terça-feira, 26 de outubro de 2021

HOMENAGENS POÉTICAS A ANTÔNIO FRANCISCO


Poema para Antônio Francisco


A musa poética Bateu-me no intento E a flor da poesia Lavrou-se em meu ser Fazendo eu pegar Depressa na pena Buscando um poema Sentindo prazer Com o peito pulsando por essa magia Que aguça o poeta tentar escrever.
Os tons mais diversos Dos versos que escrevo Galopam no prado Ligeiro corisco Percorrem planícies Das folhas em branco Sobre elas deixando Traçado o meu risco Juntando as palavras escrevo um cordel Pra o mestre dos mestres Antônio Francisco.
Antônio Francisco Teixeira de Melo Bem mais que poeta É própria poesia Um vate que sabe Brincar com palavras E faz dos seus versos Seu pão e alegria Semeia seus versos de forma sublime Um mago perito na sua magia.

De fã para Mestre Escrevo estes versos Com muita humildade Tentando expressar Por este poeta Meu grande respeito Direto e certeiro Sem pestanejar Qual quem diz olhando no fundo dos olhos O quanto que admiro o poeta do mar.

Poeta do mar Do chão Mossoró Também um poeta Que canta o Sertão Poeta da noite Poeta do dia Que voa qual ave De arribação Levando os seus versos a todos lugares Plantando esperança com muita emoção.
Com todo respeito Lhe digo poeta Que muito me inspira Ouvir cada verso Na voz estridente Bradando justiça Voraz enfrentando A qualquer adverso Sem nunca parar de sonhar um segundo De ver a justiça reinar no universo.
É sempre uma honra Estar ao seu lado Ouvir os seus versos Pra me abastecer De fé, humildade De amor e justiça Sonhar ver no mundo A paz florescer Tirando do peito de cada pessoa A triste ganância que tira o prazer.
Voando nas asas Dos sonhos mais puros Levando às pessoas Com muita destreza A sua poesia Repleta de alento No vento espalhando Magia e beleza Propondo uma vida de mais sintonia Dos seres humanos com a mãe natureza.

Quem ouve em seus versos O quanto a mãe terra Tem sido agredida Depressa se assombra E assim cada ser Que tem sentimento Deseja um planeta Repleto de alfombra Pra que no futuro não tenha ninguém Pedindo um vintém de “uma esmola de sombra”.
Renova a esperança Ouvir sua voz Dizendo poesia Com todo vigor Pedindo às pessoas Que se por acaso Alguém encontrar “A dose de amor” Derrame no peito da humanidade Com fé e bondade seu puro sabor.
Em tom de galope Mostrando os contrastes De quanto o progresso Caminha insensato Por sobre a natura Passando cimento Erguendo concretos E nesse vil ato Matou as belezas da mãe natureza De “um bairro chamado Lagoa do Mato”.

Fazendo esse alerta Que o nosso planeta Vem cada momento Virando carvão Que nós precisamos Ouvirmos “a voz Do Papa Francisco” Com muita atenção E os gritos da terra que geme de dor Nas garras vorazes da devastação.

Poeta o senhor É o mais forte exemplo Que sempre alimenta O sonho profundo De todos buscam Por meio dos versos Achar harmonia No gosto fecundo De andar semeando cordéis e colhendo Respeito e amizade por todo este mundo.
A voz de denúncia O grito de alerta Cantar de justiça Versar de bonança Rimar de humildade E o metrificar Do sonho de um mundo Com plena aliança Cordel que penetra na mente da gente Desperta pra luta e renova a esperança.
Por isso que levo No meu matulão De sonhos, seus versos Onde quer q’eu for E nunca me canso De sempre exaltar A sua poesia Com todo vigor E assim repassando tão belas mensagens Plantando as sementes de fé, paz e amor.
Agora eu preciso Fechar meu cordel Mas outra verdade Ainda me arrisco Falar quanto adoro Viver neste chão Rio Grande do Norte Nasci neste aprisco E o que mais me orgulha de ser potiguar É ser conterrâneo de Antônio de Francisco.
Edcarlos Medeiros Caicó/RN, julho de 2017.









