domingo, 30 de abril de 2017

Belchior e a divina (e trágica) comédia humana.



O mais triste da morte de Belchior é o quanto ela é absurda e despropositada, mas ao mesmo tempo  também foi a consequência de fatos absurdos e despropositados. Afinal, estamos falando de um dos maiores cantores e compositores da MPB, criador de clássicos como “Mucuripe”, “Como nossos pais (considerado um verdadeiro hino dos jovens que cresceram nos anos 70)” e “Paralelas”, que interrompeu uma carreira de relevância há 10 anos, bem como o contato com sua família, velhos amigos e seus funcionários, para ingressar numa vida de semiclandestinidade, marcada por domicílios incertos, despesas de hospedagem não-pagas no Brasil e no exterior e, principalmente, recusa em aparecer na mídia. Mas o que desconcerta mesmo é que, por mais estranha que essa situação fosse, muitos fãs do artista sempre reagiram com revolta a qualquer comentário que a pusesse em xeque, dizendo que ele simplesmente queria viver uma vida desapegada, longe dos holofotes e de compromissos que o consumissem, e que o resto seriam exageros por parte de uma imprensa que nunca esteve totalmente de acordo com sua postura independente e crítica às mazelas sociais, e viu nessa postura a oportunidade perfeita para desmoralizá-lo. Chegaram a dizer que  estava simplesmente vivendo suas utopias ao lado de quem realmente se importava com ele.
No entanto, por mais louvável que seja essa lealdade, esse sentimento nunca deve ser tal que os cegue para os desdobramentos e complicações de suas atitudes. Não se pode considerar com naturalidade um homem com mais de trinta anos de carreira e uma vida tanto profissional quanto familiar estabilizadas largar tudo isso de uma hora para outra e não dirigir mais a palavra às suas filhas nem encerrar as pendências que possuía com seu escritório. E muito menos que esse homem, sendo adulto e com condições de se sustentar, viva durante tempo indeterminado sem pagar as despesas que realizou e sendo mantido por outras pessoas, e pior, com um discurso que denunciava uma análise um tanto paranóica da sua vida, em que julgava-se perseguido pela mídia brasileira, conforme o jornalista gaúcho Juremir Machado, que foi procurado por ele, percebeu e relatou num artigo que, como não seria diferente, foi considerado uma traição por admiradores do cantor. E não se trata de uma ficção contada para difamá-lo, e sim de algo comprovado por fontes seguras, como documentos e depoimentos de familiares e pessoas próximas a ele. Esses comportamentos não são característicos de uma pessoa desapegada que quer viver uma vida simples, e sim de alguém em fuga que não parece ter noção dos efeitos que suas ações drásticas terão nas vidas de outros, e o mesmo pode ser dito daqueles que o ajudaram nessa empreitada e poderiam tê-lo despertado para esses efeitos. Viver à margem, especialmente quando se é alguém que tem tanto a oferecer, nunca deve ser considerada uma opção viável, já que sempre ocasiona a perda de algo, tanto que, depois de tanto tempo de distância, suas filhas agora podem revê-lo, só que num caixão. O que ele precisava era de ajuda para não perder a noção da realidade, e, aparentemente, quem estava com ele não se preocupou em fornecê-la.
A melhor lição que se pode tirar dessa história é que, caso alguém perceba comportamentos antissociais em pessoas próximas, é melhor não ignorar isso, e sim tentar descobrir qual o seu problema e fazer tudo o que estiver ao alcance para que ela seja ajudada. Em casos extremos, isso pode fazer a diferença entre viver e morrer. E, principalmente, evitar romantizar situações em que alguém é isolado ou alijado da convivência com os outros, pois isso não ajudará a que elas tenham fim.
Agora não dá mais pra dizer "Volta, Belchior", e sim "Descanse em paz, Belchior". Que você finalmente tenha encontrado a paz que nunca teve neste mundo.


Renan II de Pinheiro e Pereira.

