TUDO INTERLIGADO
Na leitura deste texto, deve-se prestar atenção aos buracos que irão aparecendo igual uma estrada sem manutenção. Nove ao todo é a quantidade deles, alguns visíveis e outros nem tanto. A impressão, é que se trata dos orifícios do corpo humano. Na leitura, os buracos não são tão visíveis quanto no corpo. Quem os descobre por aqui, são os críticos literários; lá, nem precisa de crítico.
O que considero buraco literário são os rumos que a conversa deveria seguir e não segue. Às vezes fala-se de algo e não se dá a devida atenção, pula-se para a linha seguinte como se aquilo dito fosse apenas para encher a página. Os autores do século dezenove, muitos deles, além de não deixarem buracos, deixaram excesso de lombadas. As lombadas num texto são demasiadas explicações, ruminâncias, etc.
Não quero que ninguém compare as lombadas com seios femininos nem com glúteos. Só em dizer isso eu já desperto no leitor que tudo que fazemos está diretamente ligado aos buracos reais. Vamos tentar entender isso, então, façamos a comparação de um texto com buracos orgânicos.
Primeiro, são os olhos que deixa a pessoa sabendo de qual assunto se trata, preparando-o para o que vem em seguida. Só que quando se olha, ninguém quase percebe também que está sendo olhado. O parágrafo inicial fica observando a reação de quem está lendo-o e decide o que dizer no próximo.
No segundo, deve haver duas ideias diferentes, porém que se complementem. Um ouvido escuta o barulho da rua e o outro o das interrogações. Se está complicado de entender vejam o que diz as duas cavidades do nariz: se não houver um ambiente agradável quanto ao cheiro, não consigo me concentrar.
O cérebro fica tentando entender o que está lendo e ao mesmo tempo procurando decifrar os cheiros e barulhos. Aqui é um verdadeiro campo de batalha. São muitas funções acontecendo para um só cérebro lutar em manter a atenção, o que muitas vezes não é possível.
Além dos olhos cansados de tanto ir para lá e para cá, o barulho do menino brincando, televisão ligada, cheiro do feijão cozinhando, contribuem para dispersão, sem falar do tic tac avisando que está quase na hora daquele outro compromisso.
O palito no meio da página significa que a boca está descansando de uma recente refeição. A língua fica passeando pelos lábios quando a leitura é agradável. Nesse momento da leitura, a boca já está quase sem controle. Não adianta fechá-la. Deixemos escorrer a baba porque é sinal de que há interação com que está sendo proposto. Muito bem! passemos a língua entre os lábios, mais uma vez, para não os deixar ressecados, ou então, limpemos o canto dela com a manga da camisa.
No final do texto acontece o fechamento. Dessa parte nem vou falar porque estou sentado em cima, e é feio tratar de assuntos desse porte por aqui. É como se o ser humano fosse feito somente dos parágrafos iniciais. Desconfio que o número sete teve seu valor descrito pelos filósofos gregos porque se referiam aos buracos na cabeça. Os dois parágrafos finais, chegando a nove, devem ser descartados. E eu, para não ir de encontro aos sábios gregos, também faço o mesmo.
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Heraldo Lins Marinho Dantas
Natal/RN, 20.08.2022 – 11:57
É isso aí, Heraldo, mais uma boa reflexão despretensiosa, comprometida apenas com o fazer literário. Parabéns! - Gilberto Cardoso dos Santos
ResponderExcluirGrato, Gilberto.
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