segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

POLIAMOR - Heraldo Lins



Praia de Ponta Negra, (foto ilustrativa)



POLIAMOR


O divórcio está sendo providenciado, todavia, tem na mente que quer um homem só para ela. Este já é casado. Como vou lhe apresentar aos meus filhos? O coroa da mesa ao lado não tira os olhos, mas nem se deu ao luxo de esconder a aliança que usa na mão esquerda. 

Ela sente uma certa vergonha em se mostrar de biquíni na praia em que estão. Durante sua vida de vinte e dois anos de casada, foi podada em sua liberdade de mulher sensual. Minha irmã, você ainda está enxuta! Daqui a pouco vai chover pretendentes. Ah! já estão vindo, mas tenho que ser seletiva!  

Os irmãos já perceberam a investida do coroa “bem-vistoso”. Neste final de semana, a família está reunida em uma casa alugada na beira da praia. Agora, na condição de separada e com filhas crescidas, olha ao redor e percebe a vida com um certo distanciamento. 

O ex-marido deve estar saboreando a novinha pela qual decidiu abandonar seus filhos lindos, estudiosos e obedientes. Ela se esconde atrás das crias, como sempre fez. Suas amarguras não permitem que faça uma foto sorrindo. Levante a cabeça, minha irmã, sorria e olhe para a câmera. Quero levar essa para Mato Grosso. Ela finalmente obedece ao irmão que lhe quer bem. Lembra-se dele carregando-a no colo quando machucou o joelho. Nem precisava, mas ele sentia prazer em protegê-la. 

Como é bom estar naquele lugar. Vai entrando no mar com o short por cima do biquíni composto. Meu celular está nessa bolsa. Se tocar deixe tocar. Não se sente preparada para se expor, ainda mais com alguém estranho lhe observando. O possível substituto do seu ex-marido segue pulando as ondas. Conversaram debaixo da barraca, durante meia hora, mesmo sendo um estranho, foram aproximados pelo "Pintou o clima". 

Na conversa fugidia, ela soube da sua "solteirice" de final de semana. A mulher dele concorda com o poliamor, e até o incentiva a buscar mais uma pelas praias lotadas, de preferência, mulheres do interior. Ela, ao contrário, não concorda. Já chega de problemas. 

Este outro, pulando ondas à sua frente, deve ser milionário. Sua corrente e o bracelete de ouro não são para qualquer um. Como se arrisca com estas joias em plena muvuca? Vamos, princesa, a água está ótima.  

A maré baixa os deixa longe dos olhos curiosos. Venha mais para o fundo. Aos poucos vão se aproximando. Aqui é tranquilo, confie em mim. As filhas gêmeas estão jogando frescobol na areia. O adolescente, não larga o iPhone. Acho que aqui na cintura já está bom. Não quer que eles a vejam com conversinhas com outro homem que não seja seu pai. Ainda está recente a separação, entretanto, os cinco meses sem um beijo, fala mais alto. 

Percebe três homens musculosos por perto. Não se preocupe, são meus seguranças. Ela fica aterrorizada. Sente-se refém daquele homem. Tenho mais dois na praia. Sempre teve medo de sequestro. Estamos seguros, nem se preocupe. Os irmãos distantes tiram-lhe a esperança de recuar. O homem se aproxima mais um pouco. Suas pernas tremem. Se quiser passear de lancha, aquela está à minha disposição. Ela mergulha sem sair do lugar. Lá embaixo decide não subir tão cedo. Há um esmorecimento agradável em seu corpo. Não é medo, apenas um desejo de ser possuída. Com o fôlego no final, emerge.

Pensei que ia morar lá embaixo. Sua conversa mansa é acompanhada com um sorriso de ouro e brilho de diamante. Ela está encantada e se deixa beijar... e beija... se abraçam... as ondas os separam... ela relaxa em seus braços, oferecendo-lhe a boca carnuda para mais um. Nesse vai e vem das ondas, sente-se amada por inteiro.