O SEGREDO DO BORNÓ DE CHICO DE DONA NIRA


Andava pelo Sertão 
Um senhor muito contente
Riscando a face do chão 
Num camelo de corrente.
Muito esperto e corajoso
De coração caridoso
E um sorriso encantador,
Pedalava todo dia
Nas trilhas da poesia
Compondo versos de amor.

Falava do mel da flor
Da brisa da noite fria,
Do carão e do condor,
Da cobra engolindo a jia...
Nos olhos da liberdade
Fotografando a verdade
Nos cenários da beleza,
Guardava todas imagens 
Pra fazer novas viagens
Versando a mãe natureza.

Quando a noite deletava 
Os raios da luz do sol
E a pasta do breu pintava
O tecido do arrebol,
Esse nobre cordelista
Deixava a brita da pista
À procura de um abrigo,
E a cada nova paragem
Colocava na bagagem
O abraço de um novo amigo.

Um bornó que transportava
Transpassado no seu peito
De longe se destacava
Colorido e tão bem feito.
Nem a mais bonita renda 
Ou recorte de fazenda 
Disputava com seu brilho,
E Chico de Dona Nira 
Laçado por sua embira 
Carregava-o como um filho.

O bornó fazia parte
Das feições dessa figura,
Que mascava o pão da arte
E mastigava cultura.
Mas no vão dos deletérios 
Surgiram muitos mistérios 
Por onde Chico passava, 
Pois todo mundo pedia
Mas Francisco nunca abria
O bornó que carregava.

Alguns diziam com medo
Que Chico levava um carma
Ou que seu grande segredo
Na verdade era uma arma.
Disseram que era um feitiço 
Que o bornó era um caniço 
Costurado no seu couro,
E o "véi" Mané Cavalcante
Espalhou que o viajante
Levava um pote de ouro.

Mas ninguém sabia ao certo
Os segredos do bornó, 
E Francisco, muito esperto
Não dava ponto sem nó. 
O bornó nunca largava
Nem quando se agasalhava 
Em qualquer pé de parede,
E usava seu companheiro 
Como um simples travesseiro 
No chão, na cama ou na rede.

Mas um dia de passagem
Nas terras de Pau dos Ferros,
Onde a forma da coragem
Produz no seu povo, aferros.
Francisco de Dona Nira
Aprumou a sua mira
Pra casa de um vate grato,
Que nos campos da cultura 
Plantou sua assinatura 
Como Robson Renato.

Esperou que o véu da noite
Ofuscasse a claridade
E nos braços da pernoite
Deu voz para a liberdade.
Chamou Robson, Miguel,
Natália trouxe um cordel
E os quatro com harmonia,
Vararam a madrugada
Daquela noite estrelada
Recitando poesia.

Era Chico declamando
E o bornó do mesmo jeito
Vez por outra, já chorando
Aperrava-o contra o peito, 
Com dores nas expressões
E flores nas emoções 
Notava-se que a saudade,
Forjava cada delírio 
Daquele triste martírio 
De dor e fidelidade.

Derrepente, sem censura, 
Uma pergunta surgiu
Daquela boquinha pura
Que ao mestre se dirigiu,
Pois João Miguel, desde cedo
Imaginava o segredo
Daquele bornó tão lindo,
E disse de uma vez só:
O que tem nesse bornó?
E Chico falou sorrindo.

Não trago um pote de ouro,
Brilhante, prata ou marfim,
Meu verdadeiro tesouro
Reside dentro de mim.
Não carrego nenhum carma
Nem guardo porte de arma
Feitiço, praga ou magias,
Levo o cheiro da paixão 
Da rosa da inspiração 
Pra todas as poesias.

