terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

ONDE FABIÃO DAS QUEIMADAS REALMENTE NASCEU? - Por Carlos Alberto


Pintura que faz parte do acervo do Museu Auta Pinheiro


FABIÃO DAS QUEIMADAS [(1844) ou (1848) ou (1850)-1928] NASCEU EM SANTA CRUZ (1876)???


Este parco texto tem o objetivo de opinar sobre a naturalidade do escravo, poeta, romanceiro, rabequeiro e cantador Fabião Hermenegildo Ferreira da Rocha, de cognome Fabião das Queimadas, pois, a maioria dos pesquisadores quando se refere à toponímia de nascimento do menestrel potiguar: afirma que foi em Santa Cruz.  

Entre outros intelectuais, Eloy de Souza (1873-1959), Câmara Cascudo (1898-1986), Afonso Bezerra (1907-1930), Leonardo Mota (1891-1948), Veríssimo de Melo (1921-1996) e Deífilo Gurgel (1926-2012) emitiram opiniões e produziram texto sobre Fabião das Queimadas. 

Especificamente, aqui e agora, vai ser levado em conta as afirmativas de Câmara Cascudo, através, de seus livros sobre a naturalidade e o ano de nascimento de Fabião das Queimadas. No elenco de livros cascudianos, três serão citados: HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO NO BRASIL (1ª edição em 1967), VAQUEIROS E CANTADORES (1ª edição em 1939) e TRADIÇÕES POPULARES DA PECUÁRIA NORDESTINA (1ª edição em 1956). 

No livro HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO NO BRASIL afirmou que Fabião das Queimadas nasceu em Santa Cruz e em 20 de janeiro de 1844, aliás, também, informou que 20 de janeiro é dia de São Fabiano, no calendário católico. 

Na obra VAQUEIROS E CANTADORES, publicou a informação de que Fabião nasceu em 1848, em Santa Cruz. 

E no opúsculo TRADIÇÕES POPULARES DA PECUÁRIA NORDESTINA disse que o bardo nasceu em 1950, também, em Santa Cruz. 

É importante salientar que nessas afirmativas não apresentou nenhuma fonte comprobatória do ano de nascimento, no entanto, a maioria dos pesquisadores utiliza o ano de 1848. 

Quanto ao município de Santa Cruz... 

Foi povoado até 11/12/1876, tornou-se vila e como tal, foi até 30/11/1914, a partir daí, transformou-se em cidade. 

Naquela época, quando, determinado povoamento atingia a gradação de vila, então, tinha direito a emancipação. Esse pressuposto foi abolido com a denominada Revolução de 30. 

Depois da Independência do Brasil, quanto, à divisão administrativa das intendências do Rio Grande do Norte, teve a Lei de 1835. 

Em 1835, a Lei Nº 24, de 27 de março, a capela de Santa Rita tornou-se matriz, no povoamento de Santa Cruz, da ribeira do Trairi, município de Natal, configurou os seguintes limites: POENTE, com a freguesia de Acari; NORTE, com a freguesia de Extremoz até a confrontação do Potengi Pequeno; NASCENTE, do Potengi Pequeno a Caiçara de Baixo, incluiu o rio Trairi e a fazenda Carrapateira, no entanto, excluiu o rio Jacu, pois, este serviu de limite com a freguesia de Goianinha; SUL, todo o limite desta província com à Paraíba, até encontrar com o limite de Acari. 

A Resolução Nº 31, de 30 de março do mesmo ano, determinou que a freguesia de Santa Rita passasse a pertencer ao município de São José de Mipibu. 

Em 1876, a Lei Nº 777, de 11 de dezembro, elevou à categoria de vila o povoamento de Santa Cruz, com a denominação de vila do Trairi. 

Pela ausência de uma fonte segura e considerando de origem oral, as afirmativas cascudianas, de 1844, 1848 e 1850, conclui-se que Fabião das Queimadas não poderia ter nascido em Santa Cruz, pois, este não tinha ainda autonomia para designar naturalidade de alguém. 

Também, não nasceu em Natal, porque, em 1835, o povoado de Santa Cruz, a partir de 30 de março, passou a pertencer a São José de Mipibu, e, na área desta toponímia, provavelmente, nasceu o grande Fabião das Queimadas, localmente, hoje, pertence a Lagoa de Velhos. 

