A
VIDA DAS PALAVRAS
Diogenes da Cunha
Lima
As palavras têm vida. Nascem, crescem,
nobilitam-se ou se degradam, mudam de forma e de sentido e morrem. Costumam durar mais que uma vida humana. As
palavras dormem nos dicionários até que um pesquisador lhes dê novo sopro
vital.
As
línguas são compostas por elas, as palavras, e também são mortais. A humanidade
ainda desfruta de cerca de 6.800 línguas, algumas delas em via de extinção. O
processo de globalização, com o domínio do inglês e o fortalecimento do mandarim
chinês, traz neologismos e, ao mesmo tempo, extingue falas.
Relembrando
ter sido professor de português, pretendo divertir o leitor comentando inesperadas
origens, uso e desuso em função de exigências sociais.
No
Direito, já não se pode falar em bastardos, ou em filhos ilegítimos.
Em verdade, todo filho é legítimo. A usança de “mãe solteira” é absurda. Mãe é mãe.
Ninguém não mais se “desquita”. O Instituto foi substituído por um mais poderoso,
o divórcio.
Não
existe mais o concubinato, ninguém é amancebado. Valoriza-se a união estável.
As
favelas são hoje comunidades. Os barracos transformaram-se em construções
irregulares.
Palavras
agressivas não podem ser ditas por força de lei, as que revelam preconceito
racial ou que ferem a personalidade. Crianças e adolescentes têm direito
reconhecido e não são apenas “menores”.
Palavras
perderam o uso pelo desaparecimento das profissões. Os poderosos e meticulosos
linotipistas já não existem. Perderam o prestígio os exercícios profissionais
de engraxates e de sapateiros. As mulheres já não usam luvas neste país tropical.
Para
os antigos, e para os poetas, é a sede do sentimento e do pensamento. Por isso,
muitas e ricas palavras são derivadas do latim cor, cordis. Assim, misericórdia,
a clemência, será uma paixão do coração; saber de cor, quer dizer de memória, recordar,
é relembrar. E acordar e anuir, aprovar. Desde que não exista discórdia.
Ariano
Suassuna, monarquista, gostava de dizer que o povo brasileiro enobrecia usando
palavras próprias do reinado. É um fidalgo para pessoas nobres. O rico e
poderoso proprietário de terras é o barão. Quando a pessoa atinge o melhor
desempenho é o Rei, ou Rainha. Rei do futebol, rainha da beleza. Uma criança
querida é princesinha.
Vale
a pena refletir sobre a origem de certas expressões. Entusiasmo é conduzir Deus
dentro de si. Desastrado é quem não é conduzido pelos astros, sem estrela.
A
expressão lua de mel decorre de um hábito irlandês de ofertar aos recém-casados,
durante um mês, uma bebida com mel que seria afrodisíaca. Uma lunação.
As
palavras exaltam os falantes, ou os depreciam. Cuidemos delas com carinho.
Diógenes da Cunha Lima (poeta, prosador e compositor) é advogado e presidente da ANL (Academia Norte-rio-grandense de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
Foi Presidente da FJA, Secretário de Estado; Consultor Geral do Estado; Reitor da UFRN; Presidente do CRUB. Atualmente, dirige o seu Escritório de Advocacia e preside a ANL (Academia de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
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