segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

NADA SE CRIA, TUDO SE COPIA* - Heraldo Lins

 


NADA SE CRIA, TUDO SE COPIA*


Caia, sabonete, pode cair! Já são três no piso do banheiro, mas não vou dar o cabimento de apanhá-los, disse o irado sujeito.  Vou comprar mais dez para colocá-los na saboneteira. 

Cada um deixa cair alguma coisa durante a vida. Alguns são os cônjuges fugindo de forma escorregadia, os empregos ou as oportunidades perdidas no ralo do destino.  

A pessoa que almoça já não é a mesma que janta, significa dizer que a mulher a cada dia é trocada e troca de marido todas as noites. Isso vem acontecendo desde que o filósofo disse que ninguém se banha no mesmo rio duas vezes, já que as águas passam e a pessoa se transformou desde o último banho. Antes a vida era pacata, mas foi só alguém abrir os olhos dizendo isso, que tudo se modificou.

Quando se deixa cair a dúvida de plágio, mesmo que não tenha ocorrido, tudo que o artista faz deve ser medido e pesado para ver se é autêntico. É o mesmo cuidado para se provar que há uma nova correnteza passando de rio abaixo.

Há várias histórias comprovando que o padrão humano atende aos mesmos estímulos em qualquer tempo ou espaço. Não se deve ter a arrogância que se está fazendo algo totalmente novo. Muitos cientistas correram contra o tempo para apresentarem suas descobertas antes de outros que estavam pesquisando o mesmo assunto em lugares totalmente distantes. Isso é normalíssimo, e como nós pensamos dentro da caixa humanoide, aqui e acolá, nos pegamos falando, inocentemente, algo que alguém já falou, só que de forma diferente.

Para sermos totalmente autênticos, teríamos que pensar como um outro ser, e isso somente é possível em outra dimensão, se é que existe. Eu mesmo já me peguei sendo plagiador dos meus próprios textos, e não só sou eu não! Volta e meia chega-se ao mesmo assunto e o fraseado torna-se muito parecido. Eu gostaria muito de ser plagiador porque isso daria o aval de que estaria decorando discursos de outros e fazendo jus a uma boa memória, coisa que não possuo.

Não foi minha escolha, mas, organicamente, sou completamente plágio do meu irmão mais velho. A careca, a agonia na cabeça, o cacoete de passar o dedo indicador em cima da unha do polegar, eu aprendi sozinho, depois foi que ele me alertou que eu estava lhe plagiando. 

A vigilância está tão rigorosa, que ultimamente estou com medo de ir ao banheiro e ouvir a minha esposa dizer: invejoso, só porque eu estava na privada você inventa de ficar lá. Isso é plágio!



Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 27.02.2022 - 15:54


* Frase de Abelardo Barbosa, o Chacrinha



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