quarta-feira, 31 de agosto de 2022

OUTRAS ALTERNATIVAS - Heraldo Lins



 OUTRAS ALTERNATIVAS


Que coisa interessante é ser obrigado a falar apenas porque precisa dar vazão às dúvidas amanhecidas. Lá longe alguém bate, não sei se arrombando uma casa ou não, só sei que são 04:26 e isso não é hora para bater um ferro numa parede como parece ser o que está acontecendo. 

Fecho os olhos tentando, com isso, que a mensagem já chegue pronta. Articular algo que tenha uma fundamentação, é muito cansativo. O bom seria que as coisas fossem fáceis e imediatas, que eu pensasse e logo se materializasse. 

Acoo um assunto debaixo de umas pedras, mas não vou checá-lo. Não me interessa saber se há uma perereca-de-capacete se escondendo por lá, o que importa é ficar no conforto. 

As pancadas voltaram a ser ouvidas e me refugio debaixo do cobertor com um pouco mais de meio metro cúbico ocupado pelo celular teclado pelo indicador da outra mão. Descansei os braços e nesse intervalo veio-me a cena forte de... Vou deixar para dizer em outro momento, pois agora não quero falar de coisas muito desagradáveis, o máximo que falo são das batidas que vêm e vão. 

O autor daquele barulho é um homem que, com certeza, não faz parte do clube dos bilionários. Parece que a vida faz distinção nas profissões de acordo com o grau de poder aquisitivo. Aquele pedreiro, mecânico ou ladrão que está batendo não se enquadra nesse perfil. 

O que leva uma pessoa a bater com tanta força? É inútil querer saber disso, mas que está perturbando, ah! isso está! Nem me dou ao trabalho de gritar para ele parar porque ao invés de um barulho seriam dois, e depois três contando com o grito da vizinha me mandando calar-me e assim, como os galos, seríamos um galinheiro só. 

Vou prosseguindo sem parada para consertar algum erro ou significado. Já ouvi falar de pessoas que escreveram uma obra em dezesseis dias. Vou tentar este em dezesseis fôlegos. O calor está chegando nessa conversa rasa. Essa ideia de construir um texto sem nada dizer é uma boa. Não poderia esperar algo de alguém se a esse alguém não é dado o direito de tomar conhecimento. 

Eu não me dei conta, mas a janela chegou apresentando um repertório de céu nublado. Não que estivesse assim lá fora, mas faz parte da sua capacidade de inovação. 

Poderia dizer que meu quarto é a caverna de Platão numa referência ao mundo histórico de domínio público, mas quero apenas falar da minha janela, essa quase ninguém sabe como é, e mesmo que tenham acesso ao vidro e armadura que a compõe, jamais vão perceber que ela tem autonomia para apresentar sons, luz, vento, até pingos d'água já fez questão de mandar quando esqueci de mantê-la fechada.

Há outra janela pendurada na minha parede que joga programas patrocinados, mas não me dá a extensão dos quatro sentidos como a janela branca dá. 

E agora o que direi? Não respondo porque essa pergunta serve apenas para marcar o esgotamento de um assunto para adentrar a um outro. Essa técnica é mais do que visada, chamando-se de incompetência literária. Pode até se tornar chato esse costurado, mas faz parte de misturar uma outra técnica com outra e mais outra desde que se dilua a precariedade de permanecer dizendo algo importante. 

Só não quero utilizá-la na própria frase, aí já seria demais. Se eu fizesse uso desse expediente eu começaria dizendo que a literatura é uma comida que serve para alimentar uns e causar dores em outros; que serve para dar alívio em alguém e sufocar os "ninguéns". 

O bom disso tudo é não se preocupar em tropeçar na pontuação ou termos esdrúxulos. A escrita livre torna as pessoas mais livres ainda para cavalgarem no sabor de uma "leitura barbatoa" a ponto de se convencerem que amam ler, e isso é o que importa.


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 30.08.2022 — 06:48



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