SONETO A BELCHIOR


BELCHIOR (1946 - 2017)


SONETO PARA O DIA NACIONAL DA MULHER - Gilberto Cardoso dos Santos


sexta-feira, 28 de abril de 2017

ESTOU CANSADO - Renan Pinheiro

Estou cansado.
Estou cansado de ver, desde os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, as pessoas deixando-se dominar pelo medo a ponto de ver com simpatia cada vez maior candidatos que pregam o ódio e o ressentimento.
Estou cansado de ver pessoas que, influenciadas por programas sensacionalistas e fundamentalistas, não hesitam em estereotipar, julgar e condenar aqueles de que divergem.

Estou cansado de ver a irracionalidade atingir patamares que nunca imaginei serem possíveis.
Estou cansado de ver qualquer um arvorar-se em especialista em determinado assunto só porque fez um curso via Internet com sabe-se-lá quem, e com base nisso querer ensinar o Pai Nosso ao vigário.
Estou cansado de ver católicos que se consideram tradicionais e devotos, que, como eu (embora minha intenção aqui esteja longe de ser a de me colocar como exemplo), vão sempre à missa, tem amor à Eucaristia e à Nossa Senhora e rezam o terço diariamente, mas não hesitam em ofender padres que são grandes evangelizadores e - pasmem - até o papa se discordam de alguma coisa de que disseram, como se tivessem mais direito de serem chamados de católicos do que eles.
Estou cansado de ver pessoas defendendo o indefensável só porque uma ideologia diz que isso precisa ser feito.
Estou cansado de ver a Internet, apesar dela ter a vantagem de ter tirado o monopólio das comunicações dos grandes grupos, tornar-se palco para os preconceituosos e as pessoas de mente tacanha exporem suas teses repletas de ódio e visão estreita da vida.
Estou cansado de ver gente que não sabe dialogar, e se desafiada reage xingando, denegrindo e ameaçando o oponente.
Estou cansado de ver gente que não me conhece e não sabe do que passo sentir-se no direito de me rotular, conforme o sabor do vento, de "coxinha", "comunista" ou "petista", só porque não concordo com uma ou outra opinião específica dela.
Estou cansado de ver gente que só sabe andar pelos extremos, mesmo sabendo que quem vive desejando o mal aos outros nunca consegue desfrutar plenamente da vida.
Estou cansado de ver gente imatura, incompleta e vazia dominando as redes sociais, páginas de comentários e fóruns de discussão.
Estou cansado de ver que, aparentemente, o que vale hoje não é a pessoa por inteiro, e sim o rótulo que ela representa.
Estou cansado de ver amizades de anos sendo destruídas por causa de políticos que nem sabem que esses ex-amigos existem.
Estou cansado de ver grupos atacando os pecados e crimes dos integrantes de outros grupos e esquecendo ou relativizando seus próprios pecados e crimes.
Estou cansado de ver tanta mesquinharia, maldade e ressentimento em nome de nada.
Estou cansado de muitas coisas, mas como não posso mudar o mundo (até porque se o fizesse talvez eu estivesse sendo tão exasperante quanto aqueles que me cansam), prefiro fazer a minha parte sem maiores angustias, descansar e entregá-lo nas mãos de quem o criou, na esperança de que algum dia eu perceba que ele está menos confuso e difícil.

DIA DA SOGRA (20 de abril)


ESCOTEIROS DO AR (28 de abril) - Gilberto Cardoso dos Santos


quinta-feira, 27 de abril de 2017

O LIVRO DOS LIVROS ( PARTES 1,2,3) - Moacy Cirne


O LIVRO DOS LIVROS (1)


Texto estabelecido por

Fausto Simak da Cunha Azevedo
& Zamagna Borges de Azevedo Bouzon,
com revisão teológica de
Mateus Skrzypczak de Macedo

A origem de tudo

No princípio o Senhor das Alturas criou Caicó e as cidades vizinhas. O rio Seridó estava seco e as trevas cobriam o açude Itans e todo o mundo.

O Senhor das Alturas disse: "Faça-se uma luz da gota serena". E a luz da gota serena se fez. O Senhor das Alturas viu que a luz era boa e Caicó e o mundo se iluminaram, com seus dias e suas noites.

