quarta-feira, 1 de novembro de 2023

AMOR - Maria Goretti Borges

 


AMOR


Amor, sentimento de abrangência incomum, atribuições inimagináveis, significações diversas, características múltiplas, atributos complexos. O termo, num jogo dos interesses, tem sido compartimentalizado no espaço-tempo para se moldar às caixinhas das particularidades humanas. Observando-se a abrangência de suas titularidades, constata-se a posse indevida do amor e a sua fragmentação para permear discursos e projetos no intuito de torná-los confiáveis, legítimos. Ah, o amor!

O escritor C. S. Lewis, em sua obra The Four Loves, explora a natureza do amor na perspectiva cristã e divide-o em quatro categorias: storge, philia, eros e ágape - palavras advindas do grego, o que não tem sido suficiente para atender às demandas sedentas do amor. No quadrante das necessidades humanas, o amor é dinâmico, se eleva, é sublime, mas o amor também inclina, é de perdição. Pasmem: tem até o amor desalmado, que para a lágrima dos amantes - no cardápio dos amores - é o mais praticado! Há os que professam o amor verdadeiro, como se falso o amor pudesse ser! E, nessa gangorra, cada um pratica o amor que lhe convém. Imaginem só, o companheiro de Leila Diniz, em sua legítima defesa, alegou tê-la matado por amor. Pelo visto, também temos o amor que mata! Argumentos como este, dentre outros, têm sido usados para justificar inúmeras atrocidades. Seria o amor atroz mais uma desqualificação do amor bondoso? Na diversidade que o habita, o amor é atual: nas redes sociais os emojis do amor – coraçõezinhos – são as coisas mais fofas e usuais!  

No mundo dos amantes, o amor não correspondido tem cor. “Vá, se mande, junte tudo que você puder levar. Ande, tudo que parece seu é bom que agarre já (...) os alquimistas já estão no corredor e não tem mais nada, negro amor”. Dos escombros do amor, no coração de quem ama, resta uma gota de generosidade: “(...) risque outro fósforo, outra vida, outra luz, outra cor e não tem mais nada negro amor”. (It’s All Over Now Baby Blue - Bob Dylan / Negro Amor - versão Caetano Veloso e Péricles Cavalcante).

Para o poeta Fernando Pessoa, no máximo, no mundo dos apaixonados, o amor é ridículo: “Todas as cartas de amor são ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem ridículas. As cartas de amor, se há amor, têm de ser ridículas (...)”.

Dissolvidas as generalizações, eis que temos a mensagem do Apóstolo Paulo: “Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e dos anjos, se eu não tivesse o amor, serei como sino ruidoso ou como címbalo estridente (...)”.  Como também, diz: “O amor é paciente, o amor é prestativo, não é invejoso, não se ostenta, não se incha de orgulho (...)”. O amor é. E na dinâmica do espaço-tempo, revela-se de várias formas. O amor é como incenso, em sua abstração se manifesta!

“Diego não conhecia o mar.  Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dumas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: - Me ajuda a olhar!” (Eduardo Galeano). Ainda que eu dominasse o conjunto de estudos que compõe a teoria da relatividade - Albert Einstein -, não conseguiria relativizar um sentimento tão profundo e tão peculiar. Como descrever um gesto de tamanha emoção, dependência, confiança que só o amor reciproco pode vivenciar?

E, assim, o amor vai seguindo seu curso, ora sendo o centro, autor da razão: amor de canção, amor de mandamento, amor de salvação. Ora a margem, figurante da resultância: amor de uma nota só, amor de resultados, amor de prisão. O amor que não afaga e não enobrece é como o vinho que não embriaga, ambos permanecem presentes, tão somente, no dicionário da involução.


Maria Goretti Borges






18 comentários:

  1. Lindo texto ❤️ realmente o amor tem ganhado muitos sinônimos e tem sido confundido, perdido na loucura da humanidade, mas o amor é são, é único, concordo com Paulo e Fernando Pessoa

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  2. Isso mesmo minha querida Siomara! Um forte abraço 🫂

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  3. Muito bom!!!
    Parabéns pela grande criatividade e pelas belas e emocionantes junções textuais sobre a definição do amor ou da palavra amor, porém concordo muito com a definição do Apóstolo Paulo!!

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    1. Obrigada João. Não tem como não concordar com Paulo, define o amor como ninguém! Um abraço 🫂

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  4. O amor na sua complexidade requer gestos simples na sua expressão.

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  5. Isso mesmo minha querida Suzana!

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  6. @Maria Goretti Borges, mais uma vez parabéns pelo repertório discursivo. De verdade, suas crônicas é como um bálsamo para o nosso âmago, nos remete à reflexões profundas.👏👏👏👏👏

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  7. Muito obrigada minha querida amiga Walteiza! Fico feliz com suas palavras de carinho e acolhida. 😘😘😘

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  8. O amor é sem dúvidas o sentimento mais belo e raro, sim raro...
    Em minha infância fiz minha primeira reflexão sobre o amor, baseada justamente nas palavras do Apóstolo Paulo... E que até hoje levo comigo. Que lindo reviver emoções e outras reflexões sobre o amor. Mais uma vez, prof. Goretti, belíssimo texto. Parabéns!

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    1. Hummmm, o amor é realmente um sentimento lindo! ❤️

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  9. Me fez feliz ler esse texto hoje ❤️

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  10. Muito obrigada, que bom que vc gostou, assim tb fico feliz! ❤️

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  11. Seus textos são surpreendentes,sinto muito 'Amor' em lê-los
    ,pois quando você compartilha também está expressando seu Amor em diversas formas.Gosto muito da definição do Amor de
    São Paulo em suas cartas aos
    Coríntios,como gostaria de tê-lo,infelizmente ainda tenho que fazer uma longa caminhada.

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    1. Muito obrigada, fico bastante lisonjeada com as suas palavras, que sejamos sempre mensageiros do bem! Um forte abraço 🫂

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  12. Lindo texto! Sensibilidade, harmonia e elegância demonstra a crônica em definir com diversos parâmetros o que é o AMOR. Parabéns Goretti Borges.

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  13. Muito obrigada minha querida, suas palavras afagam a minh’alma! 😘😘😘

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