, sem perder também sua extrema simplicidade e humanidade.
Mas também, pudera (!) ser responsável por uma família de 12 filhos menores, em uma cidadezinha do interior como era a Santa Cruz da minha infância (só 5.000 habitantes, hoje ela até parece metrópole!) , dependendo de um parco salário de funcionário público federal, que em regra atrasava e o no início de cada ano só começava a ser pago no mês de abril, se um cara desses não bebesse ficava louco. E sua situação ficou ainda mais difícil na segunda metade da década de 1950, quando a sociedade brasileira foi acometida do primeiro grande surto de inflação que conhecemos no pós-guerra, com o Governo de Juscelino e a criação de Brasília. Foram épocas difíceis, pois os salários permaneceram congelados durante todo o período! Foi triste!
(E Isso sentimos muito mais, após a morte de papai, quando mamãe teve de dar giros no corpo para alimentar uma família numerosa com uma pensão que correspondia a apenas 10% do que papai ganhava. Em alguns momentos sentimos a mão pesada da fome, coisa que nunca tinha havido enquanto nosso pai foi vivo. E isso se tornou mais dramático, à medida que o tempo passado e todos cresciam, o que terminou por nos decidir a nos transferir para Natal, para onde tinhamos já vindo uma irmã e eu, para darmos continuidade a nossos estudos, pois em Santa Cruz só havia o primário e o ginasial, e passamos a aqui trabalhar.)
Papai tinha outros vícios, sim. O de fumar, como já falei antes. Fumante inveterado de no mínimo uma carteira por dia. Fumar e beber, os piores, porque o fumo e o álcool, no mínimo, destroem a saúde.
(Minha mãe não reclamava do cigarro - até porque ela também fumava, se bem que às escondidas, talvez por ser cachimbo, herança de sua trisavó índia -. Ela reclamava, sim, da bebida, porque esta visivelmente estava acabando com a saúde de papai. Ela dizia que, no final, papai passava, a cada ano, 6 meses bebendo, e 6 meses de cama. Eu a ouvi dizer várias vezes: Eu preferia que Cocó (assim era de todos conhecido, Seu Cocó) tivesse uma rapariga, a que ele bebesse, pelo menos assim ele não se acabava, já que seu organismo nunca foi dos mais fortes.
(De fato, pode-se dizer que papai já nasceu doente, de parto de gêmeos, em que ele foi o rebento mais fraco. Nasceu pesando pouco mais de um quilo (1,8kg acho) e cabia numa caixa de sapato de tão pequeno, enquanto a irmã (Damiana, falecida aos 12 anos, e, daí, ele Cosme) nasceu robusta e taluda. Sinhá Antônia, a preta velha, filha de escravos, que o criou como mãe e cuidou dele desde pequena e a quem ele chamava de "mamãe" dizia que, no início, ele tinha de ser alimentado com colher de chá, pois seu estômago, de tão pequeno, quase nada cabia. Como vê, ele já nasceu frugal. Mas é aquilo que a música popular diz: "tão pequenino, tambor tão grande", ou o provérbio: "tamanho nunca foi documento!")
Mas papai tinha também vícios adoráveis, além de ser poeta. Seu vício maior era a música, seu violão. Tocava violão divinamente, solando e acompanhando as músicas que cantava tão bem, mesmo sua voz um pouco enrouquecida pelo fumo, mas que nos soava como se fosse cristalina. Meu pai, graças a esse seu vício, proporcionou-nos uma infância cheia de música quando realizava ensaios com seus amigos para alguma apresentação musical que frequentemente fazia na cidade e na Difusora Irapuru, de que foi Diretor durante vários anos, e escrevia diariamente uma crônica sobre os fatos mais recentes da vida da cidade e que era divulgada à noite, antes de ser transmitida "A Voz do Brasil".
Tocava, também, com igual maestria bandolim e cavaquinho, se bem que, em face das agruras financeiras - presumo - pouco tempo duravam esses outros instrumentos em nossa casa.
Fomos crianças privilegiadas, porque nesse tempo não havia televisão e radiolas eram coisas de ricos e estavam fora de cogitação. Mas em nossa havia diariamente música, principalmente à noite, após a ceia, meu pai ira para o jardim e nos levava a todos para ouvi-lo cantar as músicas de serestas, que ele tocava desde a juventude e seresta ainda havia.
Quando era noite de lua, ele levava colchões para o jardim e lá ficávamos até adormecer vendo a lua subir até o zênite, ouvindo todas as músicas do cancioneiro brasileiro, que nos embalavam o sono e ali normalmente adormecíamos. Tinha esse vício, sim! Mas quantos não gostariam de ter um pai com um vício assim! Ao cantar para nós, minha mãe com certeza sentia-se recompensada das agruras a que tinha de suportar ao vê-lo não chegar para o almoço, algum dia, porque ficara a prosear com um amigo em um bar e ela, ciumenta como só, imaginava ele a estar com mulheres. E ela dizia que preferia vê-lo com uma rapariga, vejam só!
Papai escrevia e escrevia muito bem, apesar de não ter sequer concluído o terceiro ano primário. Era orador de mão-cheia ou pelo menos assim parecia aos santacruzenses da época, pois sempre era chamado a discursar nas ocasiões mais importantes da cidade, inclusive nas festas cívicas do Sete de Setembro, antes do desfile escolar, que se encerravam, inicialmente, com os desfiles garbosos das escolas normal e comercial, quando essas passaram a funcionar. E os discursos eram feitos de improviso, mostrando domínio pleno do idioma e da retórica.
Ele não aprendeu a fazer nada disso, pois não havia como em Santa Cruz. Ele tinha o dom e se fez sozinho. Foi professor contratado pelo Estado para ensinar matemática na Escola Normal. Quem precisava de estudar algo mais profundo em matemática naquele tempo em Natal, procurava meu pai, a quem eu vi, muitas vezas, ainda pequenino, lecionar matemática a jovens que já à época buscavam a via do concurso público para obter uma colocação no Banco do Brasil e depois no Banco do Nordeste, tentando fazer entrar em suas cabeças noções de operações com frações ordinárias e decimais, valendo-se do exemplo da laranja, para introduzir os conceitos abstratos dos números menores do que a unidade.
Depois, um de seus alunos, Prof. Manoel Macedo, foi meu professor de matemática, ensinando-me a desenrolar-me com as expressões aritméticas, a álgebra e as expressões algébricas, de primeiro e segundo lugar. De certa forma, meu pai também me ensinou matemática!
Como vê tantos vícios, a maioria adoráveis e que qualquer um gostaria de ter.
GILBERTO: Além de poeta, que outras habilidades tinha seu pai?
JOSÉ MÁRIO: Além de pai amoroso, responsável, poeta e bom instrumentista musical, como já lhe demonstrei acima, meu pai foi antes de tudo professor, seguindo a vocação de sua mãe, D. Santinha, pois essa foi sua primeira profissão, ao que me consta, tendo sido professor, quando solteiro, em Coronel Ezequiel, á época chamado de Melão. Quando casou-se foi morar com mamãe, em um barracão de venda de mercadorias, no acampamento da construção do Açude Inharé e lecionava em uma localidade, ou sítio, chamado Riacho Fechado, na estrada para Campo Redondo, para onde mudou-se com mamãe após o término da construção do açude, continuando a lecionar nesse lugar.
Conheci-o professor de matemática da escola normal e sempre era conhecido e pelas pessoas mais gradas da cidade, como Professor Cosme e para os mais íntimos, como Professor Cocó, sendo por todos respeitados.
Era membro do Partido Trabalhista Brasileiro, fã ardoroso de Getúlio Vargas, preocupado com a extensão de direitos trabalhistas para os mais humildes, que o procuravam para obter orientação, quando em dificuldades com os patrões, e atuava muitas vezes como rábula, atuando, como defensor, para as pessoas mais pobres que não podiam pagar ao único advogado existente na Cidade. Eu mesmo o vi, orientando pessoas a tirarem sua carteira profissional e exigirem sua anotação, para preservação de seus direitos e garantia de obtenção de direitos juntos aos Institutos de Aposentadoria que à existiam aos montes, um para cada grupo de categorias profissionais. E esses direitos trabalhistas foram o apanágio da carreira política de Getúlio Vargas, em seu primeiro período de governo, que culminou com a edição da Consolidação das Leis do Trabalho, a velha CLT, que continua firme e forte no pedaço apesar dos renhidos esforços dos neoliberalistas para riscá-la fora do pedaço.
GILBERTO: Diga-nos suas palavras finais. Sinta-se à vontade quanto a informações adicionais sem se preocupar com a extensão de sua resposta.
JOSÉ MÁRIO: Obrigado, Gilberto, por sua compreensão.
Tenho todo interesse em colaborar com informações sobre meu pai, porque acho importante que se faça o registro na história da Cidade, pois ele a adotou como sua terra e sempre a sentiu como tal e durante toda a sua vida lutou pelo enriquecimento cultural da terra, no iniciativa e com outras iniciativas, como fundação de jornais e tentativa de lhes soprar vida, o que infelizmente nunca se concretizou por ausência de interesse da parte instruída da população, salvo os jovens, como ele à época, que se envolviam, colaboravam, mas lhes faltavam os recursos financeiros necessários à continuidade do projeto.
Aquilo que vc. fez recentemente de levar os artistas da terra ao palco para se apresentarem à comunidade, ele o fez várias vezes, sendo que a maior parte do trabalho era realizado por ele mesmo, aparecendo um ou outro para colaborar e dar cara às tapas em cima do palco.
Normalmente ele se caracterizava como um matuto, com algum pseudônimo (Jéca Tabua, foi o utilizado quando publicou o seu livro Canasta Véia), com seu violão apresentando emboladas, com versos falando sobre os personagens mais em voga na cidade, do político ao mais humilde, e fazendo toda a assistência dar gargalhados com o humor contido nos versos que cantava.
Eu ainda chegue a assistir um deles num teatrinho que depois virou cinema, na esquina da rua onde morávamos com a rua que passa por trás da igreja. Eu devia ter a essa época uns 3 ou 4 anos de idade. Mas está lá na memória eu, inclusive, surpreendido com o desempenho de meu pai, tão calado, tão sisudo, em casa e no trabalho. Ali ele soltava toda a sua veia artística, com a verve do poeta e se tornava um artista completo, que talvez tivesse aspirado em ser, mas que as voltas da vida lhe impediram.
Dizia de meu interesse em dar o máximo de informações sobre até para que não passe em branco o centenário de sua chegada a Santa Cruz (1912), no próximo ano, pelo menos na escola que leva o seu nome.
Papai, apesar de ter nascido em 1908, teve sua data de nascimento registrada como tendo sido 06 de outubro de 1912, ano de sua chegada a Santa Cruz. Acho que fizeram o registro às vésperas da viagem, ou logo que chegaram a Santa Cruz e erraram no ano. Mas o fato é que, oficialmente, ele nasceu em 1912, portanto no próximo ano completam-se 100 anos de seu nascimento, conforme registro oficial e também de sua chegada, com seus pais, à sua terra de adoção. No registro foi indicado Bananeiras, como local do nascimento.
Interessante é que esse erro terminou por ser causa de imenso transtorno para ele, mamãe e o restante da família, pois com o estourar da guerra, em 1942, ele, oficialmente, com
30 anos, encontrava-se no rol dos convocados para o serviço militar em tempo de guerra e, não sei se por não se ter alistado, confiado talvez no fato de já ser casado, portanto, arrimo de família, dispensado por lei de prestar serviço militar, terminou sendo preso, como desertor, e trazido para Natal onde ficou recolhido algum tempo (não sei precisar exatamente quanto), levando minha avó, aos prantos, ir de autoridade a autoridade até fazer prova de sua qualidade, como arrimo de família, conseguindo sua liberdade e evitando, talvez, sua ida à Itália, após o cumprimento da pena, para lutar e, quem sabe, ali morrer, hipótese que, se tivesse acontecido, teria privado o mundo de minha insignificante presença, pois só nasci em 1946.
Há um detalhe pitoresco, pois nasci louro, alvíssimo e de olhos azúis, terminando servindo de pilhéria para Papai por seus colegas, que, brincando, sugeriam que eu poderia ser filho de um dos americanos que àquela época também apareciam por Santa Cruz em seus períodos de folga. (RISOS)
Pilhéria meio racista, pois somos todos mestiços de cor meio melada, indefinível, produto da miscigenação do branco com índias, e aqui e acolá, uma misturazinha com um preto, daí resultando, numa ninhada de 12 filhos, quase todas as cores do arco-íris de nossas origens étnicas. Minha avó paterna era branca dos olhos azúis, mas de um físico precário, como o de meu pai. Meu avô paterno era tão baixo como meu pai, porém mais forte um pouco. Porém todos franzinos, fraquinhos, sendo meu pai não tão melado quanto meu avô, puxando à cor da mãe, mas herdando dela forte estrabismo, herdado também por três irmãs minhas e uma sobrinha, mostrando ser traço genético forte em nossa família.
Do lado de minha mãe, que tinha traços de cabocla, bem amorenada, meu avô paterno era também louro, dos olhos azúis, enquanto minha avó, cujo pai era bastante escuro, quase preto, do cabelo ondulado e a mãe de tez bastante clara, nasceu completamente cabocla, quase índia, refletindo os traços de sua bisavó, que era índia (acho que tapuia), presa pelos cabelos, após ser caçada "a casco de cavalo", pelo senhor, meu pentaavô, em algum lugar nos sertões da Paraíba, pois vieram de Araruna.
Meu avô, que era mascate de rapadura, fumo, fósforos, farinha e outros produtos aqui não encontrados, trazia essas mercadorias de Brejo de Areia (PB) até aqui Santa Cruz, inclusive ao sítio do meu bisavô, então no Riacho do Feijão, onde conheceu minha avó, caiu nas graças de meu bisavô e engraçou-se de minha avó, com ela se casando também nos idos de 1910/1912, ganhando um sítio para trabalhar e depois o próprio Riacho do Feijão, quando meu bisavô adquiriu o Sítio Várzea Grande.
Sem querer, terminaram saindo mais algumas informações sobre minha família. (risos)


