NADA A VER
Estridulação. O nome não é comum, mas o significado sim. O som que
o grilo emite é assim definido no dicionário. Quando uma pessoa é inconveniente
denominamos de Cri-cri. Então podemos até nominá-la de pessoa Estridulante. O
ser estridulante pergunta pela sua idade, se você já foi preso ou se o filho é
seu mesmo. Estridulantes há em todo lugar. Numa mesa de bar, no almoço em
família ou até mesmo no consultório médico. Ela está esperando ser atendida e
você chega. Ela pergunta: viesse fazer o quê, mulher? Exame de rotina! Ah! É
isso que dizemos quando queremos esconder algo. Vai que estás grávida e não
quer que sua mãe saiba quem é o pai. A característica da estridulação é
repetir-se. Esse conceito não é tão válido assim. Papai Noel não pode ser
definido como estridulante, mesmo repetindo-se todos os anos, mas o Rô Rô Rô
dele pode. A história de Branca de Neve nunca será estridulante. Eu nem sei
porquê estou falando hoje em seres frutos da nossa imaginação, mas desconfio que
isso é produto da experiência que passei ontem ouvindo um grilo estridular
durante a noite toda, e isso me deixou meio confuso. Voltemos a branca de Neve.
Essa moça ficou famosa por ser filha de Maria das Neves. No lugarejo onde ela
nasceu todos os habitantes eram de cor branca, mas tão branca que albinos eram
tidos como morenos. Lá foi nascida a filha de Maria das Neves. Uma negra bem
pretinha, tão pretinha, mas tão pretinha que carvão era róseo ao lado dela. Veio
daí o apelido de branca de neve. Isso ninguém sabe. Outra coisa que quase ninguém
sabe, é que existe uma biografia não autorizada, de chapeuzinho vermelho, impressa
por Gutenberg. Comprei ontem de João Grilo. Ele insistiu tanto com sua
estridulação que acabei pagando muito dinheiro por ele. Comprei, paguei e li.
Quero deixar bem claro que livro lá em casa não serve só para enfeitar estante,
segurar a porta e matar grilo estridulante. Serve para eu ler. Pois bem! Essa
menina que todos conhecem como a santinha do chapéu vermelho deu muito trabalho
aos pais. A vida dela era matar lobos. Adorava maltratar os coitadinhos. Fazia
armadilhas, enganava-os se fingindo de avó, roubava os biscoitos deles e ainda
encontrava tempo para atanazar a vida dos três porquinhos. Foi ela que matou o
mar que até hoje conhecemos por mar morto. Isso mesmo. Se há algo morto foi
porque morreu ou alguém matou. Nesse caso, a culpada pela morte do mar, já está
desvendado, foi chapeuzinho vermelho.
Autor: Heraldo Lins Marinho Dantas
Natal/RN, 08/12/2020
Heraldo Lins é arte-educador
Tel.: 84-99973-4114
Email: showdemamulengos@gmail.com
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