quarta-feira, 25 de novembro de 2020

A FALA DO POVO - Diogenes da Cunha Lima

 


A FALA DO POVO

Diogenes da Cunha Lima

 

         Em nosso tempo, os gramáticos, os cultores da linguagem erudita, estudam e respeitam a fala do povo, patrimônio de inestimável valor. O poeta Manuel Bandeira foi dos primeiros a valorizar “a fala certa do povo”.

         A língua portuguesa, universal, possui riquezas inconcebidas. Diferença de falares no cotidiano de cada lugar que a adota. Tem razão o escritor Manoel Cavalcante ao afirmar: “A fala obedece ao chão”. 

         Singular e fortemente expressiva é a comunicação nordestina. Somos apegados às origens. O nosso português é mais próximo do que era falado nos séculos XVI e XVII. Alguma coisa temos da língua da Galícia. No interior, ouvimos pedir um copo dauga (de água), oxe mesmo (em vez de hoje mesmo), vamo xantá (vamos jantar). Oxente é ô gente. Aliás, galego refere-se ao alourado, estrangeiro.

         No Brasil inteiro, substitui-se o pronome nós pela expressão a gente. O diminutivo carinhoso tem uso por aqui. Pixototinha para pequena menina e pixititinha para coisa. No poema de Ascenso Ferreira (“As Naus de Manuel Furtado”), Maria, a de braços roliços e de peitos maciços, pedia ao português apatacado uma das naus que ele teve por herança de sua tia. Ainda mais pixititinha.

Ninguém esgota o tema.

Escritores de nível superior identificaram a beleza e expressividade da fala brasileira. Entre eles, João Ribeiro Antenor Nascentes. Câmara Cascudo deu-me o privilégio de escrever as orelhas e publicar o seu “Locuções Tradicionais do Brasil”. Já havia escrito “Coisas Que o Povo Diz”.

       Os acadêmicos Oswaldo Lamartine e Paulo Balá exaltaram a fala do povo, dando-lhe o brilhante polimento urbano.

         Muitas vezes, confundimos com gíria o que é de linguagem antiga e clássica. São outros quinhentos está registrado em um dos autos de Luís de Camões.

         Continuamos a ouvir, ainda que desprezada pelos “escolarizados”, a expressão prumode (por amor de) e mode, Mode significa para, a fim de, que possibilita fazer.

         Vambora, ou simplesmente bora, é um convite de viagem. E elisivo: vamos em boa hora.

         É sabido pela maioria que os pronomes oblíquos átonos se ligam aos verbos. Entretanto, é possível vê-los junto a um advérbio. A alegria de quem encontra uma coisa perdida, e exclama: “Taquilo”!

         Esta pode ter função vocativa. Nas feiras, ouvimos: Quanto custa o abacaxi, essa menina?     

         A língua coloquial é espontânea, natural. É mais leve, aliciante, revestida de fluidez. Fale o povo.


Diógenes da Cunha Lima (poeta, prosador e compositor) é advogado e presidente da ANL (Academia Norte-rio-grandense de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil). 

Foi Presidente da FJA, Secretário de Estado; Consultor Geral do Estado; Reitor da UFRN; Presidente do CRUB. Atualmente, dirige o seu Escritório de Advocacia e preside a ANL (Academia de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).

 

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