OH, QUE BOBAGEM, AS ÁRVORES
NÃO FALAM, SIMPLESMENTE EXALAM O PERFUME DAS ROSAS QUE ROUBAM DE SI!
Aquele árvore frondosa, defronte ao Bar do Baixinho, com o seu
jeito elegante e discreto de ser e de ficar ali, na sombra agradável de seu
silêncio, tem as rosas mais cheirosas de todas. Ela tentava, sem sucesso,
confabular no ouvido de minha atenção sempre que por lá eu aparecia. Nunca lhe
dei atenção! Ela nada dizia à mesa redonda de meus amigos na hora de nossos
brindes barulhentos. Ela ouvia as confidências ditas, as sentenças
condenatórias prolatadas nas páginas infiéis das nossas risadas de bar. Ouvia
com discrição as estórias verossímeis, extraídas do universo pobre daquela
província. E ela nunca silenciou, para mim, na estrada de minhas lembranças o
seu segredo não dito. Aquela árvore do Baixinho queria me dizer algo. Sempre
quis. Foi ela que me levou hoje, de volta, à telúrica cidade de meus primeiros
passos. E fui a Santa Cruz matar a saudade daqueles tempos de outrora, para
ressuscitar as minhas boas lembranças e confabular com aquela árvore, que
quisera, há muito, dizer-me algo, mas que eu nunca lhe fui atencioso! E fui, e
cheguei e olhei àquela árvore linda, que me recebeu como nunca antes recebido,
com as suas seivas, os seus galhos, suas folhas e suas rosas a caírem
educadamente por sobre a minha presença. Poxa, quanta honra! Sentei-me à mesa posta
debaixo de sua sombra única, pedi a Eduardo Couro de sapo a minha cerveja
preferida, abri, apurei os ouvidos, escutei seu cumprimento delicioso, bebi
todos os prazeres daquela espera e contemplei a grandeza da estátua de Santa
Rita, bem à minha frente. Cadê os amigos Ivonaldo, Zé da Luz, Otacílio,
Leonardo, Meireles, Baixinho, Zé Lins, Lambão, Willard, Fernando Rola,
Bezerril, Pedro Bala, Valmir, Nícolas, Eurípedes, João Alberto, Gildo... onde
foram todos com os seus espantos, suas mímicas, confidências, exageros, suas
músicas, suas paixões, suas fomes, suas sedes, seus castelos, ... cadê aquelas
mentiras deliciosamente frescas? Cadê as calúnias amistosas de morte, nossas
risadas e nossas estórias? Não vieram para regar as raízes daquela árvore
feliz. E fiquei a sós, eu, a árvore frondosa , a mesa redonda e a ávida
cerveja, sozinhos, a costurar os tecidos da alma inesquecível daquele tempo,
quando, de repente, um clarão, com formato de auréola gigante, surge assustador
no céu do meio-dia de toda a cidade! E outro e outro clarões! Ventania estúpida
a virar a mesa e a irrigar os pés de minha árvore quieta, que agita suas
folhas, galhos e rosas pra mim na sufocante tentativa de algo me dizer, mas,
mais uma vez, não lhe dou atenção. Barulho ensurdecedor, a minha cerveja chora,
a terra se abre e o povo da feira corre sem direção para escapar da gravidade
mortal daquele novo momento; a ceiva escorre das feridas expostas na testa de
Santa Rita, que implode de seu Alto e sucumbe no desfiladeiro profundo do fogo
e da sede da agonia de nossa Santa Cruz. Eu, bem no centro dessa nova estória e
à espera de meus amigos de ontem, que nunca virão, olho, atônito, para essa
nova velha Rosa de Hiroshima que surge e desenha, por sobre a minha
consciência, as trombetas de Kin Jong-Um, os sorrisos esquizofrênicos de Trump,
as nuvens atômicas de Vladimir Putin e a bandeira bestial do Brasil, a tremular
com a frase “Libertas que sera Temer”. Acordo e vejo, da janela feliz de meu
alívio, o dia nascer lindo e promissor, neste domingo, 30 de julho de 2017.
Abro o computador e leio as manchetes dos principais jornais internacionais:
“Coréia do Norte testa novo míssil intercontinental e EUA, Coréia do Sul e
Japão posicionam seus bombardeiros B-1B.” As árvores brotam do chão, crescem e
lutam pra ser o verde mais lindo da aquarela de Deus. Quando derramam as suas
ceivas, as suas folhas e as suas rosas, sem motivo aparente, por sobre a
chegada inesperada de alguém, penso que queira, apenas lembrar da “rosa, da
rosa, da rosa de Hiroshima, a rosa hereditária, a rosa radioativa, estúpida e
inválida, a rosa com cirrose, a anti-rosa atômica, sem cor, sem perfume, sem
rosa, sem nada.” Mas não tenho certeza se é isso que ela quer falar, e este
texto é uma grande bobagem, até porque as árvores não falam, simplesmente
exalam o perfume das rosam que roubam de ti! (Nailson Costa)
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