Frutos secos
O Papa Francisco enfatizava a importância da formação humanista para o bom desempenho de um sacerdote e sugeria um mergulho pelo mundo das artes, sobretudo, da literatura. De acordo com Francisco, não se concebe uma formação plural sem leituras, como: Dostoiéyski, Luis Borges, José Hernández (...). Advertia, ainda, que: “Com o propósito de formação humanista, o profissional suplantaria a posição de um bom instrumento sem coração (frutos secos).”
A arte verbaliza o indizível, nela reside a corporificação da dor, do amor e da expressão dos sonhos! Quando o Papa Francisco falava da humanização pela arte, mais especificamente, pela literatura, ele apontava um viés, um canal por onde podemos nos transportar e adentrar o universo de tantos personagens fictícios/reais que povoam as diversas esferas da nossa sociedade e que passam despercebidos ou são renegados a planos inferiores. Em “Um índio”, Caetano Veloso denuncia, magistralmente, o extermínio do povo indígena! Em seus versos, cita: “E aquilo que nesse momento se revelará aos povos; Surpreenderá a todos, não por ser exótico; Mas pelo fato de poder ter sempre estado oculto quando terá sido o óbvio.” É sobre isso. Estar presente e oculto ao mesmo tempo! Os olhos que não querem ver, rotulam/diminuem, reduzem, abstraem o espírito. Assim, fica mais fácil torná-los invisíveis.
A incrível sensibilidade do artista traz à tona o oculto, fazendo emergir personagens tão viscerais, tão legítimos, tão presentes e protagonistas que normalmente são subjugados, renegados a segundo plano, ou seja, quando atuam são meros coadjuvantes. Resguardando carinhosamente os grandes Mario Lagos e Ataulfo Alves: “Amélia não tinha menor vaidade, Amélia que era mulher de verdade (...)”. É bonito porque é poético, ponto! No convívio em meio a discursos controversos, estaria a mulher a “tecer longos bordados” ou a desfazer bordados rígidos tecidos para ela?
Em Cem Anos de Solidão, Gabriel García Márquez, à luz de sua genialidade, constrói um personagem tão singular e plural ao mesmo tempo, como Úrsula. Esse personagem é o sustentáculo de toda a trama que envolve a família Buendía e adjacências. Úrsula transita ativamente por todos os lugares, faz-se presente e atuante nas tomadas de decisões, ríspida e amorosa, relutante e acessível, tradicional e de vanguarda, uma incansável conciliadora. Disposta a enfrentar batalhas de toda ordem, sejam pessoais, familiares ou conjunturais. Capaz de abraçar demandas diversas sem restrições, sempre desprovida de ideais ou ditames, sem tempo para acharques, birras ou paralização por frustações, não lhe restando, portanto, tempo para o talvez, o mais ou menos, o talvez ou o acordar espontâneo; um êxodo sem fim.
A mulher não está atrás, ao lado ou à frente de outro – ela está no seu lugar, trilhando o seu caminho, escrevendo sua história, basta olhar para ver. No entanto, não são todos os olhos que veem! Francisco, sabiamente, nos fez lembrar a importância de pessoas que se debruçam sobre seus feitos para nos humanizar. Assim como Úrsula (Gabriel García Márquez), temos Eunice Paiva (Marcelo Rubéns Paiva), Sônia (Fiódor Dostoiévski), dentre tantas outras. Nesse processo, não por acaso, de subjugação da mulher, a arte desempenha um papel de suma importância no tocante ao seu reconhecimento e afirmação do seu lugar como sendo o palco com todo o protagonismo que é seu de direito.
Eu sou. Quão abrangente é esta afirmação! Algo que parece ser uma simplificação, é de fato, um conjunto de significados! A mulher é. Que não falte ao conjunto da sociedade delicadeza e adjetivos que expressem o valor de todas as mulheres, são tantas Marias, Joanas, Lourdes, Alices...! “Quantos segredos traz o coração de uma mulher?” É algo a se decifrar! Contudo, uma coisa é certa: há muitas vidas nos olhos de uma mulher!
