sábado, 20 de outubro de 2012

SEU CINEMA PERDIDO E MEU FOLCLORE MUDADO - Nailson


Jovens amigas de Fernando, ou Luiz, ou Nando - não se sabe direito o que nele rola, pra tanta mudança de seu nome atual, se beleza em todos eles, ou se simples crise existencial - reclamavam-lhe da falta de cinema em Santa Cruz. Elas lamentavam que nem filme pirata passa mais, como aqueles de suas infâncias queridas. É, as coisas e os tempos são outros mesmo

! No meu tempo de menino, lá pelos idos iniciais de 1970, existia o meu Cine Santa Rita, e filmes de Tarzan, de Sansão e Dalila, Bang Bang com Giuliano Gemma, 007 e até de Teixeirinha and Mary Terezinha se exibiam naquela inesquecível tela de minhas lembranças santas. Quanto folclore naquele meu tempo havia também! Brincadeira de Academia (chutar uma pedra com um pé só dentro de quadrados sem ultrapassá-los), Garrafão, Pau-de-Sebo, Vira-Moeda, Laça-Laça (com aposta em dinheiro de carteira de cigarro), Tica (Pega-Pega), Polícia e Ladrão, Esconde-Esconde, Passa o Anel... epa, peraí ... essa era a melhor de todas, e Mariana a mim passara secreta e sempre pras minhas mãos o seu melhor anel. Fora parceira tal, meu melhor folclore, uma bela arte, meu inquieto bem e meu gostoso mal. Bianinha, morena trigueira, linda, de olhado 14 vezes esverdeados e cabelos lisamente esvoaçados, fora o meu mais doce beijo, o meu amor primeiro e minha mais sublime parte. Biana fora eterna no mais duradouro do cada dia daquele tempo nosso de ontem! Biana, minha eterna brincadeira de rodas nas boas noites de nossas luas! Ana 14 mimos, duplamente guerreira, Ana indo e voltando, pra frente e pra trás, pra trás e pra frente na mais sincrônica imagem de sua grafia fora a minha melhor criação. É por isso que era Biana, somente minha! E só pra mim passara secretamente o seu anel. Fêmea arredia, valente e apaixonada por minha beleza crescente! Bianinha era a verdadeira Leila Chiquinha Diniz Gonzaga de meus 11 aninhos vividos . Mas tudo voa , tudo muda e tudo passa. Não mais sussurro no seu silêncio fácil aquele “pirulito que bate, bate, pirulito que já bateu, quem gosta de mim é ela, quem gosta dela sou eu”! Confidenciaria-lhe, sim, na mais doce visão de seu belo engaste sensual, e se vida ela hoje tivesse, que o “anel que tu me deste era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou”. E isso é o TEMPO com o seu cruel poder de girar as muitas rodas das grandes paixões. Ele passa, apaga e murcha as mais lindas flores de nossas artes. Vejo hoje que o folclore mudou-se pras praças e ruelas das redes sociais. E camuflado tenta-se nos jogos eletrônicos, nas amizades destes tempos virtuais, nas tecnologias do PCS, do tablets dos curiosos, dos notebooks ultrapassados e, sobretudo, nas infâncias presentes dos que Ipod ou daqueles que não podem, mas Iped. O meu folclore chora o esconde-esconde das brincadeiras de roda e o profundo cheiro no cangote da cabrocha assanhada do meu tempo de menino. Minha arte soluça o presente dum anel secretamente tido nos embrulhos aromatizados na melhor fragrância dum olhar maliciosamente piscado. E hoje muito se vê, nos salões reais dos bons encontros, varões louvando em suas grandes rodas a garrafinha etílica que no epicentro fica à espera das muitas bocas ébrias e de seus melhores beijos no vai e vem de suas alegrias falhas. As jovens amigas do jovem Fernando, ou Luiz, ou Nando - não se sabe direito o que nele rola, pra tanta mudança de seu nome atual, se beleza em todos eles, ou se simples crise existencial – razão por demais têm no lamento de seu cinema perdido doutrora. E eu acrescento no seu o meu lamento passado na pele dum tempo de meu folclore mudado.

Nailson Costa, 20.10.2012

4 comentários:

  1. É caro Nailson, quanta saudade dos jogos de vira-cunha, mas hoje o homem ficou burro, inventou o computador e a gente fica enclausurado na frente dele.

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  2. Eu gosto muito desse resgate histórico e saudosista de Nailson, mais percebo que esse sentimento é bem raro por parte do póvo de Santa Cruz. Eu estudei o ensino fundamental de 5ª a 8ª série nesta cidade, de 1977 a 1980 indo todo dia a exemplo do que acontecia com os demais alunos das cidades vizinhas. Tenho algumas lembranças, registros e imagens daquela época, mas para muitos, ou passaram uma borracha ou não se sentem estimulados a compartilhar.

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  3. Nailson,

    Outro texto com a sua indelével e “incopiável” marca! Embora seja um pouco mais novo que você, também participei da maioria das brincadeiras (e brinquedos) citada no texto. Mas temos que aceitar que os tempos são outros, e nossos filhos convivem com outras “ferramentas lúdicas”; eles certamente achariam um saco brincar como brincávamos. O que precisamos é evitar que eles se “engessem fisicamente” diante das tecnologias digitais de hoje, tornando-se sedentários, obesos, enferrujados aos 15 anos, molengas, ...doentes. Viva o mundo e as tecnologias deles (nós também as adoramos!)! E viva a energia saudável (e a nostalgia) que trazemos de nosso mundo passado!

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