ENTREVISTA COM DR EPITÁCIO, ESTUDIOSO DO CANGAÇO
GILBERTO: Olá, Dr. Epitácio! Fale-nos sobre sua pessoa, profissão e trabalhos que tem desenvolvido.

DR. EPITÁCIO: Sou médico psiquiatra por formação. Pertenço ao quadro de saúde da Polícia Militar e do Hospital Psiquiátrico Dr. João Machado, em Natal, onde resido. Trabalho em várias cidades do estado. Nasci em Catolé do Rocha/PB, “a praça de guerra”, como chama o conterrâneo Chico César, e fui criado no Patu, no médio-oeste potiguar, terra natal de Jesuíno Brilhante.

GILBERTO: Desde quando surgiu seu interesse pelo fenômeno do cangaço e o que o motivou a estudar o tema com tanto empenho?
DR. EPITÁCIO: Herdei o meu nome do meu pai Epitácio Andrade, ex-prefeito de Patu, que foi aluno do Professor Raimundo Nonato, no Colégio Diocesano de Mossoró. Doutor Raimundo Nonato é o autor de “Jesuíno Brilhante, o cangaceiro romântico”, sendo, portanto, o principal biógrafo de Jesuíno. Na minha infância, os meus pais recebiam e acolhiam o Professor Nonato em nossa residência em Patu, quando ele vinha pesquisar no acervo da casa paroquial. Talvez por meu nome significar “ofício de estado”, sentia-me na obrigação de acompanhá-lo em suas investigações. Posteriormente, passei a entender o resgate da nordestinidade como um ofício de estado.

GILBERTO: Fale-nos, em linhas gerais, sobre a figura do cangaceiro Jesuíno Brilhante e sobre o que mais chama sua atenção na pessoa dele.
DR. EPITÁCIO: Jesuíno Alves de Melo Calado, “Jesuíno Brilhante”, apelido para homenagear um tio, nasceu no Sítio Tuiuiú, na zona rural de Patu, no Oeste do Rio Grande do Norte, em o2 de janeiro de 1844, e morreu na Comunidade rural Santo Antônio, em São José de Brejo do Cruz, na fronteira paraibana, em dezembro de 1879. A sua capacidade de transformar a tragédia cotidiana sertaneja em questão política, acredito ser sua característica mais louvável.

GILBERTO: Há alguma associação entre seus estudos na área da psiquiatria e o tema do cangaço? Do ponto de vista psiquiátrico, poder-se-ia dizer que Jesuíno Brilhante, mesmo tendo vivido uma vida tão fora do comum, fosse uma pessoa normal?

DR EPITÁCIO: A violência é o principal fator estressogênico na sociedade contemporânea. Estudar os seus determinantes sociais ajuda a compreender o sofrimento psíquico das pessoas. No “Banquete dos Signos”, o poeta de Brejo do Cruz diz assim: “Discutir o cangaço com liberdade é saber da viola, da violência...”, fazendo-nos acreditar que compreendendo conflitos familiares e outros determinantes do cangaço, poderemos elaborar mecanismos de superação da violência humana, com arte, com poesia, com música. Jesuíno era um sertanejo comum até ser vítima da violência, quando partiu para o cangaço. Neste caso é preciso parafrasear outro poeta: “De perto, ninguém é normal”.

