Entrevistado: Marco Haurélio Fernandes
Xilogravura de Jefferson Campos, especialmente feita para ilustrar a entrevista.
Mais opçõ
Foi
em “Tecendo Linguagens”,
Um
livro de português,
Que
algo de Marco Haurélio
Vi
pela primeira vez:
A
capa de um cordel
feito
pelo menestrel,
Mas nada do que ele fez.
Antes,
alguém me falou
De
sua vinda a Natal;
Disseram
que ele deu
Aula
substancial;
E
eu resolvi pesquisar
E
por fim entrevistar
Ao
grande intelectual.
Com
prazer ora apresento
A
Marco Haurélio, escritor,
Cordelista
premiado,
Profundo
pesquisador
Do
lirismo nordestino
Que
se fez, desde menino,
Do
cordel um defensor.
Marco
Haurélio, de início,
Fale-nos
de seu passado;
Das
influencias que teve;
Do
lugar em que foi criado;
Dos
cordéis que escutou
E
como isso o levou
A
ser tão requisitado.
MARCO HAURÉLIO:
Nasci
no sertão baiano.
O
local? Ponta da Serra,
Comunidade
rural
Onde
o céu encontra a terra
E
onde eu escutava histórias,
Baús
de muitas memórias
De
tempos de paz e guerra.
Quando
pequeno, eu ouvia
Juvenal
e o Dragão,
O
Herói João de Calais,
Rosinha
e Sebastião,
A
Coragem de um vaqueiro,
O
Santo do Juazeiro,
História
do Boi Leitão.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Fale-nos
de suas obras.
Dos
livros que publicou,
Qual
que mais lhe dá prazer?
Quantos
prêmios já ganhou?
Seu
legado é muito rico
Pois
pra fazer Velho Chico
A
Rede Globo o buscou!
MARCO HAURÉLIO:
Publiquei
quarenta livros,
Entre
contos e cordéis,
Mais
dezenas de folhetos
Aos
velhos mestres fiéis.
Alguns
prêmios recebi,
Porém
reafirmo aqui:
Meus
livros são meus lauréis.
À
novela Velho Chico,
Eu
servi de consultor,
Criei
algumas histórias,
Também
fui compositor,
Ao
estilo do cordel,
Pra
Xangai e Maciel,
Uma
dupla de valor.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Dos
muitos cordéis que leu
Se
tivesse que eleger
Dois
ou três entre os demais
Quais
iria escolher
Como
os mais valiosos?
Que
cordelistas famosos
Você
recomenda ler?
MARCO HAURÉLIO:
Já
li bastante romance,
Porém
os de maior brilho
Foram
Alonso e Marina,
Do
qual não me desvencilho,
Também
A Sorte do Amor
Do
notável trovador
Manoel
d’Almeida Filho.
Cada
um lê o que quer
Neste
distinto celeiro.
Em
minha estante, porém,
Moram
Delarme Monteiro,
O
grande Leandro Gomes,
Minelvino
e outros nomes
Do
bom cordel brasileiro.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
O
cordel subsistiu
À
nossa modernidade
Mas
parece hoje passar
Por
crise de identidade,
No
entanto se fortifica!
Ratifica
ou retifica?
Corrija-me,
por bondade.
MARCO HAURÉLIO:
O
cordel nunca mudou,
Mesmo
com novo suporte,
Pois
soube se adaptar,
Mostrando
ser muito forte.
E
se assim não ocorresse,
Perdia
o povo o interesse
E
decretava-lhe a morte.
Mais
opções
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Há
mitos sobre o cordel
Quanto
a tamanho e estrutura;
Há
quem ache que na capa
Tem
que ter xilogravura;
Até
tipo de papel
Escolhem
para o cordel;
Linguagem,
cor e largura.
MARCO HAURÉLIO:
Cordel
é sempre cordel,
Isso
afirmo com orgulho.
É
Capitão do Navio,
Rufino,
o Rei do Barulho,
Princesa
da Pedra Fina,
A
Imperatriz Porcina,
E
isso independe do embrulho.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Número
mínimo de estrofes
Deve-se
estabelecer
Na
criação de um cordel?
Quantas
deveriam ser?
Os
textos de Bráulio Bessa
Que
fazem sucesso à beça
Que
nome deviam ter?
Como
costuma enfrentar
As
ideias radicais
Dos
que amam o cordel
Porém
têm zelo demais?
Tente
ao gênero definir;
Busque
em versos resumir
Aspectos
essenciais.
MARCO HAURÉLIO:
Creio
que, para ser bom,
Precisa
duma estrutura,
Contar
uma boa história,
Com
uma régua segura.
Declamado
ou no papel,
Ouso
dizer que é cordel
Quando
for literatura.
Bráulio
Bessa é um performer,
Um
sujeito carismático
De
uma escola diferente,
Tem
apelo midiático,
Conversa
com o cordel,
Mas
enxergo o seu papel
Num
outro leque temático.
