LEMBRANÇAS CURTAS
A mulher abre a janela para apreciar o respingar no alpendre. Enquanto aprecia o sussurrar da chuva, pensa nos conselhos que a mãe lhe deu para não se casar com Maurício. Foi uma decisão sua viver feliz, mas lhe desperta dúvidas sua escolha. Os desencontros com o marido a levara a perder um pouco o ânimo. O amor que tanto sentia transformou-se em algo desgastado pela dura realidade do trabalho.
Nesses estreitos limites de tempo em que analisa a vida, percebe que seus instintos maternos não a deixaram ver onde estava se metendo. Suspeita que a natureza coloca uma venda nas que chegam no auge da vida fértil, e foi o que aconteceu com ela. Naquela época só sentia vontade de ser possuída e ter filhos. Agora que está vivendo a fase de educá-los, tornou-se refém das suas antigas decisões. Hoje é que percebe que não passava de uma fêmea no cio, e seu mundo era norteado pelo prazer de se acasalar. Sabe que é muito forte esse instinto e tem medo de que suas filhas fracassem na missão de se conterem até estarem aptas a suprirem, confortavelmente, a própria subsistência.
Sua ingenuidade foi substituída pela sabedoria lapidada pelo sofrimento. Se tivesse o entendimento que tem hoje, quem sabe, seus filhos estariam com outra genética. Naquele começo de inverno, quer se deitar e dormir sozinha, sem marido nem filhos por perto, mas a porta foi aberta anunciando que Maurício está de volta para uma noite que promete. A mulher sorri para o presente e deixa o passado ir embora com a chuva.
Heraldo Lins Marinho Dantas
Natal/RN, 12/10/2021 – 12:33
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