O Senhor das Alturas disse: "Faça-se um firmamento, e se façam a Serra de Mulungu, o açude Gargalheiras, o Poço da Moça, o Poço da Bonita, o Poço de Santana, o sítio Caatinga Grande e a minha Biblioteca de Babel". E assim se fizeram.

E o Senhor das Alturas disse: "Façam-se o sol, a lua, os planetas, a Serra do Doutor, a Serra da Borborema, Natal, Olinda, Martins, Galinhos, Macaíba, Angicos, Santana do Matos, Catolé do Rocha, Recife, Rio de Janeiro, Niterói, São Paulo, Porto Alegre, Ouro Preto, Paris, Lisboa, Luanda e o Fla-Flu". E assim se fez.

E o Senhor das Alturas fez brotar do sertão e das outras terras toda espécie de animais e de árvores com seus frutos atraentes e saborosos: mangas e mangabas, cajus e cajás, pinhas e maçãs, carambolas e maracujás. E o Senhor das Alturas fez mais: criou a canjica, a pamonha, a tapioca, o doce de leite e o pé-de-moleque. E àquele lugar em particular, nas veredas do grande sertão, o Senhor das Alturas deu o nome de Jardim do Seridó. E o Senhor das Alturas gostou do que fez. E o Senhor das Alturas gostou do que por Ele foi criado.

A origem da humanidade

O Senhor das Alturas, sentindo-se depois entediado, formou o Homem da (*) da terra e deu-lhe o nome de Severino. E o Senhor das Alturas vendo que o Homem sentia-se solitário e deprimido resolveu criar uma companheira para ele. E do vento das 5 horas da tarde criou a Mulher e deu-lhe o nome de Raimunda. Ambos estavam nus, o homem e a mulher, mas não se envergonhavam.

E o Senhor das Alturas disse: "Vocês tudo podem, só não podem conhecer como funcionam as leis físicas, matemáticas, filosóficas, literárias e biológicas do Universo; ignorem, pois, a minha Biblioteca". Dito isso, foi descansar, depois de almoçar carne-de-sol com macaxeira, feijão de corda, arroz de leite e manteiga do sertão, com direito a três lapadas da cachaça Samanaú.Severino e Raimunda, vendo que o Senhor das Alturas fora descansar longe dos dois, na Serra de São Bernardo, resolveram, em noite de luar às margens do rio Seridó, se aprofundar em seus contatos físicos, ao som da flauta de Carlos Zens. E viram que era bom. E viram que um e outro podiam se encaixar várias e várias vezes. E viram que era ótimo. E quiseram mais: quiseram conhecer como funcionavam as leis do Universo.

E o Senhor das Alturas, depois de uma soneca que durou mais de 13 anos, não gostou do que viu: Severino, Raimunda e seus dois filhos discutiam as teorias e contrateorias de Platão, Aristóteles, santo Agostinho, Ibn Khaldun, Spinoza, Kant, Marx, Nietzsche, Freud, Einstein, Sartre, Foucault e Chico Doido de Caicó. E outras coisas discutiam. E outras coisas faziam.

E o Senhor das Alturas disse: "Quem domina o conhecimento, domina a essência das coisas. Só eu poderia fazê-lo". E o Senhor das Alturas, raivoso, expulsou-os do Jardim do Seridó, para cultivarem o solo seco do sertão. E o Senhor das Alturas disse: "A partir de hoje não poderão mais consultar a minha Biblioteca de Babel". E o Senhor das Alturas colocou diante do Jardim os seus coronéis do interior, para que o mesmo não fosse invadido pelos sem-terra e sem-moradia, representados por Severino, Raimunda e os dois filhos.



O LIVRO DOS LIVROS
(Parte 2)

Texto estabelecido a partir de manuscritos
que se encontram nas bibliotecas de
Cairo, Londres, Paris, Petrópolis, Caruaru e Caicó

O primeiro assassinato

Expulsos do Jardim do Seridó, Tonho e Mané das Cacimbas, filhos de Severino e Raimunda, igualmente expulsos, conheceram uma jovem e bela mulher, vinda de Guarabira, na Paraíba. E os dois por ela se apaixonaram. E quiseram conhecê-la biblicamente. Mas Expedita - a mulher em questão - só queria chumbregar com um deles. E os dois irmãos se estranharam.