GILBERTO: Seus estudos são direcionados exclusivamente à saga de Jesuíno brilhante ou outros personagens e fatos relativos ao cangaço entram em pauta?

DR EPITÁCIO: Entrei para a Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço a convite de Kydelmir Dantas, em 2005, quando apresentei a tese: “A Importância Histórico-social do Cangaço de Jesuíno Brilhante”, defendida numa sessão de estudiosos do cangaço, no museu Lauro da Escóssia, em Mossoró. Realizei pesquisa etnográfica sobre o cangaceiro Liberato Cavalcanti de Carvalho Nóbrega, contemporâneo de Jesuíno Brilhante, inspirando o Poeta Gil Hollanda a compor o cordel “O delegado que virou cangaceiro”. Produzi, em parceria com o Coronel PM/RN Ângelo Mário de Azevedo Dantas, o artigo: “O Fogo da Caiçara – Início da Resistência ao Bando de Lampião no Rio Grande do Norte”. No momento, estou empenhado na viabilização de lugares de memória do cangaço, uma conseqüência direta da aprovação da dissertação de mestrado da Professora Lúcia Souza, de quem fui coorientador.
GILBERTO:Do ponto de vista psiquiátrico, como analisa o desejo de justiça e vingança inerente ao ser humano que busca fazer justiça com as próprias mãos?
DR EPITÁCIO: A prática da vingança é a realização da justiça com as próprias mãos, que consiste na persistência de impulsos heterocidas primitivos do animal humano. Do ponto de vista social, é a manutenção da lei do Talião: “Dente por dente, olho por olho”. É a contramão dos caminhos civilizatórios.
GILBERTO: Trace um quadro comparativo entre Jesuíno Brilhante e Lampião.
DR EPITÁCIO: Estou formulando um projeto de pesquisa que procura contextualizar a história das principais lideranças do cangaço (Jesuíno Brilhante, Antônio Silvino, Lampião e Corisco) com a evolução do diagnóstico da personalidade psicopática. Estou com 45 anos e acredito que levarei até o resto da vida pra concluí-lo, se chegar a concluir. Este projeto permitiria desenvolver, como técnica de investigação científica, uma espécie de “necrópsia psiquiátrica”. Como tenho consciência que esta não é uma tarefa para uma pessoa só, estou recebendo o suporte teórico do Doutor em Psiquiatria Ivanor Veloso; convidei o Psicólogo Júlio Cesar Ischira para ingressar no projeto; e vou convidar a colega psiquiatra Suzana Brilhante, da descendência de Jesuíno, para colaborar com esta formulação científica. Utilizo este comentário para justificar a dimensão da complexidade da resposta a sua pergunta. Se fosse realmente traçar um paralelo entre Jesuíno e Lampião, apresentaria inferências históricas, não conseguiria, no estado atual do conhecimento científico, descrever, fidedignamente, suas personalidades.
GILBERTO: O que, de seu conhecimento, já se produziu em termos de literatura culta ou popular e arte cinematográfica sobre a pessoa de Jesuíno Brilhante? Que trabalhos destacaria?
DR EPITÁCIO: Podemos dividir a produção literária sobre o cangaço de Jesuíno Brilhante em autores memorialistas, como Raimundo Nonato, José Gregório, Alicio Barreto, Frederico Pernambucano de Melo e Luiz da Câmara Cascudo, que fica na transição com os ficcionistas, como Rodolfo Teófilo e Gustavo Barroso. O menestrel Ariano Suassuna dedicou seu romance “A Pedra do Reino” a Jesuíno Brilhante. A literatura de cordel é extremamente significativa para a memória do cangaço, sendo cordelistas importantes: Rodrigues de Carvalho, autor do “ABC de Jesuíno”, Gil Holanda, Luiz Antônio de Malta e Zé de Alzerina. O comunicador Miguel Câmara Rocha editou dois números da Revista “Roteiros de Patu”, que narra o conflito dos brilhantes com os limões, com base no livro “Solos de Avena” de Alício Barreto, editado em 1905. O filme “Jesuíno, o cangaceiro”, do Cineasta ipanguaçuense William Cobbet, produzido em 1972, reveste-se de importância cultural para o Rio Grande do Norte por ter sido o primeiro, integralmente, rodado no estado e o trânsito dos atores, durante as filmagens em Natal, ter originado o nome da “Praia dos Artistas”. Destacaria duas produções culturais sobre o cangaço de Jesuíno: O espetáculo teatral “O Auto de Jesuíno”, do Dramaturgo Ricardo Veriano, editado no período de 2001 a 2008, durante a feira da cultura de Patu, e “Jesuíno Brilhante em História de Quadrinhos”, de Emanoel Amaral e Alcides Sales.
GILBERTO: Acha que se tem dado a devida importância à preservação da memória de Jesuíno ou o Rio Grande do Norte peca nesse aspecto?
DR EPITÁCIO: Não conheço iniciativas de governo voltadas para o desenvolvimento da memória do cangaço de Jesuíno Brilhante. Só conheço ações independentes, construídas com muitas dificuldades e, praticamente, sem apoio.
GILBERTO: Qual a importância de se batalhar para manter viva a memória de uma pessoa com o perfil de Jesuíno Brilhante; seria apenas um hobby ou muito mais que isso?
DR EPITÁCIO: O desenvolvimento da memória do cangaço de Jesuíno permite o alargamento da compreensão de nossa história, da história do Sertão, do Brasil e dos fenômenos sociais, ampliando nossos horizontes culturais, favorecendo a criação de alternativas de desenvolvimento sustentável para uma das regiões mais pobres do mundo. Como também, possibilita a superação de idéias e comportamentos preconceituosos, melhorando a consciência política do povo, ajudando a formar massa crítica.
GILBERTO: Que projetos tem em mente relativos à preservação da memória de Jesuíno Brilhante?
DR EPITÁCIO: Estou empenhado na viabilização de lugares de memória do cangaço, em dois epicentros principais: o município de Patu, lugar de nascimento de Jesuíno Brilhante, onde defendemos a criação de uma reserva ambiental que englobe o conjunto de serras do município, possibilitando a preservação das cavernas que o cangaceiro utilizava como esconderijo e desenvolvimento do turismo ecológico, adsorvendo-se ao turismo centrado no Santuário do Lima; e o outro epicentro é o município de São José de Brejo do Cruz, na Paraíba, lugar da morte do cangaço, onde defendemos a implantação de um parque temático do cangaço. Fora destas articulações políticas, estou ultimando a feitura do livro “A Saga dos Limões – Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante”
GILBERTO: O que se conseguiu resgatar dos objetos pessoais de Jesuíno e onde esse material pode ser visto?
DR EPITÁCIO: Recentemente, eu e Ricardo Veriano descobrimos uma relíquia que pode ter pertencido ao cangaceiro brilhante. No próximo dia 29 de abril de 2011, em Currais, numa pousada rural, estaremos apresentando o punhal de Jesuíno e estimulando um debate com estudiosos do cangaço para testar a autenticidade da descoberta. Na casa da cultura de Campo Grande/RN, encontram-se a moringa e a garrucha. No museu Lauro da Escóssia, em Mossoró/RN, está o bacamarte “Bargado”. E em Martins/RN, encontra-se o bacamarte de cano longo, pertencente ao acervo do autodidata Júnior Marcelino.

