domingo, 23 de janeiro de 2022

MUTAÇÕES NA PANDEMIA - José da Luz Costa

 



MUTAÇÕES NA PANDEMIA

 

Infelizmente, aproxima-se o triste aniversário de dois anos da Covid-19 em terras brasileiras. No início, lá longe na China, o vírus saía do berço. Aqui ainda havia um ilusório sentimento de que estávamos protegidos na América do Sul, do outro lado do mundo. 

Claramente, já sabemos que o vírus é um ator global, capaz de representar qualquer papel nos mais diversos e adversos cenários. Escalado para o ataque, o vírus desafia as defesas no campo das ciências médicas. 

Diariamente, continuamos a ouvir a gritaria nervosa e exaltada e histérica das arquibancadas, onde se agrupam o preconceito, a superstição e o negacionismo numa torcida macabra e funesta.

Politicamente, o vírus entrou em campo aberto, enfrentando um time sem comando técnico e tático. Desacertos e lambanças exigiram mudanças de regras no meio do jogo. Improvisações equívocas voluntárias fizeram baixas no vestiário político e no obituário nacional.

Economicamente, juiz e treinador e jogadores não acertam o passe. A bola sempre escapando pela lateral. O concerto desafinado faz subir as críticas e os preços. Acordaram o dragão da inflação. Luz, comida, combustíveis. Tudo pouco e caro. Sobram: medo e fome e insônia.

Comercialmente, acompanhando o ritmo mutacional do vírus da pandemia, os empresários do setor de alimentos diminuíram a embalagem e a quantidade de muitos produtos populares, mas não se envergonharam de aumentar os preços “promocionais”. 

Religiosamente, com os templos fechados, foram convocados incitantes apregoadores de patamares e altares, como gandulas responsáveis para repor a bola nas quatro linhas das redes sociais e arrebanhar a torcida verde-amarela dizimista dos bancos penitenciais.

Culturalmente, cinemas e teatros e circos com as luzes apagadas. Autores e artistas censurados, ofendidos, abandonados e vistos como inimigos da “nova era”. Instituições extintas e recursos deslocados para projetos alinhados ao louvor do “Brasil acima de todos”.  

Cientificamente, as vacinas chegaram como reforços contratados para combater a propagação do vírus e reduzir o placar alarmante de mortes. Mas contra-ataques baixos e ilegais tentam tirar de campo pesquisadores, médicos e técnicos que apoiam o jogo limpo.

Ideologicamente, agentes anônimos disfarçados de arautos públicos incendeiam com fake News a sensível animosidade de seguidores que formam a legião armada e desalmada, inquieta por montar suas trincheiras na praça dos poderes.

Juridicamente, a lei sustenta a ordem e as instituições defendem o progresso. Magistrados e militares, de senso e de consenso, estão no mesmo gramado verde-amarelo como protagonistas da paz e da liberdade.

Pessoalmente, no ano de Copa e Eleições, ainda em meio às mutações da pandemia, desejo que as bandeiras das disputas do politibol sejam desfraldadas sob o hino da alegria, do respeito, do compromisso e da transparência. 



José da Luz Costa

Natal, janeiro/2022.

  




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4 comentários:

  1. Caro José Luz, sua crônica expõe com precisão o que temos vivido durante essa pandemia. Seus anseios, felizmente, parecem representar o da maioria do povo brasileiro. Isso nos permite ver luzes crescentes no fim do túnel. Parabéns pela maestria com as palavras.

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    1. Obrigado, caro Gilberto, pelo espaço acolhedor e pela motivação constante.

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  2. Caríssimo Zé da Luz, sua crônica resume bem demais os momentos difíceis pelos quais temos vividos. Nunca imaginei passar por esse momento de pura barbárie. Se não fossem nossas instituições democráticas, acho eu , estaríamos passando por momentos ainda piores.
    Parabéns por usar com maestria e responsabilidade o uso das palavras.
    Grande abraço.

    João Maris de Medeiros

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    1. Valeu, prezado João. Não há como conter nossa indignação diante de tantas coisas ruins...

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