sábado, 9 de dezembro de 2017
UM POEMA QUE DESPERTA (AUTOR: VICENTE COELHO)
UM POEMA QUE DESPERTA
AUTOR: VICENTE COELHO
Tem cantador de repente
Confiante no seu grito
Pra cantar alto e bonito
Se julga em todo ambiente
Por querer entrar na frente
Só ele é quem quer cantar
Vive a desclassificar
Os cantadores menores
Nos ambientes maiores
Procura se calar.
Compra logo a prestação
Uma beca, uma viola
E o cartaz se desenrola
Na imensa região
Por que ele na canção
Tem um jeito ritmado
Por ser muito elogiado
Chama o pequeno de boi
Esquecendo que já foi
Um palhaço no passado.
Os seus primeiros repentes
Nada tinham de certeza
Ele esqueceu a fraqueza
Dos versos inconscientes
Quando em baixos ambientes
Cantava pouco e ruim
Desgostou mais de um festim
E depois de muito elevado
Engavetou no passado
Pra ser orgulhar no fim.
Olha vossa majestade
Você começou no A
Passou por B por H
Tornou-se essa sumidade
Hoje na humanidade
É teólogo no saber
Nada mais falta aprender
Tem tudo em sabedoria
Quando você não sabia
Também queria viver.
Eu sei que o vaivém
Do tempo lhe desconforta
E você vai bater a porta
De um cantador Zé Ninguém
Olha você hoje tem
Uma vida admirada
E a mesma rapaziada
Que lhe tem hoje por fã
Pode dizer amanhã
Que você não canta nada.
Quando a ferrugem dos anos
Destemperar-lhe a garganta
Você taciturno canta
A dor dos seus desenganos
Seus aplausos soberanos
Ficarão distanciados
Quando forem sepultados
Seus gestos involuntários
Os pequenos solitários
São por você abraçados.
Medite que canhotinho
Foi cantador aplaudido
José Alves tão sabido
Hoje está quase sozinho
Leia de Antônio Marinho
Seus versos penalizados
Diminua seus pescados
Colega fazendo assim
Julgando seu fim no fim
Dos companheiros passados.
Hoje para os coronéis
Fala em ciências empíricas
Canta poesias líricas
Nas poltronas de hotéis
Ensina aos coronéis
As origens dos vocábulos
As construções dos estábulos
As fundações dos reinados
As lágrimas dos recalcados
E os campos vastos dos pábulos.
Esse seu dom de burguês
Com o tempo eu sei que muda
Recorde quem foi Zé Duda
Lembra quem foi Milanês
E a lama o que foi que fez
Com grande Rogaciano
Castro Alves baiano
Os escombros de Claudino
A lousa de Zé Faustino
E as proezas de Romano
Se você por sonho visse
Sua matéria na cova
E de Faustino Vila Nova
Em suas cinzas dormisse
Talvez até que caísse
Sua besteira singela
Sua matemática bela
Media desta maneira
Todos na medida inteira
Ou também meia tigela.
Veja também: AOS POETAS ARROGANTES
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