GILBERTO: Fale-nos sobre o documentário que produziu sobre o local da morte do cangaceiro.
DR EPITÁCIO: Em 2005, produzi o Documentário: “O lugar da Morte de Jesuíno Brilhante”, que apesar das limitações técnicas subsidiou o projeto, que resultou na dissertação de mestrado da Professora Lúcia Souza. O roteiro da produção é centrado no depoimento do cidadão centenário Mário Valdemar Saraiva Leão, fundador da cidade de São José de Brejo do Cruz, que apontou em visita a localidade, chamada “Serrote da Tropa”, na comunidade rural Santo Antônio, como o lugar mais provável da morte de Jesuíno, ratificando as informações dos memorialistas. O documentário tem a participação do cancioneiro octogenário Chico Mota e do repentista Zé de Alzerina, conterrâneo do Sítio Tuiuiú. Uma dupla de descendentes de Jesuíno Brilhante entoa a música de domínio popular “Corujinha”, que era cantada por Jesuíno e seu bando. Ao som de grupos culturais do município, a benzedeira Francisca de Mica encenou um fechamento coletivo de corpos, tradição ritualística dos tempos do cangaço de Jesuíno Brilhante.
GILBERTO: Conte-nos fatos relativos à vida de Jesuíno que fazem parte do imaginário popular mas não têm qualquer base histórica.
DR EPITÁCIO: O Professor Raimundo Nonato procurava, insistentemente, alguma certidão de casamento que constasse o nome de Jesuíno Brilhante como padrinho. Nunca conseguiu encontrar. Porém, na história oral do cangaceiro romântico constam inúmeras referências que ele reparava a honra de moças pobres seviciadas pelos filhos dos ricos fazendeiros da região, no seu processo de iniciação sexual, forçando-lhes o casamento. Os apologistas de Jesuíno afirmam que isso ocorria por uma questão puramente ética, que estava relacionada a moral inabalável de Jesuíno. Nossos dados apontam para a determinação econômica da ação do cangaceiro, ou seja, forçando o casamento não-programado, Jesuíno introduzia novos atores sociais na divisão da terra.
GILBERTO: Para o senhor Jesuíno deve figurar como herói ou bandido? Por quê?
DR EPITÁCIO: Tem-se que contextualizar, historicamente, as ações cangaceiras de Jesuíno. Não devemos fixá-lo num ponto dessa polaridade herói-bandido. A palavra, que julgo mais adequada para a resposta é do antropólogo Roberto da Mata, relativizar.
GILBERTO: Como diferencia o fenômeno do cangaço das gangues que controlam certas regiões pobres do Brasil?
DR EPITÁCIO: O cangaço é um fenômeno geo-histórico, que ocorreu da segunda metade do século XIX ao início da década de 40 do século XX,principalmente nas áreas rurícolas do Sertão do Nordeste Brasileiro. A alta delinqüência é um fenômeno da contemporaneidade, que se espalha nas grandes cidades, sobretudo, no espaço suburbano. No cangaço não havia intenções de tomada do poder político, simplesmente porque o líder cangaceiro era a incorporação do poder absoluto. Na marginalidade organizada, não há intenções de tomada de poder pela total ausência de um referencial ideológico. Poderíamos pensar várias outras diferenças.
GILBERTO: Que acha da abordagem dada à vida de Jesuíno na novela Cordel Encantado?
DR EPITÁCIO: É uma abordagem ficcionada, que tende a reforçar o processo de mitificação do cangaço. Algumas pessoas da produção da novela conhecem a professora Lúcia Souza, e estão articulando um encontro para conhecer a tese. O próprio ator Cauã R..., que faz o papel de Jesuíno, poderá receber algumas orientações da mestra em cangaço. Caso isso venha a acontecer, com certeza, serão assimilados elementos críticos que melhorarão a capacidade de transformação social da novela.
GILBERTO: Qual o papel e importância da leitura em sua vida, como se deu sua entrada no mundo dos livros e que autores o influenciaram?
DR EPITÁCIO: Comecei a ler influenciado por minha mãe Lourdinha Holanda e pela Professora Raimunda Cleonice Dantas, Dona Nice. Na infância, recebi a influência de Monteiro Lobato. Na adolescência, do médico Ernesto Che Guevara. Para desenvolver os estudos sobre Jesuíno Brilhante, a principal influência, foi, sem dúvidas, do Professor Raimundo Nonato. Já na fase adulta, percebo a influência de Euclides da Cunha, Josué de Castro e do Escritor peruano Mário Vargas Llosa. Quanto ao papel e a importância da leitura, não consigo identificar outro caminho que possa mais contribuir com a busca pela plenitude humana, que não seja o caminho das letras. Por outro lado, Seu João de Artur, que comanda um grupo folclórico e afirma que “ a diversão é necessária”, diz que o homem deve ser “ou bem lido, ou bem corrido”.
GILBERTO: Cite algum pensamento, trecho de livro ou poesia que aprecia muito.
DR EPITÁCIO: Um pensamento matemático-cabalístico: “Deus é o conjunto de pontos de uma esfera sem circunferência”.



GILBERTO: Caro Lucicláudio, qual a importância desse PL que obriga o poder
municipal a empregar 20 por cento dos recursos destinados à cultura para contratação de
artistas locais?

LUCICLÁUDIO: Pelo fato de buscar a democratização dos recursos destinados à
cultura faz o projeto ser importante. Temos a cultura da valorização de outras culturas,
mas o que é nosso não tem o devido valor do Poder Público e esta matéria visa a
presença de artistas locais nos eventos, e o melhor, com remuneração.

GILBERTO: Quando e em que você se inspirou para criar tal projeto?

LUCICLÁUDIO: Eu já possuía uma visão crítica sobre a atual situação pela qual a
cultura é tratada e somada a isto, houve a provocação de alguns artistas locais.

GILBERTO: Tem encontrado resistência entre seus pares para aprovação deste
projeto?

LUCICLÁUDIO: Na sessão passada tivemos alguns comentários não muito agradáveis
em relação a matéria. Mas pela importância do mesmo e pela mobilização da classe
artística, acredito que a Câmara vá aprovar tal projeto e que o Prefeito Municipal irá
sancioná-lo e torná-lo lei municipal.

GILBERTO: Alguém apresentou a alternativa de se destinar até 20% e alguns outros
acham que, ao invés de atrelar o emprego dos 20% a algum evento em que houvesse
contratações de fora, deveria constar à parte dentro do orçamento para ser usado não
necessariamente vinculado a alguma outra festividade. Que pensa disso?

LUCICLÁUDIO: Discuti o projeto com vários artistas e entendemos que o valor
mínimo a ser destinado ao pagamento dos artistas de nossa cidade é no mínimo 20%.
Qualquer coisa inferior a este valor não é digno e não valoriza a classe artística. Em
relação ao orçamento, não podemos propor mudança no mesmo quando ele está sendo
executado, apenas podemos propor mudança quando ele tramita para ser aprovado pelo
plenário e isso é discussão futura.

GILBERTO: Os vinte por cento que reivindica para a cultura local lhe parecem pouco,
muito ou suficientes?

LUCICLÁUDIO: No artigo 3º do Projeto nós propomos o mínimo de 20%, pois é
um valor bem razoável, mas se a gestão municipal pretende aplicar 30, 40, ou mais, a
proposta está aberta e os artistas e a cultura local sairão ganhando com isso.

GILBERTO: O artista e secretário de Cultura Chico César tem lutado para eximir
os recursos públicos da contratação desses mega eventos que pouco têm a ver com a
cultura local. Acha que há radicalidade na atitude dele de querer destinar cem por cento
dos recursos para fortalecer aquilo que, num certo sentido, se opõe ao desejo popular?

LUCICLÁUDIO: É um pensamento interessante, mas acredito que da forma como
os artistas locais querem se apresentar lá fora, os de fora devem se apresentar aqui
também... Agora é necessário que haja mais qualidade dos artistas contratados de outras
cidades e de outros estados.

GILBERTO: Há algo mais que deseje fazer pelas associações culturais locais?

LUCICLÁUDIO: Nós poderemos buscar o apoio da deputada Fátima para uma maior
valorização das instituições culturais da cidade. Ela tem um vínculo forte com o
Ministério da Cultura e isso deve ser melhor explorado.

GILBERTO: Muitos artistas têm uma visão romântica acerca de sua arte e acham
que "constranger" o poder municipal a isso é querer forçar a barra e tornar artificial a
busca pelo sucesso. Que diria a esses que assim pensam?

LUCICLÁUDIO: O diálogo e a luta são pertinentes em qualquer segmento. Na cultura,
acredito que deve ter muita organização, muita humildade e pouco estrelismo, pois o
salto alto não leva a nada.

GILBERTO: Que conselhos daria a todos os artistas e produtores culturais que o leem
agora?

LUCICLÁUDIO: Que busquem o caminho do aperfeiçoamento. Que leiam, que
pesquisem, que ensaiem, que se organizem, que lutem! A luta é fundamental. Como
dizia o grande Raul Seixas: “Nunca se vence uma guerra lutando sozinho”.






