Voltei à Escola
Agrícola “Vidal de Negreiros” onde cursei o ensino médio. No banheiro, um senhor
na porta cobrava R$ 2,00. Pedi que me deixasse entrar, pois tão logo
providenciaria o dinheiro: _Só mediante pagamento adiantado_ foi o que disse.
Saí indignado:_Volto a minha escola e sou tratado assim?_ Com lágrimas nos
olhos acordei. O sonho foi depois que assisti a uma reportagem em que policiais
militares vão administrar escolas públicas do estado de Goiás ao custo de R$
1.500,00 reais ao ano por família e, desempregado, o pai de uma das alunas diz
que vai tirar a filha da escola: “Eu não tenho condições. Como fica para alguém
sem emprego?”
A nossa escola tem
profundas marcas do militarismo. Até aí nenhuma novidade. Fardamento,
disciplina, atividades, castigo, portões fechados, corredores... são heranças
desse modelo. O que chama atenção é o “aprofundamento de relação” e o processo
sorrateiro de terceirização da educação pública, em meio a discussões por uma
educação inovadora, inclusiva e pela desmilitarização da polícia.
Segundo a reportagem, “A
Secretaria de Educação de Goiás garante que quem não puder pagar terá vaga
garantida em outra escola pública e de graça”. Está claro nesta fala, nada
eufêmica, o discurso segregado de que o estado de Goiás vai dispor de uma
escola para os que podem e outra para os filhos de pais que não podem custear, numa
segunda milha, uma melhor escola para seus filhos. Entretanto, até para aqueles
que “não se adaptarem ao projeto”, fica “resolvido” aí o inciso constitucional
de que educação é direito de todos e dever do Estado. E assim chegou o dia de
nosso contracheque determinar em que escola pública matricular nossos filhos,
depois da cobrança de pedágio nas estradas e antes de nossa conta bancária
certificar de vez nosso acesso a determinados procedimentos médicos ofertados
pelo SUS.
Atento a este processo
de mercantilização do público, mais especificamente da educação e de passagem
por um município vizinho, observei um carro de som fazendo propaganda de um
curso de pedagogia ministrado por uma instituição privada. Os atrativos eram aulas
uma vez por semana, brindes e garantia de diploma daqui a três anos. A
impressão é de que fazem anúncios de cursos para formação de professores igual
se empurra panfletos de produtos de supermercado por debaixo de nossas portas. Na
Finlândia, por exemplo, país que se destaca em educação, esse mesmo professor
leva sete anos para se formar, dos quais três anos é residência pedagógica e, ainda
aqui no Brasil, segundo estudos da professora Bernardete Gatti, que serve também
para as duas escolas do estado de Goiás, 69% do curso de Pedagogia são apenas
teoria, os outros 31% são muitas vezes teoria sobre a prática.
Eu vi há pouco que de
olho no repasse de recursos do MEC, um gestor municipal anunciou em blogues o
sorteio de uma moto para atrair matrículas de alunos em suas escolas de Ensino
Fundamental no início deste ano letivo. Ora, sem querer abordar as estatísticas
de morte por esse meio de transporte a serem consideradas numa decisão
pedagógica, nem pretender discutir aqui questões que implicam numa possível incoerência
educacional, diante do que prever a Legislação Nacional de Trânsito com relação
a menores enquanto condutores; num país onde educação é levada a sério no
mínimo o sorteio seria de livros ou procurariam conquistar alunos pelo seu
diferencial pedagógico.
O exemplo mais forte que
vem de Goiás só confirma as dificuldades tremendas em avançarmos na mudança de
paradigma da educação e pior, não conseguimos desvencilhar-se desse formato de
escola que já provou não irá redimir o país. Sempre entendi que educação e polícia
repressiva atuam em lados opostos, mas há os que justificam esse tipo de atitude
como meio de contenção à violência que adentrou os muros das escolas. Nestas horas
referências a Paulo Freire, pensamentos de Rubem Alves, experiências de Emilia
Ferreiro... só molduram nossos trabalhos acadêmicos e provam que nos apropriamos dos conceitos de Educação
como redenção, reprodução e transformação
da sociedade (SAVIANI, 1987) apenas
para fundamentar as nossas teorias. Na prática mesmo chamamos a polícia e
impomos ordem na casa.
Ótima reflexão, Maciel.
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