Pois nas pontas dessa embira
Carrego nesse bornó,
Saudades da minha Nira
Que ficou em Mossoró. 
Nessa vida itinerante 
Sem querer, sou relutante
E não sei ficar parado,
Pedalando o mundo inteiro
Por mais que mude o roteiro
Meu cantinho está guardado.

Aqui levo um vestidinho
Da minha eterna princesa,
Perfumado com carinho
E adornado de beleza.
À noite, quando me deito
Forro a cabeça, me ajeito 
Pra sentir o cheiro dela, 
E no sono mais profundo
Trago Nira p' o meu mundo
Numa viagem tão bela.

Já falei, caro Miguel
Da minha paixão ausente,
Mas antes de outro cordel
Quero lhe dar um presente.
Francisco se aproximou,
O seu bornó, retirou
E num gesto camarada,
Disse: tome esse bornó 
Que eu vou já pra Mossoró 
P' os braços da minha amada.

E partiu cortando o vento
Pedalando na saudade,
E sem descer do assento
Chegou na sua cidade.
Já no Jardim da morada
Avistou que a namorada
Cuidava das plantações, 
E ao lado d' um limoeiro
Um abraço verdadeiro
Juntou os dois corações. 

Robson Renato




Antonio Francisco Teixeira de Melo 

Poeta da vida, versejo do amor,

O bálsamo puro na face da dor,

Bornó, camiseta, calção e chinelo.

Galope, sextilha, mourão e martelo,

Café sem açúcar, cachaça no bar,

Risada incontida, com Nira, seu par,

Primeiro pra todos, avô de Segundo,

O maior poeta de todo esse mundo

Nos dez de galope na beira do mar.


Robson Renato





 Ao meu Compadre Antônio Francisco

Jadson Lima

Meu mestre de vida, de versos, de sonhos

Ser iluminado, Mestre da poesia

Meu ser se agiganta com sua magia

E os seres se tornam bem menos tristonhos

Os rostos felizes demostram risonhos

A felicidade que é te encontrar

Apertar a mão, poder abraçar

Dizer ao infinito da sua grandeza

Da alma simplória e da chama acesa

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


Poeta do mundo, monge do cordel

Papa da beleza que bota na rima

Versos que elevam nossa autoestima

Transpassa pra vida o que escreve ao papel

Poética firme, doce feito mel

Querendo com versos nos orientar

Ser humano incrível, bondade sem par

Homem de caráter, bondade e respeito

Que DEUS lhe moldou assim quase perfeito

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


Menino prodígio de Dona Pedrinha

Espírito puro que faz o que escreve

Cabeça não para, tem o corpo leve

Bota o mundo inteiro em cima da linha

Meio dia dorme e sempre a noitinha

Toma seu café, mas sem adoçar

Que o doce da vida, não pode amargar

A vida da gente precisa de brilho

E eu, meu compadre, me sinto seu filho

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


A tua grandeza é linda, infinita

E a minha menina ainda não sabe

Que a gente te ama e esse amor não cabe

No peito da gente, por isso é que grita:

Antônio Francisco tem alma bonita

E ele é bem maior que o seu versejar

Seu jeito de ser sabe contemplar

A simplicidade que vive na gente

E DEUS já sabia, que ele era um presente

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


Mina de tesouro, fonte inesgotável

Solo tão fecundo de simplicidade

Um mar de doçura cheio de humildade

Ser humano puro, homem admirável

Seu jeito de ser, sempre incomparável

Erguendo a bandeira pra nos levantar

Ensinando a todos a forma de amar

Com a fé no peito e alma completa

Dizendo pra nós o que é ser poeta

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


Meu verso te exalta, por ser quem tu és

Minha poesia, sem ti não é nada

Guerreiro sem lança, sem faca ou espada

O escudo é o verso, de sete ou de dez

Dedos livres, soltos, não exibe anéis

Que sua medida, não sabe contar

Só DEUS, que o criou, pode calcular

Se é uma vertente, se é uma fonte

Se é o céu, o mar, se é o horizonte

NOS DEZ DE GALOPE, NA BEIRA DO MAR.


