PARA NÓS
TUDO É NORMAL
Os ursos estão chegando. Milhões deles atravessaram a
atmosfera e estão devorando o que surge à sua frente. Não adianta matá-los.
Cada morte de um, surgem dois. As formigas os acompanham, e, também modificadas
geneticamente, quando morrem transformam-se em tamanduás. Consciente de tudo
isso e indefesos, os humanos estamos sobrevivendo em estado líquido. Os ossos e
carne humanos deixaram de existir. Foram transformados em água. Os invasores
precisam ingerir-nos para matar a sede. O mundo sofreu bilhões de modificações
e estas acima citadas são apenas a ponta do iceberg. Ninguém tem controle de
mais nada. As leis da natureza, antes existentes, são alteradas a cada minuto,
senão, a cada segundo. E não adianta questioná-las. O melhor é ficar no lençol
freático para escapar dos sedentos. O sonho de voar acontecerá para os que
ficarem na superfície dos oceanos. O sol continuará evaporando-os, e vamos para
as nuvens olhar lá de cima as modificações no que antes era a terra como
havíamos conhecido. Não existem predadores nem presas. Somos todos iguais,
ingerindo e sendo ingeridos. Nessa confusão toda, a dor foi extinta. Não existe
um parâmetro nem motivo para a obediência. Todos podem tudo e nem pecado há. O
bem e o mal acabaram juntos com a dor. Passaram a ser conceitos ultrapassados
nesse caldeirão de misturas. Mesmo os ingeridos divertem-se conhecendo o corpo
dos consumidores. Ninguém fala, apenas sente. Alguns fervem nos vulcões, e
outros, solidificados nas geleiras, ficam observando. Não procriamos. O que
existia antes permanece. Transformam-se em outros, mas não se alteram em
números. As abelhas não precisam de suas asas. Quem comanda os voos são as
forças aleatórias que surgem e desaparecem sem um ritmo que se possa prever. O
fogo não queima, apenas passa como uma fumaça. O que acontece é que passamos a
voar com mais facilidade. Viajamos e caímos ao esfriarmos. Conhecemos, além de
estômagos, os meandros das plantas, o aconchego dos frutos e os bicos dos
beija-flores. Somos neblina e furacão. Névoa e garoa. Não somos tudo, mas
participamos de tudo sem receio da dor nem de traumas. O mundo ideal é agora que
antes chamávamos de caos por estarmos em outro formato. Agora é o que sempre
desejamos e não sabíamos. Livres de preconceitos ou qualquer moral reguladora.
Somos sujos e limpos ao mesmo tempo, e nem nos importamos. Existimos do mesmo
jeito. Abraçados por uns e renegados por outros. O problema não está em nós,
mas nos outros que não nos aceitam como somos. Pouco importa suas preferências.
Somos o que somos participando da vida e da morte. Somos senhores do universo.
Somos simples e complexos, porque estamos água.
Heraldo Lins
Marinho Dantas (arte-educador)
Natal/RN, 11/01/2021 – 16:16
84-99973-4114
Fez-me lembrar desse pensamento: Vivemos tempos líquidos. Nada é para durar.
ResponderExcluirZygmunt Bauman