CABRA MACHO DE CUITÉ
(EM LINGUAGEM MATUTA)
Meu patrão, vô lhe contá
Cuma foi meu sufrimento
Desna daquele momento
Queu parei de trabaiá
Meu patrão me deu as conta
Fiquei de cabeça tonta
À procura dum seiviço
Só que eu nunca pensava
Cum trabaio queu arranjava
Arguém me sacaniava
Só pá me vê num inguiço.
É queu saí do Pelado
Cum um matulão nas costa
Pu causa duma proposta
Dum fazendero afamado
Da Barra de Santa Rosa
Que mandou o seu chofé
Vim vê se achava em Cuité
Um caboco bom de prosa
E que tivesse parado
Prá trabaiá na fazenda
Mais dixe: É bom que intenda
Tem que vivê pá dá renda
Sempre na luta do gado.
Eu recibí o recado
Saí à boca da noite
Pai dixe: Num se afoite
Ande cum munto cuidado
Danei o pé no camin
Passei no Bombucadim
Os galo tava amiudano.
E conde deu 11 hora
Graças à Nossa Sinhora
Lá na Barra eu fui entrano
Já andano estropiado
Com o chinelo quebrado
E a fome já apertano.
E sem sabe ponde ia
Parei lá numa budega
Acredite, meu colega,
Passava do meio-dia.
Conde inxugô o suó
Batí da chinela o pó
E continuei a viagem
Num bá, conde fui passano
Vi um home me chamano
Dixe: Agora eu vi vantage.
E entrei na porta do bá
Estava sentado lá
Uns oito caba estribado
E numa farra danada
Bebeno ceiveja gelada
E o assunto era gado.
Arriei o matulão
E peiguntei: Ô patrão
Em que posso li seiví
Em dixe: Meu chofé
Telefono de Cuité
Que vem um vaquero aqui
E na hora queu li vi
Pensei: Será este moço
Eu li dixe: Sô eu mesmo!
Ele pagô-me um aimoço
Dispoi tomei um café
Foi aí cu fazendêro
Dixe que tu és vaquero
Lá pas banda de Cuité?
Eu, cuma tô precisano
E tu que tais procurano
Um trabaio de vaquero
E arrecebesse o recado
Saba que só tais impregado
Fazeno um teste premero.
Que é entrá na caatinga
Corrê no maió penhasco
De serrote e de carrasco
Do fogo saí do casco
E pegá um boi cum mandinga.
Aí eu dixe: Patrão,
Na minha situação
Eu incaro um baibatão
E num vô pidi arrego
Se o sinhô tem um cavalo
Mande ozome ir buscá-lo
Que eu num peico este imbalo
De arranjá um imprego.
Aí o majó dixe assim:
Pois bem, amanhã cedim,
Eu já tô lá na fazenda
Levantei de madrugada
Cheguei na hora maicada
Certim, no pé da muenda.
Conde passei na portera
Avistei uma cabruera
Uns já vistino as pernera
Outros vistino gibão
Conde eu dixe: Bom dia
Já uví a anaiquia
Incrusive do patrão.
Arriei o matulão
Ali no pé da parede
E dixe: Eu sô Daxinha
Dá pá me dá uma aguinha
Queu vem morreno de sede?
O patrão dixe: Onorato,
Infoime a esse rapaz
Cuma é cagente faz
Para testá-lo no mato
Diga também a esse home
Que meu verdadero nome
É Coroné Sicinato.
E já gritô pá Gonçalo:
Vá me buscá o cavalo
Que matô Pantaleão
Quero vê se ele é testado
Lá no fundo do ceicado
No cavalo Fuguetão.
Travessamo uns suvacão
De paimatora e macambira
Crauá de xinxo e alastrado
Já pendeno para o lado
De Aigudão de Jandaíra
Ainda dixe: Janjão,
Me traga aquele gibão
Que foi de Pantaleão
Que morreu acidentado
No cavalo Fuguetão
Peiguntei: Quá foi, patrão?
Dixe: O que tu tá muntado.
Arricibí as pernera
Direto das mão do moço
E conde passei a mão
Achei as ponta de osso
Que era ainda do finado
O sangue tava quaiado
Com um fedô de insosso.
Conde o cavalo chegô
Abriu a boca e rinchô
Conde o vaquero jogô
A sela dispoi da manta
O cavalo se incuieu
O patrão oiô pra eu
E temperô a gaiganta.
E cumeçô a mangação
Falaro inté no caxão
Para trazê o finado
E eu uvino calado
E fazeno uma oração.
Todo mundo se muntô
E eu saí mais atráis
Era uns quinze home ou mais
Foi aí que um rapaz
Desse jeito me falô:
Até hoje num iscapô
Quem correu em Fuguetão
Premero foi Irineu
Dispoi um tá de Pompeu
E, pú úrtimo, Pantaleão
Sempre se leva o caxão
Pá trazê o coipo do mato
E se isso acontece
Tudo indica que cum você
Pode compretá os quato.
Aí dexemo a istrada
E entremo na mata bruta
Atrevessemo uma gruta
Saímo numa chapada.
Aí, o caba da frente
Parô, assim, de repente,
E gritô: O boi já corre
E passo o baibicaxo dixe:
Prove que é macho
Ou pega o boiato ou morre.
E açoitô Fuguetão
Decemo ladera abaixo
Tirô de sarto um riacho
De trinta metro de laigura
Cum dizoito de fundura
Unha-de-gato e favela
Braúna nova eu trucia
Ói as ruma queu trazia
Na maçoneta da sela.
E Fuguetão na costela
Num deu foigo pu boiato
Joguei o bicho no chão
A máscara tava pronta
Passei a mão pela ponta
E encaretei no ato.
Ainda butei o chucai
Terminei o meu trabai
Fui pá sombra de uma favela
E deixei o Fuguetão
Bem perto do baibatão
Deispois de batê a sela.
Cum pôco uví a zuada
Deceno na buraquera
Era toda cabruera
Que vinha bem atrasada
Já há quase hora e meia
Teve lugá queu passei
E eles fizero arrudei
Pois num dava pá passá
E conde me avistaro
Tudo de uma vez falaro:
Cadê o boi, caba otaro
Que tu viesse pegá?
Um dixe: eu vô te avisá
Se deixasse o boi no mato
O Coroné Sincinato
Vai querê te atacá
Vai mandá nói te surrá
Caqueles cipó de boi
Que Deus do Céu me perdoi
Difiço é tu escapá.
Aí chegô o Gonçalo
Dixe: Cadê o cavalo
Vaquero meia-tigela!
Eu dixe: Tá amarrado
E o boi tá encaretado
E ainda achucaiado
Debaxo de uma favela.
Aí houve aquele ispanto
Perguntaro: Onde é o canto?
Arrespundi: Lá em baxo
Na berada do riacho
Pá vocês vê cuma é
E dizê pu Coroné
Que pas banda de Cuité
Ainda tem caba macho.
Conde viro que era certo
Dixero: Oh, caboco isperto
E quizero abraçá eu
Aí eu dixe: Tire as mão
E vão falá pu seu patrão
Queu num peguei o baibatão
Logo puique Fuguetão num deu.
E eu num quero seu imprego
E nem vô pidi arrego
A esse tá de Coroné
Vô pegá meu matulão
E intregá Fuguetão
Desses lá na região
A gente chama pangaré
Mas um recado aqui vai
Pra num duvidarem mai
Dos vaquero de Cuité.
Autor: JOSELITO FONSECA DE MACEDO, vulgo, DAXINHA.
20/02/2002
Lendo e vendo um filme passar... Obrigada por mais essa oportunidade, Gilberto!!
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