Jadson Lima



POEMA AO MESTRE

Adriano Bezerra

O mestre Antônio Francisco
É fonte de inspiração
A sua essência poética
Na minha imaginação
É forjada nas batidas
Que dá o seu coração.

Seus versos têm a beleza
Dos campos verdes floridos,
Têm a pureza dos bichos,
O aguçar nos sentidos.
Têm o mistério dos seres
Dos reinos desconhecidos.

Têm a magia das fadas,
O encanto das sereias,
O segredo dos duendes,
A força das luas cheias.
Têm a destreza dos elfos,
Centurião das aldeias.

Tem a alma dos poetas
Vagando em suas artérias,
O embalar dos poemas
Acalentando as matérias,
Saber de milhões de Antônios
Saltando de seus neurônios
Sem dormir nem tirar férias.



Estrofe de Davi Lima


Antônio Francisco, meu mestre maior
Que tem um sorriso de orelha a orelha,
Plante no meu peito mais uma centelha
Pra quebrar o ego de quem é pior.
Fantástico vate, lá de Mossoró
Que veio ao mundo pra poetizar,
Na orquestra da vida veio harmonizar
O peito de quem cancela o viver
Avisando aos tolos que para colher
Antes do sucesso, precisa plantar.















TROCA DE FAVORES - Heraldo Lins

 


TROCA DE FAVORES 


No elevador sempre encontro a moça bonita que me dá bom-dia. Contou-me que sua mãe viajará para a Europa e que ficará sozinha por três meses. Estou esperançoso que ela peça minha ajuda para não dormir sozinha. 

Ela conversa sem parar e me chama de vizinho bom. Enquanto descemos, olha o celular e pede desculpas por estar respondendo mensagens. É a primeira vez que vejo alguém se desculpar por desviar a atenção enquanto conversa. Tudo bem, digo com raiva dissimulada. 

Ontem ela veio buscar duas colheres de açúcar. Minha vontade era presenteá-la com, pelo menos, meia xícara. Falou que recebe muitos presentes, menos de açúcar, pensei comigo enquanto lhe dava as duas colheradas. No momento do pedido ela estava adocicada com uma saia curtíssima e um decote solto. Fiquei admirando a paisagem enquanto ela sugava, fazendo barulho, um copo de milk-shake. Lambeu os lábios com um olhar atravessado e me contou da sua participação nos famosos desfiles. Quis estourar uma acne que saiu no meu rosto. Depois ficou procurando outras e mais outras até ficar bem familiarizada com meu cheiro. 

Estávamos entretidos e de repente, virou-se, levantou as tranças e pediu-me para tocar sua nuca. Estava sentindo uma dorzinha e queria que eu massageasse seu pescoço e ombros. Durante meus toques ela encostou-me na parede e apoiou-se em mim dizendo que era para ficar mais confortável. Disse-me que achava que estava me explorando de tanto pedir coisas emprestadas e nunca se lembrar de devolver. Queria poder emprestar-me algo, mas não sabia o quê. Sugeri. Ela aceitou e, depois de vestir-se, foi embora levando iogurte, café e leite.   


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 14/10/2021 – 14:13



UM POUCO DA COLETÂNEA "CONCERTO DE PALAVRAS"






UM CONCERTO, UM REGENTE E VÁRIAS PARTITURAS (Prefácio de Valdenides Cabral

Qualquer tentativa de compreender o que é a música [...] permaneceria inacabada se não se explicasse as profundas emoções que se sente ao escutar obras capazes até de fazer correr lágrimas. 

Claude Lévi-Strauss

 

Eis que estamos na antecâmara de uma ópera peculiar. Ao atravessarmos esta primeira página, todos os sentidos atentam para um Concerto de palavras regido pelo Maestro, Paulo Caldas e sua orquestra literária.