Era isso que tinha a dizer... 

Carlos Alberto


REFERÊNCIA 

ARAÚJO, P. Soares de. REPERTÓRIO DAS LEIS ESTADUAIS REFERENTES AOS MUNICÍPIOS. Através, da Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, V. 23 e 24, Ano 1926-27, páginas 22-104.










Carlos Alberto, palestrante e estudioso das manifestações culturais populares 

9 comentários:

  1. Caro Carlos Alberto, ouvir e ler o que tem a nos dizer é sempre prazeroso e proveitoso, digno de confiança. Você não dá ponto sem nó. Tudo que diz é benzido e bem dizido. - Gilberto Cardoso dos Santos

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    1. Bom dia, poeta Gilberto Cardoso...
      Eita!
      Não sou tudo isso, apenas, tentei ver a divisão politica e administrativa do RN, na época do nascimento de Fabião.
      Obrigado...

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  2. Prezado amigo Carlos, quando entrei no curso de educação artística na UFRN no ano de 1996, Câmara Cascudo ainda atraía discursões acaloradas sobre sua obra. Não restam dúvidas da sua genialidade, inclusive, um motivo de orgulho para nós potiguares pudermos contar com tamanha sabedoria entre nós, seus conterrâneos. Já ouvi Mário Sérgio Cortella citar Câmara Cascudo em uma de suas palestras, motivo pelo qual enviei o vídeo para sua Neta e minha amiga Daliana. Esta introdução tem o objetivo de enfatizar a admiração que sinto por esse grande pesquisador que nos honrou com sua inteligência disponibilizando uma obra jamais catalogada de forma tão séria quanto a dele. Jamais passou pela minha cabeça concordar com um fato que aconteceu em sala de aula naquela época em que eu era estudante. O fato é que em uma das aulas, a professora utilizava uma obra desse respeitado autor, quando um colega de classe disse que Câmara Cascudo "era uma falsário, que utilizava as pesquisas dos seus alunos para publicar livros. Mandava os alunos fazerem as pesquisas e depois apenas colocava em ordem cronológica publicando-as sem dar os créditos merecidos". Quando li sua descoberta de várias datas sobre Fabião das Queimadas, lembrei-me logo dessa polêmica acontecida em sala de aula. Se isso que o colega falou de Câmara Cascudo tem fundamento ou não, não cabe a mim julgar. Tenha a certeza, amigo Carlos, que desejo a você coragem para continuar farejando contradições em obras tidas como intocáveis, afinal de contas, estamos aqui para contribuir com nossa cultura, e obrigado pelo texto bem escrito.

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    1. Bom dia, grande artista e intelectual Heraldo Lins, saudações...
      É muito salutar esse seu depoimento e ponto de vista.
      Eu faço uma pesquisa bastante elementar sobre o poeta Fabião das Queimadas, então, tentei ver a divisão politica e administrativa do RN, a partir de 1835 e comparar com a data de nascimento do poeta potiguar, então, observei, que, na época, Santa Cruz ainda não era emancipado, e, as informações cascudianas precisariam de fonte primária comprobatória...

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    2. Obrigado pelo grande artista e intelectual... Kkkkkk

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  3. Sobre a duplicidade de datas sobre fatos, pouco documentados, é bastante previsível que haja certas discordâncias.
    O texto do Carlos Alberto não apresenta falhas técnicas nem históricas.
    O único ponto que considerei meio frágil, diz respeito à carência de argumentos, no referido texto, para ele (o autor) embasar sua crença ou convicção de que o Fabião realmente tenha nascido em Lagoa de Velhos.
    Talvez ele até tenha esses dados conclusivos, apenas faltou contemplá-los na sua escritura...
    Ou, quem sabe, fazendo uso aqui do Princípio da cooperação, elaborado por Paul Grice, Carlos Alberto tenha contado com a nossa compreensão colaborativa...

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    1. Olá, Carlos Alberto.

      Excelente tréplica.
      Como imaginava, você demonstrou inequivocamente as razões para justificar sua tese.
      Na oportunidade, ainda nos presenteou com uma verdadeira aula de história potiguar.
      Manifesto aqui o meu sentimento de respeito e admiração pela sua pessoa e pelo seu trabalho.
      No mais, desejo que continue a nos brindar com páginas sobre a história de nossa gente e de nossa terra potiguar.
      Abraço.