Em 02.07.2011, recebemos nos estúdios da Santa Rita FM o Dr Epitácio Andrade Filho, médico-psiquiatra e cangaceirólogo, membro da SBEC que concedeu entrevista ao programa APOESC Em Canto e Verso sobre seu recém-lançado livro "A SAGA DOS LIMÕES: Negritude no Enfrentamento ao Cangaço de Jesuíno Brilhante.Ouça a entrevista em



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ESCLARECIMENTO FEITO PELO ENTREVISTADO:


"Caro Gilberto,
Quero fazer uma correção: Quando me reportei ao termo "libertinagem", atribuindo-o a Mário de Andrade, estava pensando na sua viagem a Catolé do Rocha, em "O Turista Aprendiz". Peço desculpas. O termo "libertinagem" é uma obra do, também modernista, Manuel Bandeira. Obrigado." Epitácio Andrade.
Entrevistei a Hélio Crisanto, nosso conterrâneo, que participou do Forraço 2011 e ficou em uma colocação significativa.

GILBERTO: Hélio, intimamente como você se sentiu nessa finalíssima do Forraço 2011? O que significou ter chegado até esse ponto?

Hélio: Chegar a uma finalíssima do Forraço, tem sido motivo de muito orgulho para mim, levando em conta que essa é minha quinta participação e minha terceira final, estava tranquilo e confiante numa boa apresentação, o que no meu entender a fiz, atingindo uma quinta colocação honrosa, pois quem presenciou o evento sabe muito bem do nível dos competidores. Quero exaltar também o meu parceiro, maestro Camilo Henrique, que com a sua musicalidade tem dado beleza as minhas letras.

GILBERTO: Que músicas foram vencedoras?

Hélio: 1º lugar: Rebeca Ribeiro – Caminho do Sertão – 2º lugar - Santana do Matos meu torrão amado – Ivando Monte e 3º lugar – Luar do meu céu – Marcos Antonio de Carvalho
GILBERTO: Como você se sentiu quando o resultado foi anunciado?

Hélio: me senti tranquilo como sempre, e feliz pelos meus amigos vencedores, pois fiz grandes amizades nesses festivais que já participei, entendo que na música não há perdedores, e o Forraço pra mim é um momento de alegria e confraternização com essa classe artística.
GILBERTO: Como ocorreu na fase anterior, os músicos cometeram falhas na execução de sua música?

Hélio: Sim, a execução não saiu da forma como planejei, porém, entendo perfeitamente, são músicos profissionais (os melhores do estado), mas com apenas um ensaio, é quase impossível sair um trabalho perfeito.
GILBERTO: Houve alguma injustiça nesse último julgamento, algo que o deixou insatisfeito relativo à escolha ou rejeição de alguma música?

R: na minha concepção não, na mesa julgadora tinha pessoas altamente qualificadas e idôneas, como Roberto, presidente da ordem dos músicos do RN, e Roberto Lima, grande músico e compositor, entre outros.
GILBERTO: Se pudesse, que mudanças sugeriria para o próximo Forraço?

Hélio: Uma das reinvidicações, não só minha, mas de grande parte dos participantes, é que este festival possa ser também apresentado no interior do estado.

GILBERTO: Que palavras tem a dizer a todos que torceram por você nessa fase de expectativas?

Hélio: pelo número de ligações que recebi momentos antes do festival, pude perceber a quantidade de pessoas que estavam na minha torcida, amigos, familiares, enfim, agradeço de coração a todos, e os que torceram contra, paciência, não tenho a pretensão de querer agradar gregos e troianos.
GILBERTO: Participará do próximo Forraço?

Hélio: Olha quem sabe, com essa idéia da interiorização do festival (risos), até já estou trabalhando algumas novas composições.






GILBERTO:
Caro Hailton Mangabeira
diga-nos com brevidade
se foi esta a vez primeira
que esteve em nossa cidade
fale-nos o que achou
de tudo que observou
em nossa comunidade.









HAILTON:
Meu caro amigo Gilberto,
Não foi a primeira não,
Santa Cruz, uma cidade,
Está no meu coração,
Várias vezes de passagem,
Quando estava de viagem,
Lá pras bandas do sertão.

Quando escrevi um cordel,
Sobre a linda Nova Cruz,
E nele estando citada,
Sua nobre Santa Cruz,
Cidade que irradia,
Santa Rita alumia,
Com sua divina luz.

GILBERTO:
Trace de si um perfil
pequena biografia
diga-nos como surgiu
seu amor à poesia
fale-nos de sua infância
e de alguma circunstância
que lhe causa alegria.

HAILTON:
Quando eu era pequeno,
Minha mãe ia pra feira,
E na banca de cordel,
E foi essa a maneira,
Levava cordel e lia,
De tardezinha, alegria,
Na querida Mangabeira.

GILBERTO:
Quanto ao modo de viver,
qual sua filosofia?
o que mais gosta de ler
em prosa e em poesia?
cite algum pensamento
que lhe dá norteamento
nos atos do dia a dia

HAILTON
Para mim, sempre será,
A vida e o meu viver,
Baseado na história,
Da maior que pude ter,
A minha mãe, meu tesouro,
Que sempre serei calouro,
Tenho orgulho de dizer.

A leitura me agrada,
Seja prosa ou poesia,
Viagem imaginária,
E nela tudo varia,
De rico até o pobre,
De camponês e de nobre,
Tudo isso me extasia.

Einstein um dia disse,
Que nossa imaginação,
É muito mais importante,
Veja que situação,
Até que o conhecimento,
Um poderoso instrumento,
Servindo de direção.

GILBERTO:
Fale-nos de seus cordeis,
que obras já publicou
se ganhou muitos "mil-réis"
se muita grana ajuntou.
A se tornar cordelista
e da arte apologista
que(m) foi que o motivou?

HAILTON:
Já passou duma centena,
É essa maior riqueza,
Que eu tenho nessa vida,
Pois eu digo com certeza,
Dinheiro não pagaria,
a conta da alegria,
tá na cara com clareza.

GILBERTO:
Diga a nossos leitores
suas palavras finais
fale-nos de seus labores
e anseios culturais
e brinde-nos finalmente
com um texto comovente
dos muitos que você faz.

HAILTON:
Sou professor e poeta,
As palavras, meu castelo,
Pois espero que o cordel,
Cada vez fique mais belo,
A vocês de Santa Cruz,
Muita paz e muita luz,
Vai meu LIVRO AMARELO.


#Para ler o cordel O LIVRO AMARELO, da autoria de Hailton Mangabeira, clique em



Tá a fim de conhecer melhor o Hailton? Eis o link de seu blog:





Gilberto: Trace de si um perfil e faça uma minibiografia.
ROBERTO: Nasci em Natal 13/02/1969. Filho de: Roberto Gabriel de Lima e Francisca Ivaita Guilherme de Lima. Sou professor de Língua Portuguesa da rede estadual de ensino. Tenho mestrado em Literatura Comparada,e especialização em Língua Portuguesa, sou graduado em Letras pela UFRN.
Gilberto: Desde quando sugiu seu interesse pela MPB? Fale-nos do histórico de sua coleção de cds e discos.
ROBERTO: Desde cedo, fui criado num ambiente musical, sempre ouvíamos canções diariamente. Minha mãe foi quem comprou os primeiros Lps que tinha em minha casa. Ouvi muito Martinho da Vila, Chico Buarque, Paulinho da Viola, Waldick Soriano, Núbia lafayete, Ângela Maria, Roberto Carlos, entre outros. A partir daí fui dando continuidade a minha coleção de vinil. Sempre gostei de receber de presente um disco.
Gilberto: O que você classificaria como genuína MPB? Há algo que leva tal nome e que, de fato não o merece?
ROBERTO: Nada nesse mundo é definido como puramente genuíno. Nossa música é altamente mesclada de ritmos e estilos, rotulá-los não é meu papel. Sou apenas uma pessoa que admira essa tão vasta e respeitosa MPB. A MPB compreende um campo muito vasto de estilos musicais.
Gilberto: Não acha impróprio o termo “popular” para esse tipo de música? Por quê?
ROBERTO: Acho mais impróprio o termo música do que o termo popular. Porque música está ligado aquilo que é musical, tipo uma partitura, e não àquilo que é cantado. Eu trocaria o termo música por canção. Porque canção é uma letra escrita para ser cantada dentro de uma melodia. O termo popular surgiu para diferenciar as músicas clássicas (Beethoven, Ravel) das músicas (letras melodiosas) cantadas pelo povo.
Gilberto: Que pensa das ideias de Caetano Veloso a esse respeito?
ROBERTO: O que eu sempre compreendi sobre a Tropicália, movimento musical liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil, é que eles queriam juntar unindo todos os estilos musicais brasileiro. Era este o papel principal da Tropicália.
Gilberto: Caetano gravou sucessos bregas, Maria Bethânia fez o mesmo. Que pensa a respeito?
ROBERTO: Meu caro não existe nada brega na música brasileira, o que existe é um preconceito exarcebado de certas pessoas que não tem conhecimento de causa. Porque a própria palavra já diz: preconceito é um conceito prévio que certas pessoas tiram a respeito de algo que não conhece.
Gilberto: Quem você classificaria como verdadeiros ícones da MPB?
ROBERTO: Fica difícil porque o Brasil é o país dos grandes compositores, dos grandes cantores e das grandes cantoras. Todos tiveram uma grande contribuição na constituição da nossa música. Falar de alguns e deixar outros de lado, é melhor incluir todos.
Gilberto: Quais seus cantores e compositores preferidos?
ROBERTO: Se eu fosse nomeá-los passariam dos 250, portanto vou falar aqueles pelos quais sou mais apaixonado. Homens: Alceu Valença, Moraes Moreira, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Chico Buarque, Paulinho da Viola, Zeca Pagodinho, Djavan e Milton
Nascimento. Mulheres: Elba Ramalho, Baby do Brasil, Rita Lee, Gal Costa, Maria Bethânia, Simone, Clara Nunes, Marisa Monte, Elis Regina, Beth Carvalho e Tereza Cristina.
Gilberto: Que voz você classificaria como a melhor e que compositor mais o encanta?
ROBERTO: Melhor voz: Milton Nascimento Melhor compositor: Noel Rosa
Gilberto: Comente a seguinte frase, dita por Reginaldo Rossi : "A diferença entre o brega e o chique só começou a existir depois da década de 60. Quem falasse mal do regime militar era chique".
ROBERTO: O Regime Militar foi um período cruel da nossa história, isso deu margens à muitas canções, mas é claro que todas as canções feitas no Brasil,nessa época, obrigatoriamente, não deveriam ter que se referir a esse período, isso é ilógico. E nem por isso as canções que não se referissem a esse período deveriam ser taxadas de bregas.
Gilberto: A perda da militância política não empobrece a qualidade da Mpb? Não há um excesso de romantismo que poderia ser classificado como fator alienante?
ROBERTO: Não, porque a mesma elite que ouve, digamos as tais canções de protesto, é a mesma que não cumpre o seu papel quando está no poder.Na minha opinião a sociedade brasileira é mais hipócrita do mundo, porque para o brasileiro se eu estou bem não me importa o resto. Acredito que as canções de amor deveriam alertar essa sociedade hipócrita para amar mais o seu próximo.
Gilberto: Porque a MPB não cai no gosto do povo brasileiro ? Teria a ver com a música em si ou com o descaso dos meios de comunicação?
ROBERTO: Tudo tem seu tempo, tudo acontce no seu tempo.
Gilberto: Há algo a lamentar em relação a MPB?
ROBERTO: Só tenho a agradecer aos grandes mestres, interpretes e músicos do Brasil, pois é a única coisa levada a sério nesse país.
Gilberto: Nos dias atuais, como está a MPB? Pensa que ela já teve seus dias áureos?
ROBERTO: Sempre está surgindo um grande nome, um exemplo disso é a Escola de Samba PORTELA que tem lançado além dos seus grandes smbistas, uma nova safra de sambistas como Diogo Nogueira, Tereza Cristina, Dorina, Juliana Diniz e Nilze Carvalho que são sambistas Portelenses da nova geração.
Gilberto: Que discos e cds faltam em sua vasta coleção da MPB? Cite algo raro que você possui?
ROBERTO: o primeiro cd dos Secos e Molhados e um cd do cantor/compositor cubano Pablo Milanês. Faltam muitos cds para minha coleção, se eu pudesse eu teria todos os cds lançados no Brasil sem restrição.
Gilberto: Fale um pouco sobre sua tese de mestrado e diga-nos suas palavras finais.
ROBERTO: Minha tese é a respeito das canções de cunho feminino de Chico Buarque porque eu trabalho com essa fronteira do gênero entre o masculino e o feminino.
O que me faz viver ainda, nessa sociedade hipócrita brasileira, é saber que eu tenho muita gente boa para ouvir em casa. Tudo isso me dar um enorme prazer em viver.



GILBERTO
Me responda em poesia
tudo que eu perguntar
em verso branco ou escuro
não irei discriminar
fale-nos de sua infância
de alguma circunstância
que vive sempre a lembrar

MARCOS CAVALCANTI
Meu caro amigo Gilberto
Responder-lhe é bem preciso
Foram tantas as brincadeiras
Numa infância de sorriso:
Biloca, tô no poço, porrinha,
Garrafão, tica-tica, remandinha
Eis algumas que rememorizo
No palco da minha infância
Nas ruas do meu bairro Paraíso.

GILBERTO
Trace de si um perfil
em minibiografia
Diga quando despertou
seu amor à poesia
de seu apego à leitura
e grande amor à cultura
que pra sempre o marcaria

MARCOS CAVALCANTI
De quatro frutos sou o primeiro
Das árvores Quinca e Terezinha
Vivo feliz com a minha esposa
Ao lado de nossas duas filhinhas
A poesia foi gestada na leitura
E se é que eu tenho alguma cultura
Credito as quatro professorinhas:
Artes, filosofia, ciência e história,
São estas as minhas madrinhas.

GILBERTO
Grande Marcos Cavalcanti
na poesia tão forte
verdadeira sumidade
no Rio Grande do Norte
Você fica preocupado
quando às vezes é chamado
de O Poeta da Morte?

MARCOS CAVALCANTI
Se sumidade é sumido
Aceito o seu qualificativo
Mas não ligo para rótulos
Seja adjetivo ou substantivo
Se a minha poesia é forte
Tirou a força da morte
É por isso que estou ativo
Fazendo poesia necrológica
Para leitor morto-vivo.

GILBERTO
Por que o tema da morte
tem sido tão explorado?
O ter que morrer pra sempre
o deixa preocupado?
O que o faz escrever
é a vontade de ser
postumamente lembrado?

MARCOS CAVALCANTI
No Viagens ao Além-Túmulo
O tema da morte é o principal
Mas não apresenta novidades
Nada há de excepcional
A morte é apenas um processo
Como qualquer outro do universo
Um fenômeno simples e natural
Escrevo porque amo a poesia
Sem fardão ou pose de imortal!

GILBERTO
O que me dizes da rima,
do verso metrificado;
poesia é algo mais
que o verso bem comportado?
Quanto ao valor cultural
o que pensas afinal
do verso de pé-quebrado?

MARCOS CAVALCANTI
Gilberto, meu caro amigo
Eu não tenho competência
Para responder tal questão
Se a poesia é uma ciência
De medir, pesar e esquadrinhar,
Não sou eu quem vai regular
A poesia em sua essência
Nem engessar pé-quebrado
Com a minha incompetência.

GILBERTO
Que prêmios já recebeu?
que obras já publicou?
Em que palcos importantes
Você se apresentou?
nas declamações que fez
porventura houve uma vez
em que alguém o vaiou?

MARCOS CAVALCANTI
Não quero falar de prêmios
E são bem poucos, meu amigo
Não têm lá grande relevância
E estão cá, no coração que abrigo
O livro primeiro e sem acúmulo
Foi o Viagens ao Além-Túmulo
E o segundo que jaz comigo
Tem por título: Imarginário
É só isso e mais não digo.

GILBERTO
Você se diferencia
por se declarar ateu
quando foi exatamente
que a sua fé perdeu?
qual o grande argumento,
prova cabal, pensamento
que disso o convenceu?

MARCOS CAVALCANTI
Não é pouco o que me pedes
Para eu responder de repente
A fé que você mesmo tinha
Hoje já está bem diferente
E nem o melhor menestrel
Consegue por num cordel
Resposta única e convincente,
Por essa razão eu vos digo
Respeite-se o de fé e o não crente.

GILBERTO
"Sem Deus a vida é burra"
Afirma Diadorim
No Grande Sertão - Veredas.
Você também pensa assim
ou acha isso tolice?
Se acaso Deus existisse
seria bom ou ruim?

MARCOS CAVALCANTI
Sem Deuses e sem diabos na mente
Tenho vida plena, apoiado na razão
O Belo, o Bem, o Justo, a Virtude
Não são monopólios da religião
Aprendi muito com a filosofia
Com a literatura e com a biologia
Para ter a minha própria convicção
Que o mundo é como se apresenta
Seja você pelo sim, seja você pelo não.

GILBERTO
Você não acha que a fé
é algo essencial
que o mundo fica vazio
sem o sobrenatural?
A fé e a religião
não causam transformação,
evolução cultural?