A cada página uma partitura diferente compõe a presente coletânea, fruto de uma criação intensamente vivenciada dentro do ambiente virtual da Oficina Literária, como pede o momento. Uma coletânea onde cada autor imprime suas particularidades de mundo através do ritmo das palavras que escolhe. Um conto, uma crônica, um poema... escrevivências de mundos, seleta de verdades literárias compartilhada, aprimorada e entregue ao leitor para deleite e reflexão.

Quando falo em verdades literárias é sobre a capacidade que temos, enquanto escritores, de batizarmos os nossos escritos, de podermos falar de nós e do outro. Ora representados por um eu confessional, por um eu lírico, ou por um homo fictus e vivendo dentro de um universo poético a construir uma sinfonia harmoniosa de palavras, somo aptos a despertar no leitor um estado de encantamento, uma identificação capaz de o levar a novas leituras, a descobrir sentidos plurais. E, conforme nos diz Barthes, “o plural do texto deve ser, efetivamente, não à ambiguidade de seus conteúdos, mas ao que se poderia chamar de pluralidade estereográfica dos significantes que o tecem (etimologicamente, o texto é um tecido)”. (BARTHES, 2004, p. 70).

Neste Concerto de palavras, nós, que fazemos a Oficina Literária Paulo Caldas, entregamos ao leitor um pouco do nosso ser encarnado na linguagem literária.

 

Recife, 13 de agosto de 2021


Pós-Doutora em Letras pela UFPE (2007). É professora Associada da UFRN, atuando na Pós-Graduação. Publicou "Pulsações", pela Annablume (SP), Poesia Menor, pela Editora Scortecci (SP) e O Corpo Erótico na Poética de Gilberto Mendonça Teles, pela Edições Galo Branco (RJ) e Pontos de Passagem, pela Scortecci (SP). Em 2013 publicou O Retórico Silêncio, pela EDUFRN. Em 2017 publicou, Pulsar, novo livro de poemas, pela Scortecci (SP). Em 2020 entrou para a Oficina Literária Paulo Caldas, participando da Coletânea Caleidoscópio. É membro da União Brasileira de Escritores/RN.



A FACE DE ANTEROS

(Poema de Valdenides Cabral)

Qual foi a vossa perdição, eu vos direi: não

soubestes amar; faltou-vos arte; é a arte que faz perdurar o amor. (Ovídio)

 

 

Antes

 

a ti mil palavras

digo ao ouvido

e mãos triunfantes

escalam pontes e

rochedos

em frenesi.

Vênus não tem pressa

e o ponto que procuras

esconde-se

ante a doçura do bordado

magistral da natureza.

Louca e bárbara

ateio ao teu corpo

a chama de Hefesto

e moldo a face secreta do desejo.

 

Durante

 

Com tal ternura

o Amor me abraça

código morse combinado

braile reconhecido no toque

do prazer que me pertence.

Cativo me segue

espada em punho

a me salvar

da Paixão.

Sob custódia

me possuis

lanço a rede de desejos

e perpetuo o amor.

Teu ser matizado de Luz

reflete a face de Anteros.

Fora o teto de estrelas que nos cobre

nada mais.

 

Depois

 

O que faço das noites em claro?

Demoro o olhar na parede fria.

Seguro o estilete

risco teu nome na dureza do concreto

Enquanto penso

o tempo foge

foge a espera

o amor adivinhado.

Sopro das letras

o pó

o sentido esvaziado

e talvez acrescente:

nunca te fui fiel.

Repouso o estilete

no peito

leme

à deriva



“Concerto de palavras” é o título da coletânea anual de textos, em prosa e verso, da Oficina Literária Paulo Caldas.

O livro tem a presença de 25 participantes, o prefácio da professora Valdenides Cabral, as orelhas assinadas pelos escritores Alexandre Medeiros e Márcia Balazeiro Coelho, e contracapa de Aderson Simões Belo.

Na apresentação, Paulo Caldas afirma: “sou corta jaca das letras e melodias, alcoviteiro de quem se aprochega, flerta e se entrega às maravilhas de sons e versos por vocação, impulso ou fuga do ócio, daí a ousadia de reger a oficina, estúdio onde sob harmonias e batutas solidárias, escrevemos as partituras das canções desta coletânea, juntos num palco feérico de cortinas abertas para o nosso concerto de sentimentos e emoções”.

