CÉU AZUL ANIL
Nelson
Almeida.
Era um tranquilo fim
de tarde dominical e as crianças brincavam alegremente na areia. Nos bares, um
aglomerado de gente assistia ao clássico local. De repente um bêbado grita:
Goool!, junto com ele os demais. Não os demais bêbados, os demais torcedores. A
brisa soprava os cabelos das morenas que, sem alarde, desfilavam pela orla.
Tudo transcorria sossegadamente naquele fim de tarde.
Senti vontade de
correr pelas ruas dizendo a todos que sou feliz, que viver vale a pena, que
amar vale a pena. Foi quando o time adversário, que jogava pelo empate,
empatou; aí o jogo teve seu fim, o campeonato teve seu fim, a calmaria daquela
tarde teve seu fim. O cenário mudou, homens de meia idade e jovens tresloucados
se digladiavam. A pancadaria era geral.
O som da sirene do
carro de polícia destoava do doce e agradável barulho das ondas do mar. Num
efeito doppler o som da sirene era cada vez mais agudo, à medida em que de nós
a viatura se aproximava. O ambiente era de terror! Pânico nas ruas, histeria
geral, crianças gritando e pais atordoados protegendo seus filhos.
No calçadão da praia
um homem, vítima de bala perdida, agonizava minutos depois de ter declarado seu
amor e pedido em casamento a mão de Anita. Choros, gritos, súplicas de paz e de
amor ao próximo eram o que mais se ouvia. A areia, onde as crianças brincaram,
perdeu sua brancura e deu lugar ao ardor do rubro líquido vital.
Policiais bradavam
ordens a todos ali presentes, dizia um tenente: “afastem-se da cena do crime e
deem vez aos peritos criminais para que examinem o falecido”. Amanhã, talvez
façam marcha de protesto. Talvez, – caso o extinto seja funcionário público –,
não haja expediente nessa segunda-feira gorda que nos arrasta sonolentamente à
labuta.
Certamente, pedidos
de justiça encherão a programação das emissoras locais e na TV algum político
demagogo fará desse episódio dantesco escada para suas promessas de campanha.
Promessas tão impróprias quanto ser penalizado em multa quem tirou a vida de um
inocente.
Naquele fim de tarde percebi
quão efêmera é a vida, mas não aceitei tal condição, não me conformei com a
ideia de que a vida é assim. Então corri pelas ruas gritando que sou feliz, que
eu vivo e vale a pena viver, que eu amo e vale a pena amar. Com uma força
propulsora, que até então eu desconhecia, vociferei contra a apatia das pessoas
face ao que ocorrera minutos atrás. A verdade é que tudo mudou naquele fim de
tarde, tudo, menos aquele lindo céu azul anil.
Muito bom!
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