terça-feira, 3 de agosto de 2021

O UBERNISTA - Heraldo Lins



 O UBERNISTA  


Ontem viajei de Uber. Durante o percurso ouvi a vida resumida do condutor. Contou-me que sua mulher estava com câncer e que ele, mesmo na terceira idade, precisava continuar trabalhando.  


Aparentemente, quando jovem, era fanfarrão e mulherengo. Essa avaliação faço escondido dele, nem sei se era. Ele continuou dizendo que estava pagando dois mil reais de juros a um agiota para usar vinte mil no tratamento daquela que o suportou bêbado. Essa avaliação de que ele era um cachaceiro, também é da minha doentia mente. 


Ele continuou dizendo que havia sido caminhoneiro... pensei: deve ter sido o caminhoneiro que tirou dez cópias do registro de nascimento para casar-se com mulheres diferentes. Estelionatário, isso é o que é. Pensa que não conheço sua história? 


Eu disse que só não lhe ajudaria porque não era da sua família, e que a dele era muito ruim por não querer contribuir. Ele sorriu e passou a me elogiar dizendo que ainda bem que existem pessoas como eu que entende o sofrimento alheio. 


Meu discurso foi acalentador. Falei que o seu sofrimento não era nem uma infinitésima parte do que Jó havia sofrido. Que ele era um abençoado por estar com saúde e disposição para amparar sua querida esposa. Disse-lhe ainda que aproveitasse esse momento para se purificar, assim, jamais iria se queimar no fogo do inferno.


Depois que saí do veículo, pensei: ainda bem que não gosto de julgar as pessoas.

      

   


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 15/06/2021 – 09:45

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comentários com termos vulgares e palavrões, ofensas, serão excluídos. Não se preocupem com erros de português. Patativa do Assaré disse: "É melhor escrever errado a coisa certa, do que escrever certo a coisa errada”