A edição, que comemora os 12 anos de atividades da Oficina, traz o projeto visual da artista gráfica Bel Caldas e a primorosa impressão da FacForm Impressos Limitada.

Os interessados poderão comprar o livro diretamente com o escritor Paulo Caldas pelo messenger na página oficial da oficina no Facebook , e ainda saber mais sobre a oficina literária pelo instagram oficial da oficina.


SAUDADES DE OURO - Heraldo Lins

 


SAUDADES DE OURO


A terra onde canta o sabiá, eu, recentemente, lembrei-me dela. Há bastante tempo sinto uma grande nostalgia comparada com a de Gonçalves Dias, só que as palmeiras foram substituídas pelos xique-xiques, e os sabiás, pelas rolinhas. Relembro as casacas-de-couro hasteando a bandeira da felicidade no alto da jurema seca, e eu esperando a saída da tapioca do fogão de lenha.

 

Naquela época, longe do mármore polido, encantava-me com a orquestra do amanhecer. Minha avó preparando o líquido preto na panela de barro, e meu avô chegando com o branco in natura do curral. Na cozinha, com piso de barro batido, eu tomava a espuma crua até ficar com um bigode branco. Nem era bom nem ruim, apenas acontecia como em milhares de lares sertanejos. 


O frio do sertão, ao amanhecer, fazia todos se confraternizarem perto do fogo. As conversas noticiavam a visita da raposa no galinheiro, o rastro do tatupeba no terreiro, e, esporadicamente, o nascimento de mais um bezerro. Eram notícias importantes que norteavam o dia a dia na labuta do campo. 


O gado teria que ir passar os meses de dezembro e janeiro na volta do rio. A água liberada pela comporta da barragem não mais chegava ao sítio distante. Rio acima morava um parente que se comprometera em cuidar do gado solteiro enquanto a chuva não trazia o pasto. As trocas de favores tornavam a vida menos amarga naquele torrão esquecido pela autoestrada.


A única coisa em abundância era o acolhimento de uns com os outros: o caldo da caridade para quem caía das pernas, a injeção aplicada na fé do desvalido, além da benzedeira passando o ramo em menino buchudo. 


Nas noites de lua o ajuntamento de vizinhos se fazia na areia do rio plantando batatas, e, todos sabiam, que entre a lua minguante e nova era o momento certo para fincar os ramos nas covas do rio seco. O branco da areia reluzia as imagens dos trinta homens dispostos a cavar o chão. As mulheres levavam, à meia-noite, o pós-ceia engolido às pressas antes do sol nascer. Cada vizinho delimitava sua porção da vazante com as rumas de estercos, espaçadamente, amontoadas.


Ninguém se preocupava com furtos. Bastava alguém pedir que era prontamente atendido. Os ramos plantados no barreiro produziam umas mais doces. Batatas de açude, como se dizia, eram bem mais disputadas. As dos rios terminavam servindo para alimentar o gado, e hoje contribuem para alimentar nossa memória nostálgica.                     

   

Heraldo Lins Marinho Dantas 

Natal/RN, 14/10/2021 – 15:16




NAPOLEÃO: EFEITOS COLATERAIS - Diogenes da Cunha Lima

 



NAPOLEÃO: EFEITOS COLATERAIS

 

Diogenes da Cunha Lima

 

          Mesmo nessa época de pandemia, muitos celebram Napoleão Bonaparte nos duzentos anos de sua morte. Ele é uma ilha, no sentido de um ser isolado, misterioso, único. Nasceu na   Córsega, em 1769. Prisioneiro, fugiu da ilha de Elba e morreu na ilha de Santa Helena, em 1821.

          Estrategista genial, conquistou para a França quase toda a Europa. A sua ação multifacetada produziu não apenas efeitos adversos, mas também benéficos.

