segunda-feira, 27 de julho de 2020

UM DIPLOMA PARA RIBEIRO - Crônica de José Luz da Costa



UM DIPLOMA PARA RIBEIRO

Faz pouco tempo que partiste para nunca mais voltar. No dia de teu último sonho, a cidade saíra do sono entorpecida; os ventos sopravam levando as primeiras nuvens da manhã; as andorinhas flutuavam nos ares; debaixo dos céus os destinos divagavam-se ao ar livre. O Sol não tinha pressa. Nas janelas e portas, olhos sonolentos e lúgubres entreolhavam-se buscando a rua.
A cidade não segurou tua mão, mas continua lembrada de quando tu seguravas a dela, guiando seus lentos passos, e dando segurança à sua juventude...  Foi aquela mão firme e aquela palavra amiga que a mocidade fingiu ignorar e a madurez aceitou como conselho, que proporcionaram alegria, sabedoria e amizade.
Descansaste por méritos e por justiça. Tiveste o sono dos justos. Amavas a vida. Viveste como um jovem. Morreste como um jovem. Muitos choraram por ti, porém não gostavas disto, pois acreditavas que a morte não era o fim, e que permanecemos vivos através das gerações. Hoje, quando a saudade não é mais a lágrima, que cai em silêncio, mas sim a vontade de sentir e falar de ti, sabemos o quão penoso é defrontar a realidade.
Não obstante as intempéries das estações e a longura da jornada, tu sabias que a vitória se aproximava. Mas, em meio às pelejas do combate e aos precipícios da estrada, repentinamente sobrevieram-te os solavancos da tortura sob o signo da morte.
Ela chegou e pensou vencer. Mas fracassou. Pois, sabemos que não ficaste indefeso nem entristecido, enfrentando sem medo o abraço frígido da morte. Seria este o fim da sabedoria colhida através dos tempos? A bondade de teu coração seria aniquilada pela voracidade da morte? De que valeriam então a vida e a memória do homem que defendeu a verdade e amou a liberdade? Não, jamais ela poderia te vencer. No dia de tua partida, estavas sereno, com a expressão tranquila de quem não sofreu, mas apenas adormecera para despertar onde sossegados passeiam os espíritos.
E hoje, quando terminada a luta, vencida a resistência dos desafios, e ficamos de pé para ser condecorados, sentimos o golpe da fatalidade em nossas mentes. Esta ausência a nos arrastar e a nos dominar, mas também que nos grita sinalizando a força do espírito a pairar sobre nós, muito nos ensina, muito nos aproxima, muito nos fortalece.
Era dos ditames dos céus que tu partisses, era da providência divina que tu nos deixasses. Para ti, seria vida nova e alegria; para nós, vida vazia e saudade.
RIBEIRO, com dignidade, és o primeiro de nós a ser pioneiro de outra expedição. Certamente já encontraste o caminho para a Universidade Celeste. Certamente até já te matriculaste como novel na Universidade de Deus.
Contudo, apenas por alguns instantes, é importante que fujas da distância e que venhas até nós para, em meio aos sussurros de corações dilatados, ergamos o troféu maior de nossas conquistas. Certamente não poderia haver alegria maior se não pudéssemos celebrar o êxito da conquista com aqueles que compartilham as trilhas do mesmo caminho.
E agora, na esperança de que não haja mais ADEUS, viveremos mais próximos de ti pela lembrança das coisas imarcescíveis, que tornam a vida plena de significados e não apenas de sombras e silêncios na passagem do tempo.   
E assim, fecha-se aqui o circuito das horas, quando o tempo para e o homem registra a História.
                                              
Zedaluz.
Santa Cruz, janeiro de 1985.


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