Tonho disse então a Mané das Cacimbas: "Vamos para Boqueirão, em Parelhas. Quero que você veja um jogo do Centenário; essa terra ainda será a terra do futebol". Mas quando se aproximavam do açude, Tonho agrediu o irmão e o matou com uma pexeirada. O Senhor das Alturas, desconfiado, perguntou a Tonho: "Onde está teu irmão Mané das Cacimbas?" E ele respondeu: "Não sei. Acaso sou o pastorador de meu irmão?" "O que fizeste? - perguntou o Senhor das Alturas. - Ouço da terra a voz do sangue de teu irmão, clamando por vingança. Terá sido por causa de Expedita, aquela sirigaita, que você o matou?"


E o Senhor das Alturas condenou-o a passar 6 anos, 6 meses e 6 dias perambulando pelo sertão com os cabras de Lampião, fugindo dos macaco da capital e das onças pintadas da região. Tonho disse ao Senhor das Alturas: "O castigo é grande demais para suportá-lo. Não poderei simplesmente ir para mais longe, para os cafundós da Bahia, oh meu Rei?" O Senhor das Alturas gostou da ideia e disse: "Tudo bem. Quem sabe, um dia você acaba estrelando um filme de Glauber Rocha". Afastando-se da presença do Senhor das Alturas, Tonho foi morar em Vitória da Conquista, e lá conheceu Capitulina, casada com Joaquim Casmurraldo. Tonho e Capitulina se gostaram e fugiram para o interior de Pernambuco.


A humanidade se amplia


O Senhor das Alturas ficou indignado, mas preferiu não interferir ao ver que ela deu à luz a Pedro dos Papagaios. Tonho veio a construir uma cidade e lhe deu o nome de Petrolina, em homenagem a seu filho. Pedro dos Papagaios foi o pai de Mirador, Mirador de Abimael, Abimael de Matutosalém e Matutosalém de Riobaldo.


Riobaldo casou com quatro mulheres; uma se chamava Diadorinha, a segunda Estrela da Manhã, a terceira Iracema, a quarta Dualiba. O nome do irmão de Riobaldo era João Rosa, antepassado de todos os tocadores de rabeca e sanfona. Dualiba teve três filhos: Vaca Véia, artífice de todos os instrumentos de bronze e ferro; Bala Choca, forrozeiro e cantador de feira; e Ojuara, criador da literatura de sacanagem. Diadorinha e Estrela da Manhã abandonaram Riobaldo e preferiram se amigar, como se macho e fêmea fossem.


Severino, que deixara Raimunda, champrou muitas vezes a sua segunda mulher, por Esmeraldina conhecida. Ela deu à luz um filho, a quem chamou Sertão do Cariri. Severino já tinha 69 anos quando o gerou. E viveu mais 24 anos e gerou filhos e filhas, que se deliciavam com a chamegação entre si e com os vizinhos e vizinhas.


Sertão do Cariri tinha 33 anos quando gerou Jorge Fernando. Viveu mais 87 anos e gerou filhos e filhas, que foram povoar a Paraíba, o Ceará, o Piauí e Mossoró. Morreu ao ser atacado e devorado por uma onça pintada das mais brabas.


Jorge Fernando gerou José Bezerrão. Tinha 27 anos, então. Viveu mais 53 anos e gerou filhos e filhas, entre os quais Zé Areia Preta, Zilah Medina, Luís Carlos do Curral Novo, Miriam Celeste, Miguel Ciríaco, Sanderson Fabulário, Menandro Casto, Sandra Sandrix, Paulo de Bartola, Jarbas Angicos, Jenildo dos Pampas, Milton Costa, Alta Solta e Americana Marize de Macedo. Todos se amigaram com homens e mulheres da Paraíba e Pernambuco, e geraram muitos filhos e filhas, que viviam em paz e harmonia, na maior felicidade, no mais doce dos chumbregamentos. Os próprios animais, selvagens e não-selvagens, viviam para procriar.


