Nas terras nordestinas, o outono trás para mata atlântica as nuvens prenhas, carregadas e promovem na silhueta litorânea chuvas mansas, perenes, molhadeiras. Nos sertões começa a estação da maturação das sementes, das pastagens, dos grãos cultivados, é o início da estiagem, da seca. A gadaria vacum, esta de lombo encorpado, consumira as gramíneas nativas, as ramas de mororó, camará, caatingueira, e pronta para o abate. A miunça de fêmeas prenhas, paridas, pois, presume-se que houve uma rica estação de monta durante as águas de março, o inverno nordestino. As aves de arribação se deleitam no consumo dessa riqueza alimentar e botam-se a reprodução nos seus pombais espalhados em todas as micro-regiões.
Mas, a estação outonal é hospedeira do que acontece no verão no Nordeste brasileiro, pois, é nesta estação que começa o inverno, a caída das primeiras chuvas, o semear das sementes visando a produção grãos, cuja germinação depende das águas de março, e do abril chuvoso para a colheita. E neste ano as águas de março e o abril chuvoso, ficaram só na imaginação. A caatinga não borrifou, as lagoas estão secas, os choradouros não lacrimejaram, as cacimbas estão de veias finas, no fundão. Ano ruim, fome nos animais, morte lenta, pesarosa. Tristeza travosa no sitiante. Noites estreladas em limpidez de amargura. Ausência da névoa pós-chuvosa, meandrando os entornos das serras e do coaxar de sapos em afogadilhos nas lagoas naturais.
O caboclo sertanejo pergunta no silêncio da noite seca, tenebrosa, sinistra, voraz na caloria, estafante, o que fazer de sua semente de gado. A estiagem é a mais contextualizante dos últimos 50 anos, atingindo todos os quadrantes do Nordeste. Não houve chuvas de mangas, os avulsos corredores de refrigérios nas serrarias não existem. Um outono seco, estorricado, amedrontador aos viventes de um mundo de sabedoria popular, mas desprotegidos das entidades reguladoras das políticas que permeia num cenário em que a avidez de desvio de recursos é uma máxima efetiva.
Por oportuno se pergunta, os adivinhos falharam? Sim, os profetas de um mundo telúrico, copiadores dos sinais do encantador cenário que oferta a mãe natureza, podem ter feito uma leitura não correspondente a realidade vivida hoje, outono/maio. Mas, e os cientistas, estudiosos específicos desse fenômeno meteorologista, que puseram os olhos nas lunetas que desbravam a latitude, longitude e a ocorrência desse fenômeno? Que divulgaram regionalmente uma previsão segura, e de certa forma ditaram condutas para os campesinos do semi-árido com relação ao rebanho, a aquisição de um ou outro implemento agrícola, o que fazer alguns, do seu estoque de grãos que guardaram com tanto sacrifício.
Por último, nesse pequeno estalo do meu dedilhar cronista, que dedico em todo o seu lenho, ao homem do campo. Aquele do aboio reboado, do canto da toada no traquejo do seu rebanho, aquele que nasceu ouvindo a sonoridade dos velhos búzios dos seus ancestrais. Pergunta-se: e o Governo por si, ou através do órgão competente, a Secretaria da Agricultura, caluda, letárgica, o que vai fazer por esse mundão de desespero? E a categoria dos políticos, que a mídia nomina de “nossos representantes”. Que todo dia, pintam nas colunas sociais, não como agentes públicos fomentadores de projetos e políticas sociais, mas, simplesmente como antílopes da vaidade? Que atitudes estão tomando? Até o presente momento só vi um representante do Seridó se manifestar. Que pena o ato de votar é mesmo um exercício de desvalia. A pretora-mor que já vinha capengando no trato com o programa do leite, deve ter encontrado a vela acesa para sepultar uma das melhores iniciativa dos últimos 20 anos, principalmente no meu Seridó.
Recentemente assisti uma matéria jornalística, que tinha no seu lenho, a entrevista com um oficial da força nacional atrelado a defesa civil, enviado pela alcaide-mor para sondar os efeitos da seca aqui no nosso RN. Confesso. Fiquei patético. Antigamente quem tratava desse assunto era o Ministro do Interior, depois Integração Nacional, agora é um espartano. Este pode ser um dos melhores oficiais. Mas, neste momento, o Nordeste não está precisando de bivaque organizado, o que estamos vendo, é uma tenda de miséria, os homens, mulheres, crianças, perdendo os seus teréns, assediados pelas suas criações, urrando e berrando em fome e sede.
Em lua cheia e maio das noivas/2012.
*É Advogado e professor do Curso de Direito da UFRN.
QUE SECA CRUEL,GENTE!
ResponderExcluirque crônica arretada,só sendo de um doutor. muito intelectualizado,mesmo falando da seca. é pau!
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