Maria Goretti Borges
Goretti, seu texto reflete sobre a importância da arte, especialmente da literatura, na humanização e na valorização de vozes marginalizadas. A arte não apenas expressa o indizível, mas também reposiciona protagonistas renegados, promovendo um olhar mais sensível e justo sobre a sociedade. Seu discurso é de autoridade, pois se trata de uma voraz leitora e apologista das artes em geral. Parabéns! - Gilberto Cardoso
ResponderExcluirMuito obrigada meu amigo, quanta elegância e gentileza em suas palavras! Você sintetizou belissimamente! 👏🏽
ExcluirTexto brilhante, como sempre! Parabéns, Goretti!
ResponderExcluirMuito obrigada!
ExcluirQue reflexão maravilhosa! Sensacional! Sem palavras! Parabéns, professora, você sabe ser objetiva na imensidão de sua subjetividade! (Nailson Costa)
ResponderExcluirMuito obrigada, meu amigo Nailson!
ExcluirSei que é muita gentileza sua, mesmo assim, fico lisonjeada.
👏parabéns!
ResponderExcluirObrigada ❤️
ExcluirA arte, em si, serve para nos humanizar. Mas nem todos reconhecem sua importância. Que teu texto desperte, nestas pessoas, o papel fundamental da arte.
ResponderExcluirRoberto Gabriel.
Isso mesmo Robertinho! “A arte existe porque a vida não basta.” Ferreira Gullar
ExcluirEsse texto sensível. Reflete bem o que o Papa Francisco pregava: respeito ao próximo em sua plenitude. A literatura salva. A mulher é, porque já provou por diversas vezes, seu lugar e seu protagonismo. Brilhante, Goretti! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻
ResponderExcluirMuito obrigada pelo carinho, querida Diana! Sei que você é uma amante da leitura, parabéns para vc também! Bjo
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ResponderExcluirParabéns, Goretti pelo belíssimo texto! Sua escrita demonstra grande sensibilidade e maestria. A profundidade de suas ideias e a elegância da linguagem nos impressionam profundamente. Parabéns pelo brilhante texto.
Muito obrigada pela gentileza e as palavras de incentivo! Um abraço 🫂
ExcluirNão há palavras para descrever tamanha homenagem às mulheres. Em diferentes contextos e momentos históricos a mulher foi subestimada, porém, no Jesus histórico, a mulher teve seu lugar mais exaltado. Francisco, o Papa, nos trouxe em seus discursos este sublime ser que é a mulher.
ResponderExcluirNas palavras da Senhora Goretti está homenagem se fez presente. Parabéns escritora, que suas obra não fique apenas nas letras, mas sim e com certeza, nas atitudes.
Luciano.
Parabéns por esse significativo comentário! Muito obrigada pelos elogios, meus sinceros agradecimentos.
ExcluirAlgumas pessoas pensam que escrever é fácil. Mas sei como é difícil ter ideias e transformá-las em conteúdo significativo e interessante. Só aplausos 👏 👏 👏 👏 👏 👏 😍
ResponderExcluirVdd, talvez para pouquíssimos seja fácil mas, assim como você, acredito que para imensa maioria é difícil realmente. Um abraço 🫂
ExcluirTexto excelente, parabéns! Diante da clareza de texto, você consegue criar pontes, destacando a arte como um elemento de desenvolvimento humanista. Chama a atenção para a invisibilidade presente no nosso dia a dia, como também, o papel da mulher na sua diversidade. Citar o Papa Francisco deixou se texto ainda mais precioso, parabéns! Júnior
ResponderExcluirMuito obrigada, Júnior! Você é um excelente incentivador e também um ótimo companheiro! Um abraço 🫂
ResponderExcluirGoreti. Vc amplia o leque das mulheres na arte da literatura. Parabéns.
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