MARIA
BOA FARÁ PARTE?
Diogenes da Cunha
Lima
A
questão foi levantada pelo jornalista e acadêmico Cassiano Arruda Câmara. Será
legítima a não inclusão de Maria Boa, Maria de Oliveira Barros (1920-1997), dos
museus de Natal e Parnamirim, que celebram entre nós a Segunda Guerra Mundial?
A História não é feita apenas por
pessoas santificadas, mas por personagens que tiveram atuação de importância na
vida social.
Um contingente norte-americano de militares,
sediados nesta cidade, valorizou a empresária da casa noturna. Tanto assim, que
a aeronave militar B-25, número 5079, teve pintado na fuselagem o nome Maria
Boa.
Os norte-americanos também patrocinaram
médicos para garantir a higidez da saúde genital das meninas de Maria,
como graciosamente as nomeava Câmara Cascudo.
Maria,
na década de 1940, comandou um dos mais famosos cabarés do Brasil, instalado no
final da Rua Padre Pinto, antiga Rua do Fogo. Os grifos enfatizam a
correlação da linguagem popularesca.
Maria Boa, jovem e linda, fora seduzida
em Campina Grande pelo Promotor Público, líder político local. Conta-se que o
senador Dinarte Mariz tentou resolver o problema familiar. Notou-lhe a visão
empresarial. Trouxe-a para Natal a fim de montar uma pousada.
A
“Instituição” com novo destino dava certo orgulho à cidade. Era o ponto de
encontro de homens bem sucedidos, empresários, políticos, artistas estrangeiros,
professores famosos, poetas. Os visitantes usavam como pretexto a excelência da
culinária servida. O prato mais famoso era feito com frango caipira e ervas
especiais, o galeto al primo canto.
Natal
reconhecia algumas virtudes em Maria. Era pessoa discreta, caridosa, praticante
de religião.
Certa
vez, um morador vizinho promoveu ação cível pedindo ao juiz a retirada do lupanar do seio da família natalense. A
defesa, feita pelo advogado Roberto Furtado, juntou ao processo documento com
as assinaturas dos moradores da vizinhança no qual se declara que “a boate de
Maria de Oliveira Barros não incomoda ninguém”. Resultado: ação julgada
improcedente.
As
profissionais do sexo não tinham qualquer direito à proteção jurídica. O
advogado doutor em Coimbra, Paulo Lopo Saraiva, ingressou com ação trabalhista
reclamando aviso prévio com o fechamento da casa, férias, décimo terceiro
salário, adicionais noturnos. O fato criou polêmica. Dei o meu aplauso à
iniciativa do jurista.
Muitos
anos depois, Paulo Lopo veio a meu Escritório com duas de suas clientes do
passado. Pediram meu prefácio ao livro escrito por uma delas, Juracy
Jones. Fiz com prazer. Sobretudo porque
ouvi de Juracy que não interessava o êxito da ação. Ela ganhara: pela primeira
vez na vida, ela sentiu ser uma cidadã, pessoa não apenas com deveres, mas também
com direitos.
Bons
escritores testemunharam o protagonismo de Maria. Ela está no monumental livro
dos 400 nomes de Natal pela vontade de Rejane Cardoso.
Maria
Boa merece inclusão, presença e memória nos Museus.
Diógenes da Cunha Lima (poeta, prosador e compositor) é advogado e presidente da ANL (Academia Norte-rio-grandense de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
Foi Presidente da FJA, Secretário de Estado; Consultor Geral do Estado; Reitor da UFRN; Presidente do CRUB. Atualmente, dirige o seu Escritório de Advocacia e preside a ANL (Academia de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
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