          A sua vida e obra não são totalmente conhecidas. Goethe havia notado: “A lenda napoleônica é como revelação de São João. Cada qual pressente que há alguma coisa oculta, mas ninguém sabe o quê”. Anotemos efeitos positivos.

O BRASIL - era colônia destinada a enriquecer Portugal, o aliado da Inglaterra. Graças à ameaça de Napoleão de invadir o país, a família real portuguesa fugiu para o Brasil. Salvador e, depois, o Rio de Janeiro passaram a ser a capital do reino. O Brasil ganhou a Escola de Cirurgia, a Imprensa régia, sessenta mil livros para a nossa Biblioteca Nacional, o Jardim Botânico, o Banco do Brasil. Sem contar as novas profissões e nova moda.

OBRA DE ARTE - A cerimonia de coroação do Imperador (1807) foi retratada pelo pintor neoclassicista Jacques-Louis David. É obra-mestra do Museu do Louvre.

CASAR DE BRANCO - O Papa Pio VII celebrou o casamento e a coroação do Imperador na Catedral de Notre-Dame. Napoleão, numa demonstração de poder, coroou a si próprio e a sua esposa Josefina. Ela havia desenhado a roupa branca para o primeiro Consul francês. Até então, não havia cor preferida para as vestes do casamento. A cor branca passou a ser adotada pela maioria dos nubentes.

ARCO DO TRIUNFO - Símbolo imperdível, foi erguido para a memória das batalhas napoleônicas, inscrevendo as batalhas e o nome dos seus generais.

DIREITOS CIVIS - Em sua posse, Napoleão enalteceu as conquistas da Revolução Francesa. O Código Civil napoleônico (1804), tratando das pessoas, bens e propriedades, consagrou a supremacia da lei. Estabeleceu as regras valorizadoras dos direitos civis, influenciando a legislação de muitos países, inclusive do Brasil.

SINFONIA HERÓICA - Napoleão Bonaparte inspirou Beethoven a compor a “Sinfonia Número 3”. A música encanta.

HISTÓRIA ANTIGA - Napoleão levou cientistas e pesquisadores para identificar e sequestrar obras de arte e história do Egito antigo. Um soldado percebeu que havia sinais diferentes ao lado de hieroglifos. Era a Pedra da Roseta que possibilitou a tradução da escrita egípcia. A descoberta iluminou a história mundial.

O HOMEM DO DESTINO - Bernard Shaw, Prêmio Nobel de Literatura, compôs esta comédia, mostrando o domínio da sedução feminina. Assim, a “Dama Misteriosa” venceu a força do vitorioso Napoleão.

Sentimos faltar aqui alguma coisa, mas não sabemos o quê.



Diógenes da Cunha Lima (poeta, prosador e compositor) é advogado e presidente da ANL (Academia Norte-rio-grandense de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil). 

Foi Presidente da FJA, Secretário de Estado; Consultor Geral do Estado; Reitor da UFRN; Presidente do CRUB. Atualmente, dirige o seu Escritório de Advocacia e preside a ANL (Academia de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).

sexta-feira, 22 de outubro de 2021

LEMBRANÇAS CURTAS - Heraldo Lins

 


LEMBRANÇAS CURTAS


A mulher abre a janela para apreciar o respingar no alpendre. Enquanto aprecia o sussurrar da chuva, pensa nos conselhos que a mãe lhe deu para não se casar com Maurício. Foi uma decisão sua viver feliz, mas lhe desperta dúvidas sua escolha. Os desencontros com o marido a levara a perder um pouco o ânimo. O amor que tanto sentia transformou-se em algo desgastado pela dura realidade do trabalho. 


