José Mário Marques (filho)
Ainda sem revisão, Gilberto. Minha irmã, Lúcia, descobriu caderno com cópias da maior parte dos poemas deixados por meu pai, ainda inéditos.
Lúcia e Socorro, minha irmãs, localizaram esta pérola, entre os papéis de meu pai poeta (ainda sem revisão):
SAUDADES DO TRAIRI
Cosme Ferreira Marques
Para o livro Terra Abandonada, em preparo. O autor.
Composto em 24-04-1959, 38 dias antes de sua morte, quando o autor se encontrava convalescendo de cirurgia no antigo Hospital Miguel Couto (hoje Onofre Lopes), no Bairro de Petrópolis, em Natal-RN.
I°
Chove, e esta chuva
Faz brotar no coração
Saudades do Trairi
Das terras de meu Sertão...
II°
Aqui eu fico cismando
Nêsse quarto de hospital
Ouvindo todo bulício
Dessa bela capital
III°
De como é diferente
Do meu querido Sertão
A própria chuva não é
Como as de lá, isso não...
IV°
Quem quizer ver a beleza
Da terra da promissão
Onde a mão da natureza
Deu-lhe toda perfeição.
V°
Vamos embora comigo
Esqueçam um pouco aqui.
Estamos a dar um passeio
Nas terras do Trairi
VI°
Sentir comigo a natura
Fertilidade e bonança
Andar em meio a fartura
Da terra que é sustança
VII°
Aqui existem belezas
Belezas artificiais
Existem cinemas, hotéis
Avenidas, hospitais
VIII°
Igrejas belas bonitas
Praias e diversões
Mulheres de lábios pintados
Rapazes que são folgazões
IX°
Existe sim tudo isso
Mas, sem aquela beleza
Com que dotou o Sertão
A nossa mãe natureza
X°
Há coisa mais bela no mundo
Do que a tarde se ouvir
Nos baixios e mufumbais
O gemer da juriti?
XI°
O romper da madrugada
Quando o sol se abre pro chão
Com preguiça vem chegando
Pra clarear o Sertão...
XII°
E começa o lufa-lufa
Cada qual para o trabalho...
O vaqueiro sai a campo
A ver a rez, de tresmalho.
XIII°
Cantando pelas estradas
Vão as lindas caboclinhas
Pros afazeres do campo
Bem cedo de manhãzinha...
XIV°
E cantando alegres da vida
Risonhas, pelas estradas
Juntam-se a seus cantos
O canto da passarada.
XV°
E quando é ao meio dia
Prepara-se o nevoeiro...
Azul pesado de chuva
Com pouco vem o aguaceiro.
XVI°
E a chuva cai, haja água
Nas terras do meu sertão
Risca o relâmpago no céu
Ribomba ao longe o trovão
XVII°
Entra a noite e chove ainda
É aquela gostosa inverneira
Cantam os sapos nas lagoas
Com a música das goteiras
XVIII°
De quando em vez no curral
Chama a vaca o bezerrinho
Num mugido tão saudoso
De amor materno e carinho!
XIX°
Passa a chuva e lá no céu
A lua cheia enamorada
Cobre as terras do Sertão
Doutra chuva prateada.
XX°
Vamos comigo, citadino,
Deixa a civilização
Vem sentir toda beleza,
Que mora no meu Sertão.
Dr. José Mário, quero felicitar a família por tão precioso achado. Decerto que o tempo e o zelo pela preservação da memória de seu pai transformarão a descoberta numa Canastra Nova, pela qual conhecermos ainda mais o amor que seu pai devotava a sua terra adotiva, Santa Cruz. Esta pérola da uma boa amostra do tesouro escondido nesta nova canastra. Parabéns!
ResponderExcluirObrigado, Marcos, pelas palavras de incentivo ao resgate dos poemas de meu pai, que morreu sem publicar seu segundo livro, para o qual escolheu o título de "Terra Abandonada", por sugestão do também poeta Sanderson Negreiros, irmão do saudoso Mons. Emerson Negreiros, que eram ambos seus amigos.
ExcluirPelo que vi, tudo foi recuperado e estão sendo digitalizados, pouco a pouco, tendo em vista a necessidade de preservar os originais, já sujeitos às vicissitudes da umidade e do tempo, graças à contribuição de Isabelle, uma das netas do poeta, filha de Socorro.
No que depender de mim, farei tudo para trazer a lume o livro, dentro do qual, para minha surpresa, que até então se sentia meio órfão, foi descoberto um poema a mim dedicado, quando completei 2 anos de idade.
No livro "Canastra Véia", publicado em 1946, após meu nascimento, não havia nenhum poema a mim dedicado, única exceção entre os 6 filhos até então nascidos.
Tem muita coisa boa no material encontrado, exsurgindo ali toda a veia poética do autor assim como algumas de suas crônicas, com elementos de informação valiosos sobre personalidades e história de Santa Cruz, que meu pai adorava, como se fora sua terra natal, sem desprezar a verdadeira.
José Mário Marques
Obrigado, Marcos, pelas palavras de incentivo ao resgate dos poemas de meu pai, que morreu sem publicar seu segundo livro, para o qual escolheu o título de "Terra Abandonada", por sugestão do também poeta Sanderson Negreiros, irmão do saudoso Mons. Emerson Negreiros, que eram ambos seus amigos.
ResponderExcluirPelo que vi, tudo foi recuperado e estão sendo digitalizados, pouco a pouco, tendo em vista a necessidade de preservar os originais, já sujeitos às vicissitudes da umidade e do tempo, graças à contribuição de Isabelle, uma das netas do poeta, filha de Socorro.
No que depender de mim, farei tudo para trazer a lume o livro, dentro do qual, para minha surpresa, que até então se sentia meio órfão, foi descoberto um poema a mim dedicado, quando completei 2 anos de idade.
No livro "Canastra Véia", publicado em 1946, após meu nascimento, não havia nenhum poema a mim dedicado, única exceção entre os 6 filhos até então nascidos.
Tem muita coisa boa no material encontrado, exsurgindo ali toda a veia poética do autor assim como algumas de suas crônicas, com elementos de informação valiosos sobre personalidades e história de Santa Cruz, que meu pai adorava, como se fora sua terra natal, sem desprezar a verdadeira.
José Mário Marques