MARCOS CAVALCANTI
Não quero ser tão redundante
Já lhe apresentei uma resposta
Muito simples, sincera e humilde
Não sei se alguém gosta ou desgosta
Vivo na natura, sou um ser natural
Sem metafísica ou sobrenatural
E não faço conjectura ou aposta
Que o desenvolvimento da cultura
Tenha só na religião a mesa posta.

GILBERTO
Que coisas da natureza
mexem com seu sentimento?
Recite um belo poema
e um belo pensamento
nas relações pessoais
quais conceitos morais
regem seu comportamento?

MARCOS CAVALCANTI
Das coisas da mãe natureza
Tudo me traz contentamento
A chuva, o mar, a serra, o sertão,
A flor, o sol, as estrelas e o vento,
E nas ações e relações interpessoais
Não alimentar preconceitos sociais
Andar na Lei, ter bom pensamento
Ser solidário, justo, amável e educado
Eis ai, meu poeta, o que sustento.

GILBERTO
O que é a poesia
para Marcos Cavalcanti?
por que defende a cultura
de maneira desgastante?
Nas batalhas que enfrentou
que sucessos alcançou
e qual se mostrou frustrante?

MARCOS CAVALCANTI
A poesia é o olhar de uma criança
É o assoviar sibilante do vento
É o leite da mãe que do seio brota
Para saciar a fome de seu rebento
Já a cultura, só enriquece, não desgasta
Passadista, ultramoderna ou iconoclasta
É luta sadia e sem arrependimento
Viver é combate! Disse um grande poeta
E eu faço disso, meu mandamento.

GILBERTO
Na cultura erudita
cite alguém que o fascina
e um que bem represente
a cultura nordestina
ainda dentro do tema
o que pensa do poema
Morte e Vida Severina?

MARCOS CAVALCANTI
Você me pede dois nomes
Mas um só nome diz tudo
Não há que se fazer distinção
O que seria um absurdo
Cultura erudita ou popular
Nas duas se pode conjugar
Um só nome “severino” , graúdo
Mais de cem livros nos escreveu
Mestre Luís da Câmara Cascudo.

GILBERTO
Qual sua maior virtude
e qual seu maior defeito?
política e religião
merecem nosso respeito?
E este mundo esculhambado
destruído e maltratado
acha que ainda tem jeito?

MARCOS CAVALCANTI
Analisou sua vida, Montaigne
Em seus ensaios imortais
“Conhece-te a ti mesmo”,
Ensinou Sócrates aos demais
Se eu tenho alguma virtude
Que com o tempo eu não mude
E os defeitos que são tantos e tais
Se transformem neste mundo absurdo
No mais nobre entre os nobres metais.

GILBERTO
Você mandou escrever
em palavras garrafais
ao lado de sua casa
assim: "Poesia e Paz"
entre Paz e Poesia
qual delas escolheria
qual dos termos vale mais?

MARCOS CAVALCANTI
Meu caro poeta Gilberto
Um mundo de poesia seria a paz
Um mundo de paz seria pura poesia
Essa conta, meu amigo, não se faz
Paz e Poesia são como dois estribilhos
São também como dois filhos
Não me pergunte qual vale mais
Porém uma coisa eu lhe garanto
Amo a poesia e o pacifismo contumaz.

GILBERTO
Fale sobre Santa Cruz
ressaltando seus valores
Suas últimas palavras
dirija a nosso leitores
e fale com emoção
de sua associação
de poetas e escritores.

MARCOS CAVALCANTI
Santa Cruz é o meu berço
É o meu torrão mais querido
Não há palavra que descreva
O que por ela tenho sentido
Ressaltar seu valor, a sua cultura
Por meio da arte e da literatura
É molhar no já bem chovido
A ASPE, sou eu, é você, quem quiser
Venha e serás mais um comovido.





Em 30.04.2011 tivemos o privilégio de entrevistar em nosso programa APOESC Em Canto e Verso importantes figuras: Lúcia de Souza, Gil Hollanda, Dr Epitácio Andrade, Pôla Pinto e Josivaldo. Discorremos sobre a vida de Jesuíno Brilhante, em prosa e verso.

Entrevistadores: Gilberto Cardoso e Hélio Crisanto.






Adquira obras da autoria do cordelista ADRIANO BEZERRA pelo (84)99017248



GILBERTO: Olá, Adriano! Fale-nos sobre sua pessoa e trabalhos que tem desenvolvido.

ADRIANO: Olá Gilberto, eu sou uma pessoa calma, amo muito a minha família, valorizo muito uma boa amizade e me considero um grande admirador da cultura em geral.Sou membro da ASPE e já participei de duas antologias poéticas na cidade de Santa Cruz: "Trairi em Versos" em 1997 e "Cantos e contos do Trairi" em 2008.Aprecio todos os estilos de poesias mas me identifico mais com a literatura de cordel, estilo esse em que já publiquei três trabalhos: "O Assassinato da Pequena Isabella", "O Sequestro e Morte de Eloá" e "O Resultado das Drogas", e em breve estarei publicando "O Doutor e o Agricultor".

GILBERTO: Quando foi que você se percebeu poeta e começou a escrever?

ADRIANO: Eu desde criança, quando tinha aproximadamente 12 anos de idade, lia bastante literatura de cordel com temas de romance, valentia, comédia, etc.Apartir daí comecei escrever pequenas coisas. Mas foi mesmo aos 15 anos após a morte do meu pai, que escrevi um cordel com 42 estrofes em sextilhas(não publicado) relatando a sua morte e desde então continuei escrevendo até os dias de hoje.

GILBERTO: Que trabalho seu você considera melhor?

ADRIANO: Os três trabalhos que publiquei foram muito elogiados pelos leitores, mas acredito que, "O Resultado das Drogas" tá repercutindo mais por ser um assunto que mexe com a vida de muitas pessoas, não só aqui na nossa cidade, mas em todo o mundo.

GILBERTO: Fale-nos sobre a importância da leitura em sua vida.

ADRIANO: A leitura para mim é tudo, pois sem ela jamais teria lido quando criança a literatura de cordel, e não teria aprendido com isso, a escrevê-la também.Sem a leitura, também teria deixado de desfrutar de todos os belos poemas que já li.Enfim, sem a leitura, nem mesmo estaria respondendo a essa entrevista.

GILBERTO: Que visão você tem da arte no Trairi e especificamente em Santa Cruz, nos dias atuais?

ADRIANO: A arte aqui na região do Trairi é riquíssima e vem crescendo a cada dia.Nós temos artistas muito bons em todos os estilos de artes.Mas, o apoio à eles ainda é muito precário, o que impossibilita os mesmos de chegarem a um lugar de destaque.

GILBERTO: Deixe-nos, como despedida, um de seus poemas prediletos, de autoria própria ou não.
"O Velho Desprezado"

Como sofre o velhinho
Que só, vive desprezado
Vivendo no seu cantinho
Por todos abandonado
Cabisbaixo e tão sozinho
Recordando o seu passado.

Descem as Lágrimas serenas
Molhando o seu rosto antigo
Esperanças são pequenas
Debaixo daquele abrigo
Como se cumprisse penas
E esse fosse o seu castigo.
Sua memória respira
O seu tempo de atrás
Sua lembrança suspira
As coisas que foi capaz
De fazer na sua estira
E que hoje não faz mais.

Por ele não tem ninguém
Se foi a sua senhora
Família também não vem
Só observam por fora
Sua idade já além
Só espera à sua hora.



Eu e Hélio Crisanto em apresentação no lançamento do livro do cordelista José Acaci.

O compositor, cantor, declamador e poeta popular Hélio Crisanto, autor do excelente livro Retrato Sertanejo é vice-presidente e um dos fundadores da APOESC. Você pode ouvi-lo todos os sábados pela santaritafm.com a partir das 8 h.

Hélio, por ele mesmo:

Sou caboclo, sou menino
Filho da mãe natureza
Companheiro das estrelas
Cantor da dor do universo
Amante da lua branca
Sou poeta e quebro a tranca
Na destreza do meu verso
Na rima boa e ligeira, sou canoa
E em corredeira viro água
E não temo, aprumo forte o meu remo
No rumo, um encanto puro
Nas quedas das cachoeiras
Meu canto traz o aroma
Da cantoria brejeira
Sou cria que não se doma
Perfume que não se vende,
Não se prende, só se cheira
Sou filho da seca bruta
Sou fruta pêca no cacho
Quando choro sou riacho
Que desemboca na gruta
Sou planta e cheiro de mato
Sou um Brasileiro nato
Sou fulô de catingueira.



GILBERTO: Olá, grande poeta Hélio! Fale-nos sobre sua pessoa e trabalhos desenvolvidos.

