quarta-feira, 9 de agosto de 2023

LUTA FORA DO RINGUE

 


LUTA FORA DO RINGUE


Tornou-se um famoso campeão de boxe. Bati mais do que apanhei, senão não tinha recebido o cinturão de ouro. Dizem até que ele entrou para a categoria dos pesos-médios para suprir seu complexo de inferioridade. É mentira, eu entrei mesmo foi para derrubar os caras que queriam tomar minha namorada. Uma das características dele era sua rapidez utilizada para furtar goiabas no quintal do vizinho. Aqui e acolá eu dava um tiro de sal para espantá-lo, pois toda goiaba que vingava ele ia lá e comia. Aproveitaram sua ausência para dizer isso, senão teriam sido derrubados. Fui ao banheiro. Perdi alguma coisa? 

Também dizem que ele deixou uma jumenta lhe dar um coice na cara para ficar contando vantagem pelo nariz deformado. Agora fosse! Foi murro, negro velho, até espirrar sangue. Tá pensando o quê? Depois dos treinos tinha os pega com pernadas, chutes, cotoveladas, osso quebrado, tampo de cabeça arrancada, tudo que fosse violência eu estava dentro.  

As famílias, tanto da mãe quanto do pai, eram ricas. Acho irrelevante colocar isso na sua biografia. Bote, senão vão dizer que eu comecei a treinar para ganhar um prato de sopa que o treinador distribuía entre seus alunos. Tomava sopa todos os dias porque gostava de pigorar. Mas... Deixe assim porque fica chique dizer que a pessoa que fez sucesso passou por dificuldades. Não esqueça de dizer que sou formado. Casou-se ainda na universidade e tiveram três filhos, cada um mais feio do que o outro. Assim é demais. Eles só ficaram com os rostos amassados depois que os esmurrei para batizá-los no esporte.  

Após certo tempo de casado, cinco anos para ser mais exato, começou a pensar em deixar a mulher. É verdade! Dá para ficar calado? No entanto foi ela que fugiu com o pintor que ele havia contratado para dar uma geral na sua casa. Ah, se eu pego aquele desgraçado. Com a fortuna adquirida com os títulos, resolveu investir em uma revista de arte, só parando quando se desiludiu ao entrar em um banheiro público e ver a edição que ele figurava na capa sendo usada como papel higiênico. Fiquei mais triste do que ao perder o cinturão de ouro. Desiludido com a revista e o casamento, resolveu iniciar uma nova aventura com uma mulher que o assessorava, porém logo em seguida desistiu quando ela chegou ao ponto de precisar de um carrinho de mão para se deslocar de tão pesada que era. O problema é que ela quebrava a roda toda semana, da carroça.

Por ter ficado desocupado por muito tempo, resolveu escrever sua trajetória publicando um livro que ninguém leu, com exceção dele e de um bêbado que ele lhe dava cana. Depois que deixei de fornecer cachaça, aquele pinguço, filho de uma égua, rasgou a obra em cima da sinuca do bar. Ah, cabra safado 

Naquela época, montou uma casa de apostas e todo o dinheiro arrecado perdia na roleta do vizinho. Só fechei a casa porque não aguentava ver as pessoas cuspindo no chão e urinando nas paredes, só isso. Depois de uma vida frustrada... Peraí, longe disso. Faço terapia, mas isso é normal, qualquer um faz. Resolveu ser um leitor compulsivo ao colocar como meta concluir dois livros a cada dia. Nem dormia direito para poder bater essa meta, isso é verdade. Aborreceu-se e resolveu ser andarilho. Colocou uma trouxa na cabeça, contudo voltou da esquina com medo das chuvas que poderia pegar no caminho. É, só não fui porque não tinha guarda-chuva. Tentou se alistar para ir à guerra. Eu queria sair de dentro de mim, mas fui rejeitado. Atualmente vive me pagando para que eu registre sua vidinha de merda achando que isso vai fazer dele um ser especial. Vidinha de merda pode ser a sua. Está demitido.


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 09.08.2023 – 09h33min.



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