sábado, 5 de outubro de 2019

MEUS “LERES” - Liliane Mendonça



MEUS “LERES”

Sim, ousei substantivar o verbo LER. Verbo fundamental na minha vida tão simples. Uma boa parte desse verbo esteve sempre comigo. Desde cedo me apaixonei pela língua portuguesa. Comecei a me importar com as palavras e suas frases, seus sentidos, suas verdades, suas mentiras e suas curiosidades.
Segundo minha mãe, aos dois anos e meio de idade eu tinha o péssimo hábito de “corrigir” a fala alheia. Isso lhe causava constrangimentos disfarçados em risos quando acontecia – “não é bassoura, é vassoura”, “não é ponhar, é colocar”, dizia a criancinha insolente que eu era. “ Mas, mãe, eu não falava errado com essa idade? Aquelas dificuldades comuns na aquisição da linguagem? ” “Não, minha filha, tu não... teus irmãos sim, mas tu já aprendeste a falar certinho desde sempre. ” Então tá... foi minha mãe que falou!
Aos quatro anos aprendi a ler, sozinha, causando espanto em todos que me cercavam. Talvez o espanto viesse do fato de que eu era a terceira de quatro irmãos e isso não aconteceu com nenhum dos outros três. Naturalmente, eu não tenho lembranças desses tempos tão longínquos. Lembro-me apenas que eu gostava de andar de ônibus e ler os letreiros na frente das lojas por onde íamos passando...
Muito bem, se não me lembro da época de minha alfabetização, lembro-me um pouco mais de quando comecei a ler. Na minha casa sempre tinha gibis, livrinhos de bolso, que meu pai lia sempre e palavras cruzadas. Na biblioteca da escola peguei a Coleção Vagalume e outros, que não lembro agora. Muitas vezes eu preferia ficar em casa lendo ou caçando palavras do que brincando com as outras crianças. Li muito em “horário do recreio” na escola, em ônibus de viagem ou urbanos, sala de espera, restaurantes.
E isso me faz lembrar de muitas pessoas que hoje em dia dizem que só vale a pena ler se forem livros eruditos... Não posso concordar com isso. O fato de eu ter começado a ler escritas simples, criaram em mim o hábito de ler. Ainda adolescente li o Pequeno Príncipe, um clássico da literatura universal. Não gostei da leitura, na primeira vez que o li. Hoje, depois de várias leituras, é um dos meus livros preferidos.
Acho a literatura brasileira um luxo, e tenho pena de quem opta por não a ler. E não falo apenas dos mais canônicos, mas de vários autores, como Clarisse, Machado, Rosa, Érico Veríssimo, Amado, Quintana, Hilda Hilst, Cecília Meireles e tantos outros. E também temos na literatura contemporânea autores dignos e competentes em suas escritas.

Dentro da literatura universal, com certeza amo os clássicos como Cervantes, Virgílio, Homero, Dante e tantos outros. Tenho uma paixão especial pelos escritores franceses como Vitor Hugo, Camus, Baudelaire, Montesquieu e principalmente por George Sand e Gustave Flaubert, cuja amizade e obra são objetos de meus estudos atualmente.
Meus leres são muitos! Variados! E meio fanáticos.... Já recusei convites para festas, churrascos, barzinhos e até viagens para ficar em casa traduzindo. Adoro esmiuçar a obra de um autor, digerir, escrever a respeito e depois passar para outro autor. Claro que isso nem sempre é possível, mas quando consigo, a felicidade é grande! Recentemente fiz isso com a escritora iraniana contemporânea Chahdortt Djavann, cuja literatura me impressionou muito e positivamente, e atualmente o faço com Sand e Flaubert.
Atualmente meu prazer com a leitura se expandiu, e executo o ofício e a paixão de traduzir obras literárias do francês para o português. Ao todo são oito obras traduzidas e duas publicadas.



Liliane Mendonça – outubro/2019

Bacharela em Letras pela Universidade Federal do Paraná

Traduções publicadas: “François, o menino abandonado”, de George Sand e “Stephan Wassiliew”, de Jules Laforgue. (Romances)




8 comentários:

  1. Inspirador exemplo! Tive a oportunidade de ler François, o menino abandonado. De fato, uma ótima leitura.

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  2. a literatura é uma arma poderosa, culturalmente falando.. e George Sand foi uma escritora fantástica!

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  3. Carrego a honra da amizade e influência na minha formação.

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  4. é muito bom saber que há pessoas assim como você!Continue firme na sua jornada, pois os resultados já se refletem nos livros maravilhosos que você traduziu! Grandes inspirações e muitas novas leituras e traduções para você.

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  5. Excelente escrita de Liliane Mendonça sobre "seusleres", Adorei,voltei a minha infância, e fiquei aqui refazendo minhas memórias de leituras!

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  6. Belíssima reflexão. Ler é vida!

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  7. Uau, adorei. Seu trabalho como tradutora é ótimo. Sz

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  8. Excelente texto da Liliane, assim como as traduções primorosas dos dois livros, o François e o Stephan, que eu já li, sendo que pelo François eu me apaixonei logo no primeiro diálogo, desejando eu mesma estar ali para acalantar aquela criança, mesmo sendo fictício. Parabéns Liliane! Continue nos trazendo belíssimas traduções como estas. Nós, os leitores inveterados, merecemos. Obrigada.

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