HÉLIO: Sou uma pessoa simples, um pouco recatada, amante da arte e da cultura, desenvolvo um trabalho poético e musical há 15 anos, participo de saraus nas escolas, recentemente lancei o meu primeiro livro intitulado “Retrato Sertanejo”.

GILBERTO: Como foi despertado seu amor pela cultura popular e que contribuição a leitura teve na sua vida?

HÉLIO: Bom, desde criança ouvia o meu pai recitar versos de cordéis pra mim, especialmente do grande cordelista Leandro Gomes de Barros, também me encantava com os cantadores cantando na feira livre e tudo isso mexia muito com a minha imaginação, e logo cedo comecei a rabiscar os meus primeiros versos e adentrar no mundo da literatura.

GILBERTO: O que tem a nos dizer sobre a cultura popular nos dias atuais e especificamente em Santa Cruz e na região do Trairi?

HÉLIO: Diria que infelizmente a nossa cultura ainda está engatinhando, pelo fato da pouca produção literária e por existir um pouco de preconceito e discriminação por parte do poder público

GILBERTO: Deixe-nos um de seus poemas prediletos, de sua autoria ou não.

HÉLIO: "Quando a dor se aproxima
Devastando a minha calma
Passo uma esponja de rima
Nos ferimentos da alma" (Autor Desconhecido)



Gilberto Cardoso dos Santos e João Maria de Medeiros em exposição de cordeis.





ENTREVISTA COM JOÃO MARIA

GILBERTO: Olá, poeta João! Fale-nos de sua pessoa, do trabalho e de seu amor pela poesia.

JOÃO MARIA: Olá, Gilberto, fico muito lisonjeado em ser entrevistado!
Sou uma pessoa que gostaria de vê um mundo melhor, com mais justiça social, com as pessoas vivendo em harmonia entre si e o meio.
Sempre tive uma simpatia muito grande pela poesia. Adoro a poesia de Manuel Bandeira, Ferreira Gullar, Carlos Drummond de Andrade, o Cordel de Patativa, etc...etc...
A poesia tem muita importância. Diverte, denuncia, critica, elogia, desenvolve o raciocínio. Presta um grande serviço à sociedade...



GILBERTO: Que visão tem da cultura popular e do modo como tem se desenvolvido em Santa Cruz?

JOÃO MARIA: Quanto a cultura popular, o nome já diz tudo, é a cultura do povo, das raízes do povo. Ela enfrenta o poder todo tipo de dificuldade: falta de apoio, discriminação da grande mídia, falada , escrita e televisiva. Assim mesmo ela está viva e resiste bravamente . Aqui em nossa região não é diferente: falta apoio, sofre a discriminação, chegam a dizer, por exemplo, que isso é coisa de velho. Lembra-se daquela vez em que estávamos em um evento, eu , você,o poeta Hélio Crisanto, apresentando nossos trabalhos quando uma jovem senhora olhou pra você e disse: "Tão novo, escrevendo cordel". Lamentável...

GILBERTO: Que obras já publicou e qual considera mais importante?

JOÃO MARIA: Já publiquei três obras: "A História de Santa Cruz em Cordel","Uma História de Luta",Um Negro na Casa Branca".
A mais importante foi "A História de Santa Cruz em Cordel", pois retrata toda os acontecimentos mais importantes vividos pelo povo do nosso município. Infelizmente nem todos pensam assim. Estou recompensado: fiz a minha parte, não é mesmo?

GILBERTO: Que perspectivas tem quanto ao desenvolvimento da arte na região em que vive?

JOÃO MARIA: Quanto ao desenvolvimento da arte na região, vejo que há possibilidade de crescimento. Mas a cultura como um todo na região não é valorizada! é fato.
Um grande abraço e meu agradecimento pela entrevista. Fico muito feliz e agradecido em poder dizer o que penso e mostrar o meu trabalho, que pode até não agradar a todos, mas que faço com muito cuidado e determinação.

GILBERTO: Você é um dos pilares da instituição chamada APOESC. Que nos diz sobre ela?

JOÃO MARIA: A Associação de Poeta e Escritores de Santa Cruz (APOESC) foi criada por pessoas comprometidas com o desenvolvimento da boa literatura na nossa cidade e na nossa região. E, apesar do pouco tempo de existência, tem conseguidos bons frutos. Dentre esses bons frutos podemos citar a aprovação de um projeto cultural pelo BNB que deverá ser desenvolvido brevemente.



GILBERTO: Brinde-nos com um poema que muito lhe agrada, de autoria própria ou não.

JOÃO MARIA: Vou apresentar um dos meus poemas mais recentes que recitei na E. E Cosme Marques, em homenagem ao dia "Dia das Mães:
A Luta dos Professores


Vou falar de uma classe

Que vem sendo esquecida

Por nossa sociedade

Tem sido desmerecida

Não dando o real valor

Para o nosso professor

Que é o artesão da vida.



É uma atividade mãe

Das outras atividades

Mesmo assim é preterida

Desprezando as qualidades

Divinas do magistério

Isso vem desde o Império

É falta de prioridades.



Mesmo sendo importante

Pra formar o cidadão

Pra formar advogado,

Médico, juiz, escrivão

A via é o professor

Que educa com amor,

Mas não recebe atenção.



Quando algum aluno seu

Não termina aprovado

A culpa é do professor

Que tem sido desleixado,

Mas quando algum tem progresso

Do aluno é o sucesso

Por ter bastante estudado.



Cito aqui esses exemplos

Da desvalorização

Dessa atividade bela

Que leva o cidadão

A caminhar-se na vida,

Mas nunca é reconhecida

De receber atenção.



Na luta do dia-a-dia

O mestre é afetado

Por muitas dificuldades

Que tem se multiplicado

E cada vez aumenta mais

O trabalho que ele faz

Vem sendo menosprezado.



O professor sofre muito,

Permanece injustiçado

Trabalha sem ter direito

Ao direito assegurado,

Nem licença tira mais,

O Piso ficou pra traz

Com seu valor defasado.



O que me deixa intrigado

A cada nova eleição

Quando candidatos pregam:

“É vez da educação!”

Porém, ao serem eleitos

Procuram logo seus jeitos

De inverter a ação.



Dos governos atuais

Têm sido sempre enganados

Greves em cima de greves

É um dos recursos usados,

Mas mesmo com acordos feitos

Eles não pagam os direitos

Meses antes acordados.



Durante esses embates

Por questões salariais

O maior prejudicado

É a moça, é o rapaz

Que procura estudar

Para a vida melhorar

Deles e de seus velhos pais.



Do jeito que a coisa vai

Quem vai querer ensinar

Para toda criançada

Aqui, ali e acolá

A enfrentar desafios

Não ficando a ver navios

E melhor rumo tomar?



Quem vai querer ensinar

Os valores fraternais

De amai-vos uns aos outros,

Mesmos sendo desiguais

A consciência política,

Que é uma virtude rica

Como os valores morais?



Quem vai tentar acabar

Através da educação

Toda essa violência

Que assola a Nação

No seio da sociedade

Sendo uma realidade

Que precisa de ação?



Quem vai tentar dirimir

A nossa desigualdade

Combatendo o preconceito

E todo tipo de maldade

Como a corrupção

Quem vai salvar a Nação

Dessa tal barbaridade?



Quem vai querer ensinar

Que a droga só faz mal

Que a droga é uma droga

E o destino é fatal

Para quem é viciado

Sendo também um pecado

E um desvio de moral?



Para o Brasil crescer

E ser uma bela nação

Tem que fazer como fez

A Coreia e o Japão

Como fez a Espanha e Cuba

Para que o Brasil suba

O meio é a educação.



HOMENAGEM ÀS MÃES

VOU FALAR DE UMA FLOR
DO JARDIM DA PROVIDÊNCIA
SER QUE TEM BOA QUERÊNCIA
DE NOBRES E DE PLEBEUS
É UMA CRIAÇÃO DE DEUS
QUE SABE BEM O QUE FAZ
ELA SEMPRE CUIDA MAIS
DOS FILHOS AO SEU REDOR
NUNCA QUER VÊ O PIOR
QUER VÊ-LOS NA SANTA PAZ!
A MÃE SENTE MUITOA DOR
QUANDO O FILHO NÃO VAI BEM
MAS LHE DAR OS PARABÉNS
QUANDO ELE TEM SUCESSO
E ATINGE O PROGRESSO
INDO BEM NA SUA ESCOLA
MAS QUANDO ELE SÓ NAMORA
E NÃO PROCURA ESTUDAR
ELA VIVE A LAMENTAR
E RECLAMA TODA HORA!

João Marias de Medeiros Dantas

































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