QUEM PROCURA ACHA - Heraldo Lins

 

QUEM PROCURA ACHA

Sai em busca de inspiração. No caminho ouviu falar que a inspiração não se aproxima de excessos, e, por isso, providenciou uma roupa para se disfarçar de magro.

Suas angústias lhe atormentam por não entender por que não foi chamado a opinar se aceitava nascer. Encontra um sábio que lhe responde que pode decidir sair. Ah! assim é fácil! colocam dor e depois me mandam decidir. Queria sair com prazer. A dor é a moeda do livre-alvedrio, responde o sábio. 

Resolve tirar o disfarce de magro. Difícil é tirar o disfarce de ser bom e simpático. Na sua essência, é mau, mas precisa esconder isso dos outros. Vive pisando na própria maldade para que ela não venha à tona. Ser mau, nesse caso, não é ser tão mau assim. 

Disfarçado de bonzinho, resolve ir para a caminhada na trilha que há tanto havia planejado. Corpos suados, depois de meia hora, já estão intimamente ligados. Caminham em fila indiana descendo ao encontro do mar. Um abraço espumante, ardido de sal e sol os fazem mais íntimos. 

Ao retornarem, o café da manhã coroa a empatia. Ela o olha admirada pela sua capacidade de se manter quieto. Que homem misterioso, chega dá medo. Há quanto tempo na cidade? Cheguei ontem e resolvi fazer a trilha. Ele analisa se será apenas um flerte passageiro. Ele precisa dessa Eva para lhe preencher na condição de Adão. Todo casal tem dor. Com ele não será diferente. 

Despedem-se no aeroporto. O vácuo fica no seu eu. É um avião transportando outro que deixa saudades.

Poucos meses depois estão de volta na trilha da convivência. O abraço não mais precisa do mar como coadjuvante. O sal na culinária desperta o sol há tanto encoberto por nuvens negras, e a busca da inspiração foi o motor propulsor dessa grandiosa parcela de alegria.

Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 03.02.2022  − 16:14

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