Cordel
é literatura
Da
letra e também da voz,
Tem
origem nas sementes
Que
o tempo espargiu em nós,
O
canto de muitas eras,
O
pólen das primaveras,
A
bíblia dos meus avós.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
O
cordel em sua origem
Devia
ser diferente;
Como
era na Europa,
-
Portugal, principalmente?
Na
Espanha ele existiu?
Como
foi que evoluiu
Ao
que é atualmente?
MARCO HAURÉLIO:
Cada
país teve um gênero
Similar
ao romanceiro
Depois
chamado cordel
No
Nordeste brasileiro.
Canções,
baladas e lais,
Dessas
vozes ancestrais
Nós
seguimos o roteiro.
Contudo,
em nosso Nordeste,
Houve
um diferencial:
O
cavaleiro galante
Da
gesta medieval
Permutou-se
no vaqueiro
Atrás
do boi mandingueiro,
Perdido
no carrascal.
Há
histórias de princesas,
Resquícios
do medievo,
Mas
também há cangaceiros,
Personagens
de relevo;
Sem
contar os sabichões:
João
Grilo, Cancão, Camões,
Num
ciclo alegre e longevo.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Diferencie
e aproxime
O
cordel da cantoria;
Fale-nos
da métrica oral,
Tão
condenada hoje em dia
E
em versos criativos
Cite
alguns autores vivos
Que
nos recomendaria.
O
cordel e a cantoria
Têm
valores pontuais:
Dois
gêmeos bivitelinos,
Dois
legados ancestrais,
Se
aproximam, se repelem,
E,
por mais que tagarelem,
São
filhos dos mesmos pais.
MARCO HAURÉLIO:
O
cordel, em outros tempos,
Se
assemelhava em prosódia
À
cantoria, porém,
Hoje,
com outra custódia,
Se
vale mais da elisão,
Sem
perder a condição
De
moderna rapsódia.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Rima,
métrica e oração
Ao
cordel servem de guia
Mas
o que é oração?
Algum
leigo indagaria.
E
sem fugir do assunto
Ao
pesquisador pergunto:
Marco,
o que é poesia?
MARCO HAURÉLIO:
Em
minha concepção,
Oração
é o sentido,
A
razão da poesia,
O
fio por ela tecido.
Poesia
é harmonia,
Que
foi inventada um dia
Por
um deus desconhecido.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Cite
uma ou mais estrofes
Ditas
por um cantador,
Algum
trecho de cordel
De
inegável valor
Guardado
em seu coração,
Digno
da atenção
De
nosso amado leitor.
MARCO HAURÉLIO:
“O
amor quando se alberga
No
peito do rico ou pobre,
Se
torna logo um guerreiro
Com
capacete de cobre,
E
só obedece a honra
Porque
a honra é mais nobre.
Se
o amor é soberano,
A
honra é sua coroa.
Portanto,
um amor sem honra
É
como um barco sem proa,
É
como um rei destronado
No
mundo vagando à toa.”
[José
Camelo de Melo Resende, Entre o Amor e a Espada]
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Finalizo
esta conversa
Conselhos
solicitando
Para
os que fazem cordel.
Os
que estão iniciando
Em
quem devem se espelhar
E
o que devem evitar
No
rumo que estão tomando?
MARCO HAURÉLIO:
Se
conselhos posso dar:
Leia!
Leia! Leia! Leia!
Leia
os novos, leia os clássicos,
Ouça
o canto da sereia.
Fuja
dos espertalhões,
Caga-regras,
mandriões,
Gigolôs
da verve alheia.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Após
tão boas respostas,
Precisas
e prazenteiras,
Dirija
aos nossos leitores
As
palavras derradeiras;
Diga
o que o coração manda,
Faça
alguma propaganda
E
vamos romper fronteiras.
MARCO HAURÉLIO:
O
cordel verdadeiro é garimpado
Nas
cavernas do tempo e da memória.
Quem
buscar entender a sua história
Beberá
nas cacimbas do passado,
Mas
também estará conectado
Ao
futuro, com estro soberano,
Decifrando
de vez o grande arcano
Que
sustenta a coluna resistente:
É
passado, é porvir e é presente
Nos
dez pés de martelo alagoano.
GILBERTO CARDOSO
DOS SANTOS:
Agradeço
demais ao entrevistado
Por
nos dar de seu tempo e inspiração
Respondendo
à sincera indagação
De
quem vê no cordel grande legado.
Exagero
nenhum foi endossado.
Ser
fiel às origens, eis o plano.
Sem
jamais renegar o avanço humano,
Pois
cordel é uma árvore frondosa
Nas
raízes e frutos vigorosa,
Nos
dez pés de martelo alagoano.
Agradeço
a Jefferson, grande artista
e
amante da arte popular,
que
assumiu a tarefa de ilustrar
a
tão bela e tão útil entrevista;
Ele
que é do cordel apologista
E
que tem poesia no tutano
não
se deixa levar pelo engano
da
cultura vazia e destrutiva;
ele
quer que o cordel pra sempre viva
Nos
dez pés de martelo alagoano.
INSTAGRAM: Jefferson.campos.xg
FACEBOOK: https://www.facebook.com/jefferson.lima.963
Marco Haurélio, Gilberto, Jefferson Campos
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