sexta-feira, 1 de abril de 2016

NO SÍTIO DE JOÃO BEZERRA - Hélio Crisanto



NO SÍTIO DE JOÃO BEZERRA

João Bezerra no seu sítio
Tem zelo e muito cuidado
Se for num ano de inverno
Nasce tudo avantajado
Um certo dia, não minto
Tirou o bico de um pinto
Pra fazer cocho pro gado

Jerimum de trinta quilos
Pra ele é coisa pequena
Batata de três arrobas
Não tem a pesagem plena
Mandioca de dez braças
Manda jogar para as traças
Arrancar nem vale a pena

Centro e trintas garnisés
João engorda num chiqueiro
Cevando os bichos gigantes
Pra lucrar muito dinheiro
Com xerém e fruta pêca
Mesmo num ano de seca
Ele exporta pro estrangeiro

As frangas do seu terreiro
Ninguém acreditaria
Quando estão aborrecidas
Botam três ovos por dia
Isso lá não é problema
Cheio de clara e de gema
Tem forma de melancia

Quando tem festa no sítio
Manda matar um barrão
Chama mais de mil pessoas
Pra comer da criação
Após toda comilança
Distribui pra vizinhança
O que sobrou da porção

Num ano de pouca chuva
Algaroba sai mirrada
Cada bagem que o pé bota
Dá quase uma tonelada
Com dois palmos de largura
Manga já nasce madura
Bezerra nasce amojada

Surucucu de dez metros
Ele diz e não se acanha
O maturi de um caju
Dá cem quilos sem castanha
Uma cobra de veado
Mede o dobro do cercado
Amigo é grande a façanha

João cria com muita luta
Quinze pebas numa loca
Cada um come por dia
Trinta quilos de minhoca
Não vendo algum empecilho
Se plantar um pé de milho
Já nasce dando pipoca

Certo dia num barreiro
João pescou uma piaba
Lhe digo não é mentira
Até hoje ele se gaba
Era tão grande o peixão
Que serviu de refeição
Pra toda a cacaruaba

João sendo um sujeito sério
Não gosta de cambalacho
Plantou um pé de banana
Na barreira de um riacho
A carga foi tão pesada
Que colheu numa tacada
Mil bananas num só cacho

Pariu vinte seis cabritos
Uma cabra que João cria
Pesando dezoito quilos
Cada bicho que saia
A cabra com muito o jeito
Botou um em cada peito
Pra não haver regalia

Desse sitio todo o dia
Sai jarras de goiabada
Carretas de tangerina
Carro pipas de coalhada
Lá em João pra seu deleite
Corre um riacho de leite
Pra nutrir a meninada

No sitio de João Bezerra
Nasceu um pé de pimenta
Com dez metros de altura
Mas isso ele nem comenta
Quem for lá terá a prova
A plantinha ainda nova
Sua sombra era opulenta

Nesse sítio me acredite
Tem um pé de abacateiro
João testou uma enxertia
Cruzando com um cajueiro
Esse pé quando se zanga
Bota caju, uva e manga
Safrejando o ano inteiro

Lá no curral de seu João
Tem um bezerro injeitado
Que costuma tomar leite
Num tambor enferrujado
Ele sem nenhum estresse
Numa mangueira abastece
Pro bicho ficar cevado

Na lavoura ele cultiva
Mil alqueires de feijão
Mil hectares de fava
Quarenta de pimentão
Possui seiscentos bois
Por lá um grão de arroz
Parece mais um melão

Lá em João um pé de cana
Tem grossura de um coqueiro
Botando folhas de açúcar
Servindo pro mundo inteiro
Por ser tão batalhador
Virou grande exportador
Criou fama de usineiro









João Bezerra tinha um burro
Galopeiro e andador
Mais veloz do que um trem
Tinha no rabo um motor
Com tanta vitalidade
Se houvesse a necessidade
Desatolava trator

Esse burro minha gente
Andava o nordeste inteiro
Carregando rapadura
Quando João era tropeiro
Certo dia um caminhão
Bateu no burro de João
Virou num despenhadeiro

Num dia de muita chuva
João se encheu se alegria
Quando o viu o pluviômetro
Esborrotando água fria
Ele esqueceu emborcado
E viu que tinha sangrado
Duas vezes num só dia

Certo dia no roçado
João ouviu um barulhão
Algo muito assustador
Como se fosse um trovão
Não contendo a agonia
João partiu uma melancia
Saindo dela um leão

Esse sitio ele não vende
Por ser grande a sua saga
Não tem comércio pra ele
Com orgulho João propaga
Podem fazer fuzuê
Nem mesmo São Saruê
Ocupou a sua vaga
(Hélio Crisanto)

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