terça-feira, 8 de março de 2022

RAÍZES: MEU CANTO DE LIBERDADE - Jair Elói de Souza

Xilogravura de  J. Campos

RAÍZES: MEU CANTO DE LIBERDADE

Nasci pelas mãos ternas e trêmulas de uma comadre* que fora convidada em cima da hora de ouvirem meu berro. Lógico que não havia a espada de Herodes para tirar a vida de primogênitos como fora feito no primeiro século cristão.
Tive a liberdade que o nazareno não teve. Daí a razão de ser essa persona que podia andar pelos campos abertos caçando ou colhendo mel de abelhas sem ferrão ou mesmo pescando nas aguadas do Piranhas sem sofrer constrangimento.
Dormi no silêncio fétido e escuro do porão da Casa do Estudante, por longos períodos, até ir pernoitar nas entranhas de um quartel, que pude de forma sutil e destemida, fazer minha tenda de leitura, mesmo sabendo que poderia a qualquer instante ouvir o tinido das baionetas me estocando para cumprir prisão pelo fato de ser afeito à leitura.
O calvário pelo fato de ser militante de centro-esquerda, católico e admirador da teologia da libertação, e ainda arvorado na condição de militante vencedor do DCE, e depois abraçado o canudo de um curso teórico em bacharelado em Direito na UFRN, somados às leituras que foram razoáveis.
Tudo isso, não me distanciou das minhas raízes e do meu mundo aldeão. Os meus ícones passavam pela figura do vaqueiro, do homem amansador de burros bravos, dos que tão bem cultivavam o ofício de versejar em ponteio de viola, pandeiro ou Rebeca e ainda os puxadores de fole de oito baixos.
Dos homens que conduziam os rebanhos pelas serrarias em épocas de seca. Ou cultivavam os arrozais nas lagoas e baixadas do Seridó. Mas, sobretudo dos formidáveis contadores de estórias e histórias que faziam a festa dos povos ibéricos e dos que povoaram os sertões no rejeito dos gados vacum.
De ressaltar o papel dos mestres escolas, escribas do saber e do ensino, com sua gana de inserir os seus conhecimentos naquelas pétalas que brotavam para a vida.
Pois sim, apesar dos apelos da docência e da advocacia, por muitos anos, o meu mundo é a cena da minha aldeia primitiva, procuro pintá-la como Leon de Tolstoi, para que uma certa aldeia amanhã venha a ser universalizada.

*Comadre: parteira, obstetriz.
J.E.S.


Escritor, Advogado e Educador


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