À noite, em sua rede, fica respondendo mensagens do homem encantador que conheceu pela manhã. Mãe, não gostei de ver a senhora se beijando com aquele homem na praia. Calma rapazinho, deixe suas irmãs falarem. Sempre tiveram conversas abertas onde prevalece o diálogo sincero. As meninas já sabem o que é homem, e agora são suas acusadoras. Logo elas que pediam camisinhas quando lhes faltavam. 

Está saindo a picanha! entra no quarto o irmão com o churrasco no espeto. Ainda bem que este maluco veio quebrar a tensão. Vamos pessoal, tirem seus pedaços. É de graça! O outro chega com a farofa. Não tem como ser infeliz naquela algazarra. Olha a farofa chegando aí, gente! Naquela família as portas sempre ficaram abertas, igual ao sorriso dos seus membros. 

Um carro de som convida a família para o alpendre. O que danado é isso, mãe? O homem enviara profissionais para cantar parabéns para ela. Essa é boa! Seu aniversário já havia sido comemorado na barraca de praia. Será que está sonhando?

Os irmãos estão sendo conduzidos de volta ao aeroporto. Uma das filhas dirige um veículo, e ela, o outro. Que pena que as férias chegaram ao final. Ela pensa em ir morar onde estão bem de vida. Precisa só do diploma de enfermeira para ir ganhar a vida por lá. No aeroporto, encontra o dono da empresa aérea. Sejam todos bem-vindos, principalmente, você, minha querida. Ela fica paralisada ao reconhecer aquele sorriso.

No mês seguinte, vai morar com os irmãos. A distância daquele que o conheceu na praia, não é problema. A ponte aérea é grátis, mas prefere ficar dois anos por lá com os irmãos e o filho. Quer esquecer por completo o lugar onde sofreu o desprezo do seu ex. 

Estarei aí, no Natal! Na ligação ela está super eufórica. Por gentileza, vão me esperar no aeroporto. As lembranças dos filhós feitos em sistema de mutirão, a levam para o sítio distante da capital. Estou morrendo de saudades! Quero ver meus netinhos. As gêmeas tiveram filhos na mesma data. Que coincidência! Ficaram mais bonitas depois de mulheres feitas. Sim, estaremos lá, mamãe! Queremos ver nosso irmão Eduardo. Deve estar um homenzarrão.  Pelas fotos, Eduardo já aceitara o homem estranho perto da sua mãe. 

É o menino de vovó? É a sua cara, mamãe! Parece muito com a senhora. Cadê seus maridos? Vocês nunca postaram fotos deles para que eu “curtisse”. Sempre desconversavam quando eu tocava no assunto. Aqui está um presente para a senhora. Fizemos uma foto todos juntos. Acredito que a senhora irá gostar.  

Olá! que bom ver a família reunida! O homem do sorriso de ouro a beija. Mamãe já recebeu o presente. Abra para ver suas filhas, os netos... sorri o homem. Por que será que insistem tanto para que eu abra este presente? Cuidado com a bagagem. Trago presentes para todos. E papai, como está? Este presente é a foto da nossa família, mamãe. Ah! agora irá conhecer os maridos das filhas. Dois anos achando que elas haviam optado em serem mulheres de programa. 

Ao ver a foto do pai das crianças, desmaia, não acreditando que aquele homem ao seu lado, tivera a coragem de trai-la com suas filhas gêmeas. 


Heraldo Lins Marinho Dantas

Santa Cruz/RN, 22.01.2022 ─  19:19













4 comentários:

  1. Numa relação poliamorosa há lugar para filhós, mas não para filhos. Um texto saboroso. - Gilberto Cardoso dos Santos

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  2. Realidades transmitidas atravez da arte das cronicas

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  3. Em alguns trexos me indentifiquei

    "Quer esquecer por completo o lugar onde sofreu o desprezo do seu ex"

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