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  4. Boa noite, Professor José da Luz, saudações...

    Muito boa a sua observação (crítica) da não argumentação de Fabião ter nascido em Lagoa de Velhos. Porque, o pequeno texto acima só tinha o objetivo de tentar mostrar, que, cronologicamente, não poderia ter nascido em Santa Cruz, pelos os argumentos expostos. Essa afirmativa, historicamente, foi sempre dita por um monstro sagrado do intelectualismo potiguar, mas, nada de desafio. Deveria sair em outro momento, mas, agora, vou tentar mostrar (e sumariamente), que, desde 1962, Fabião passou a ser natural de Lagoa de Velhos.
    Para se entender a vida de Fabião, precisa-se conhecer a geneologia dos Ferreiras da Rocha, principalmente, a partir de Miguel Ferreira da Rocha. Veio de Goianinha, adquiriu terras no alto Potengi (hoje, Barcelona), no entanto, não está inserido na lista dos sesmeiros potiguares, então, provavelmente, comprou terras e fixou-se e instalou a fazenda Gangorra (hoje, Barcelona).Teve quatro casamentos e os seguintes filhos: Florência (do 1º); Jose Ferreira, Sebastião José e Francelina (do 2º); Horácio, Teófilo e Francisca (do 3º) e do 4º não teve filhos. Fabião, escravo de Miguel Ferreira da Rocha, nasceu, contemporaneamente, aos filhos do 3º casamento, pois, Fabião (de 1848?), Horácio (de 1847), Teófilo (1849) e Francisca (?).
    Em 1862, Fabião, mais ou menos, com 14 anos de idade, através, do testamento de Miguel (no mesmo ano de 1862), passa a ser promessa de espólio do filho (e testamenteiro) Sebastião José, mas, dois anos depois do testamento, Sebastião José falece. Então, Miguel já falecido, Sebastião José não deixou descendentes e Fabião passou a ser escravo de José Ferreira (como espólio).
    A base econômica dos Ferreiras da Rocha era no conjunto de fazendas: Gangorra e Penafiel (hoje, Barcelona) e Queimadas (hoje, Lagoa de Velhos).
    Nessa relação de identidade entre nome pessoal e toponímia, então, surgiu Fabião das Queimadas. Casou-se em 1881, provavelmente, com 33 anos de idade, e, sua esposa era Joaquina, o lugar da realização do casamento foi na capela de Cotovelo (hoje, fica em Barcelona).
    Com o advento da República e aliados de Pedro Velho (da família Albuquerque Maranhão), os Ferreiras da Rocha destronaram Abdias Furtado do poder em Santa Cruz (já emancipado desde 11/12/1876), então, o Zé Ferreira teve por quatro ou cinco anos de mandatos de intendente santacruzense (com mandatos de três anos); e, depois, de 1910, os Ferreiras da Rocha perderam o poder político para o coronel Mergelino.
    Fabião das Queimadas compra e paga a sua alforria (talvez, por pecúlio) a Zé Ferreira, que, tinha adquido por espólio.
    Fabião teve as seguintes naturalidades: de 1848 (?) a 1876 São José de Mipibu, de 1876 a 1928 Santa Cruz, de 1928 a 1958 São Tomé, de 1958 a 1962 Sítio Novo e de 1962 até o presente momento: Lagoa de Velhos. Essa variada naturalidade fabiônica é consequência dos desmembramentos e mudanças na divisão política e administrativa dos municípios potiguares, desde o império.
    Um determinado ser político pode ter várias naturalidades, mas, normamelmente, só é mencionada a primeira e a última, no caso, de Fabião, localmente, nasceu na área de São José de Mipibu, que, hoje, pertence a Lagoa de Velhos.
    Essas informações são oriundas da hemeroteca da BN, documentos da Igreja Católica, documentos pessoais, testamentos, inventários, livros, depoimentos, mapas, etc..
    No entanto, fica claro, não sou o dono da verdde e o debate é sempre bem vindo e salutar. Pois, hoje, posso afirmar algo, e, depois, poderá surgir uma nova fonte primária, portanto, não terá nenhum problema em voltar atrás numa determinada opinião e formar uma nova síntese.
    Era isso que tinha a dizer...

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  5. *Digo:... o Zé Ferreira teve quatro ou cinco mandatos de intendente santacruzense (com mandatos de 3 anos)...

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