Nesses estreitos limites de tempo em que analisa a vida, percebe que seus instintos maternos não a deixaram ver onde estava se metendo. Suspeita que a natureza coloca uma venda nas que chegam no auge da vida fértil, e foi o que aconteceu com ela. Naquela época só sentia vontade de ser possuída e ter filhos. Agora que está vivendo a fase de educá-los, tornou-se refém das suas antigas decisões. Hoje é que percebe que não passava de uma fêmea no cio, e seu mundo era norteado pelo prazer de se acasalar. Sabe que é muito forte esse instinto e tem medo de que suas filhas fracassem na missão de se conterem até estarem aptas a suprirem, confortavelmente, a própria subsistência.  


Sua ingenuidade foi substituída pela sabedoria lapidada pelo sofrimento. Se tivesse o entendimento que tem hoje, quem sabe, seus filhos estariam com outra genética. Naquele começo de inverno, quer se deitar e dormir sozinha, sem marido nem filhos por perto, mas a porta foi aberta anunciando que Maurício está de volta para uma noite que promete. A mulher sorri para o presente e deixa o passado ir embora com a chuva.


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 12/10/2021 – 12:33



quarta-feira, 13 de outubro de 2021

COISAS DE QUEM NÃO DORME - Heraldo Lins

 


COISAS DE QUEM NÃO DORME


Um amigo falou-me sobre sua mulher. Disse-me que quando casou ela já havia retirado o útero por causa de um mioma. Depois ela teve que operar a coluna; em seguida eliminou o excesso de pálpebras e esticou a pele; sua vesícula e o apêndice foram extraídos, e o pâncreas teve que ser cortado pela metade. Disse-me que nem sabia mais se estava casado com uma mulher ou com apenas uma carcaça. Essa desconfiança se intensificou quando foram retirados dela mais de dois metros de intestino por causa de uns pólipos.  


Acho que ele está paranoico, porque quando encontra uma jovem, em vez de perguntar pelo nome, fica interrogando quais os órgãos que ela ainda possui; o que é que há de original ou o que é prótese. Vez por outra pesquisa os tipos de doenças e quais os órgãos que se pode retirar e permanecer vivo.


Ultimamente eu notei que a paranoia se intensificou. Eu cheguei a essa conclusão ao escutá-lo dizer que quando se olha no espelho imagina-se com apenas um olho e uma orelha; no nariz só basta um buraco e está tudo resolvido; também está com a ideia de retirar o braço esquerdo e a perna direita. O problema é que para equilibrar-se teria que cortá-los no mesmo alinhamento. A caixa torácica ficaria suspensa por apenas um lado, tipo bandeirola. Qualquer um que surge deficiente à sua frente ele faz questão de empurrar a cadeira para estagiar.

 

Esse meu amigo está me tirando o juízo. Talvez seja melhor eu bloqueá-lo porque essas mensagens me fazem perder o sono. Eu vou junto com o seu raciocínio, e quando paro para pensar, sofro bastante. Imagino um ser humano sendo reaproveitado: seria cortado nas virilhas, costuradas as mãos nas coxas com o objetivo de segurar a cabeça. O tórax seria removido porque só serve para produzir dejetos. 


O telefone toca e vejo que é ele. É melhor deixar tocar porque não dá para prolongar uma conversa com uma pessoa assim. Parou de tocar! Ele sabe que eu não o atendi porque não quis, mas quem é que aguenta um amigo que toma remédio tarja preta? É complicado! 


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 19/09/2021 – 07:59



segunda-feira, 11 de outubro de 2021

MINHA LOBA - Nelson Almeida

  




MINHA LOBA


Ela é uma loba

Ela é pelos seus

Ela luta, ela rouba

Qualquer olhar de adeus


Esta mulher tece a vida

Com mãos de artesãs

Esta mulher me inspira

Como o brilho das manhãs


Quando penso em desistir

Ela me segura à mão

Me aperta em seu corpo

E me diz que não


Não há nada mais divino

Do que o brilho em seus olhos

Não há nada mais suave

Do que o toque das suas mãos


Ela é a minha loba

Às vezes de tão pura

Chega a ser boba

Mas sempre me rouba da boca

Palavras do coração


Nelson Almeida. Praia do Cristóvão, 11/10/21. 10:00.,