quarta-feira, 8 de março de 2023

CAMPO DE BATALHA MATRIMONIAL



 CAMPO DE BATALHA MATRIMONIAL 


Daqui a pouco as pernas devem ir para uma esteira se movimentar porque ontem fiz a inscrição na academia. É moda, e para não fugir da contemporaneidade fui obrigado, pela família, a me enturmar.  Meu horário começa às cinco e vai até meia-noite.


Ontem tive pesadelos só em pensar em fazer algo inútil. Do meu lado, havia uns bichos dentro de um girador me convidando para emagrecer. É melhor comer menos, ainda quis argumentar dizendo que economizaríamos em comida e academia. Não obtive sucesso, e por isso estou nesta madrugada afiando minha coragem para ir. 


Os tênis foram comprados, meias, calções e camisetas. É melhor comprar logo sete de cada, disse a mulher já fazendo o roteiro dos meus esforços. Seria bom se eu pudesse mandar o corpo fazer exercícios enquanto a cabeça ficava aqui comendo pipoca, o que acha? Não tem graça essas suas piadinhas. Escutando isso, deduzi que não tenho vocação para humorista, mas, segunda ela, para atleta eu tenho. 


Você anda muito "moconho." Nessa hora eu saí de fininho e tentei achar o sinônimo de "moconho." Coloquei no Google e só saía "mocinho." Eu sei que estou meio desanimado, mas não tanto a ponto de "moconho." Esse termo é tão estranho que nem tiveram o trabalho em registrá-lo, e isso, acredito, foi o que me tirou o sono. A pessoa ser chamada de algo que nem existe é muito degradante. Se ela tivesse me chamado de outra coisa eu até teria um referencial para me enraivecer, mas assim fiquei meio desorientado achando que se eu saísse à rua estaria estampado na minha testa: lá vai o "moconho," liam e gritavam os transeuntes. Acho melhor deixar para sair somente quando essa fase de "moconhez" passar. Penso dessa maneira porque ela ainda não acordou, todavia com ela ditando regras sinto-me mais estimulado a participar do "moído."


É nisso que dá a pessoa se casar com uma mulher trinta anos mais jovem. Por mais que me esforce, preciso de uma dose extra de vitaminas. Um dia desses, ela me chamou para uma liquidação. Mas amor, nós já temos vários desses em casa, disse eu agarrado com uns copos de vidro. Bote no carrinho também esses trinta quilos de açúcar.  A diferença é só vinte e cinco centavos, e levando em conta que consumimos um quilo por mês, será mais de dois anos matando formiga na despensa. Não tem importância, o importante é eu ter assunto enquanto espero o menino sair da escola. Aquelas dondocas vivem dizendo que compraram roupas baratas em Miami e eu vou rebater com açúcar e copos. 


Eu tenho pavor a altura, entretanto ela agora inventou de descer de rapel aqui do vigésimo andar, e ai de mim se não for junto. Também não bebo, ou melhor, não bebia até ela inventar de disputar quem aguenta tomar mais cachaça de uma só vez. O pior é que ela tem mania de limpeza e agora cismou de lavar minhas partes íntimas com água sanitária. Diz que não suporta minhas cuecas usadas com odor fora do padrão aceitável. Isso é normal, escrevi no zap dela para não lhe perturbar com meus pontos de vista, mesmo assim não desistiu da ideia. 


Fiquei um pouco apreensivo quando ela disse que se água sanitária não resolver vai apelar para ácido muriático com pimenta. Tentei dissuadi-la, porém foi pior: ela sugeriu trocar a pimenta por gasolina tocando fogo em seguida. É, permanece a pimenta, concordei deixando bem claro que a última palavra sempre será a minha e que até admito ser chamado de "moconho," só não, de manicaca.


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN,  07.03.2023 - 04h45min.




Um comentário:

  1. "Moconho". Até agora para mim um termo nada ilustre desconhecido. Fiz o mesmo: pesquisei e apareceu "mocinho". O mais próximo disso é "mocorongo".

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