sábado, 18 de julho de 2020
DOIS POEMAS SOBRE A ESCRITA POÉTICA - Nelson Almeida
SURGIMENTO
I
Meus poemas nascem como nascem os sertanejos, sob a luz turva do candeeiro
Gritam em partos difíceis
Respiram ofegantes
Ganham vida lentamente
Alimentam-se de mim
II
Meus poemas voam como voam as aves de rapina no sertão
Descem ferozes e certeiros
E me cravam suas garras
E me rasgam a pele
E me cortam a carne
Mas esta dor é vital, é necessária
III
A verdade é que minto
Não sei como nascem os poetas e seus poemas
Sequer me apercebo quando surgem os meus poemas
Sei que eles crescem
E se rebelam, e gritam, e querem mudar o mundo
Depois pedem socorro
Envelhecem com o poeta sob falsos julgamentos e más apreciações
Depois o consideram sábios
O poeta para de sofrer
Mas os poemas só serão eternos quando o poeta morrer
Nelson Almeida
São Paulo, 29 de fevereiro de 2020
15h34min
PALAVRA
Ela surgiu nua
Bruta e preciosa
Era noite de lua
Trabalhe-me! Lapide-me!
E te serei grata
Ela dançava, se insinuava
Vamos! Abrace-me!
Eu me aproximei
Ela me pegou a mão
Navegamos um rio
Um oceano bravio
Ela sussurrou em meu ouvido: feche os olhos
Fechei os olhos e dormi
Tudo pareceu um sonho
Eu navegava, navegava...
Navegava rumo à mulher amada
Mate-me!
Me ordenou de súbito
Mate-me e renascerei noutros corações partidos
Eu a matei
Eu a matei
Eu a matei...
Olhos em lágrimas
Coração em alegria
Matei a palavra saudade
Saudade
Saudade...
Nelson Almeida
Natal, 15 de julho de 2020
21h06min.
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