sábado, 6 de fevereiro de 2021

BELEZA SONORA - Heraldo Lins

 


BELEZA SONORA

 

 

À noite sua esposa deitava-se em seu colo e, com o seu canto, dava sentido à vida. Hoje, não mais. Depois de saudades eternas, ele resolveu fazer um violão com cordas inspiradas nas seis meninas que tiveram. Sentado onde outrora dividia o clarão da lua, acaricia as cordas do violão compondo canções dedicadas a ela. As filhas cantam juntas testemunhando o amor tão sublime que ainda reina no ambiente.

 

O mundo todo já o convidou para concertos. Nega-se. O maior teatro ao ar livre ele já tem. No alpendre é onde as canções são apreciadas e gravadas para serem divulgadas na mídia. Para onde o som vai tem uma só alma remetendo outras canções de volta através dos sonhos. Ao amanhecer ele canta e toca de primeira. Elas ouvem antes do café a música que a mãe envia. Em seguida saem para a escola. Ele verifica a afinação do violão. Se uma das cordas desafinou, é algum problema acontecido com a prole. Ao retornarem, pergunta o que houve. Só depois de resolver os entraves da infância, o violão consegue ser afinado. A corda mi só afina quando as maiores auxiliam a menor nas tarefas escolares. Assim são com as demais. A harmonização depende do bem-estar da família.

 

Violão, pai e filhas produzem um som que ocupam todas as células responsáveis pela audição de um ser vivente. Seres humanos e animais calam-se para ouvir o estimulador da verdadeira paz. O mundo aquieta-se com a produção musical. Não há perigo de invasão ou assassinato por perto. Todos se desarmam. Os maus ficam bons diante da majestosa sonoridade. Completa-se o ambiente musical com uma penumbra cintilante que invade o alpendre. Uma névoa vai evoluindo com o passar da live. Os ouvintes ficam hipnotizados. A família entra em transe. São todos envolvidos em uma só corrente. As almas se confraternizam com tamanha lucidez que todos passam a ser um só manto espiritual, com sons que tomam formas coloridas e reverberam na névoa que serve de tela para o desfile de notas demoradas. São bolhas maiores que a brisa as embala com clarão radioativo. Mesmo após o término, o ambiente fica tomado de total serenidade. O padrão mental muda para quem escuta o canto dos anjos.  

 

 


Heraldo Lins Marinho Dantas (arte-educador)

Natal/RN, 30/12/2020 – 16:15

showdemamulengos@gmail.com

84-99973-4114

 

 

 

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