E o Senhor das Alturas, indiferente, além de chateado com aquela eternidade sem princípio e sem fim, só cubava. E o Senhor das Alturas disse: "Meu espírito, já deu para perceber, não ficará para sempre no Homem, porque ele é apenas carne. E o homem não viverá mais do que 120 anos". Dito isso, foi jogar baralho com seu amigo Luisinho Ciferino.


Os anos se sucederam e o Senhor das Alturas, então induzido pelos fanáticos da Igreja Universal do Reino do Diabo, passou a ver pecado onde pecado não existia, passou a ver maldade onde maldade não existia. E o Senhor das Alturas viu o quanto tinha crescido os contatos carnais entre os seres da terra, seguidores que eram dos primeiros habitantes que tinham lido, ainda em Jardim do Seridó, os livros de sua inestimável Biblioteca de Babel.


E o Senhor das Alturas ficou (*) da vida. E o Senhor das Alturas se fez vingativo. E o Senhor das Alturas se fez cruel. E o Senhor das Alturas se fez terrível.



O LIVRO DOS LIVROS

(3)


Texto estabelecido a partir dos

Manuscritos do Mar Vivo das Arábias Orientais
com supervisão astrológica de Ludovicus Erasmus

A jangada de Mestre Cascudinho

E o Senhor das Alturas se fez impiedoso em sua fúria diabólica. Mas, entre todos os habitantes da terra, havia um que o Senhor das Alturas respeitava e considerava boníssimo: Mestre Cascudinho, morador da Cidade dos Reis, cujas andanças pelo interior do Rio Grande a todos causava admiração. Mestre Cascudinho era homem justo e íntegro. Gerou dois filhos. Ana Mariana Potyguar era o nome da donzela; Luís Fernandes Pedro Velho, o nome do mancebo. Mas a terra estava corrompida diante dos olhos do Senhor das Alturas.

Então o Senhor das Alturas disse a Mestre Cascudinho: "Chegou o fim de toda criatura mortal que existir. A terra está cheia de maldade. Vou destruir a todos com um toró tão grande que vai provocar, nos açudes da região e adjacências, a maior sangria de todos os tempos. Durante 40 dias e 40 noites choverá sem parar. Sangrará o Itans, o Boqueirão sangrará, sangrará o Gargalheiras, o Zangarelhas sangrará, sangrará a Passagem das Traíras, o Açudão de Açu sangrará".

E o Senhor das Alturas disse mais: "Construas uma jangada gigante, a maior possível, e nela abrigues tua família, os insetos do canto de muro de tua casa, o Boi Calemba, o Boi da Cara Preta, a onça Galileu Ziraldino e outros animais da fauna seridoense. E assim foi feito. E assim aconteceu. O toró que caiu, num raio de muitas e muitas léguas, inundou quase todo o Rio Grande e ainda sobrou água para outras terras e outras gentes.

Os mais antigos, os povos que, excluídos da jangada, conseguiram sobreviver, lutando contra a fúria do Senhor das Alturas, ainda se lembravam: as águas se tornaram violentas e aumentaram muito sobre a terra de modo que a grande jangada começou a flutuar na superfície das águas. As águas cresceram tanto sobre a terra que cobriram as montanhas mais altas que estão debaixo do céu.

Depois de mais 40 dias e 40 noites, quando as águas começaram a baixar, a jangada pousou sobre a Serra do Mulungu. Mestre Cascudinho e os outros, no meio de um lamaçal feladaputa, a abandonaram e, unindo-se a homens e mulheres que, aos poucos, começaram a surgir da Paraíba, de Pernambuco e do Ceará, e mesmo das Alagoas Sergipanas, esperavam pela Palavra do Senhor das Alturas.

Então o Senhor das Alturas, espantado porque o número de homens e mulheres era maior do que ele imaginara, mas momentaneamente conformado com a situação, falou a Mestre Cascudinho e aos demais: "Já que muitos sobreviveram, mesmo sem estarem na jangada, saiam, todos vocês, pelos sertões do Seridó, e forniquem bastante, sejam fecundos e se multipliquem sobre a terra". O Senhor das Alturas disse mais: "De minha parte, vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa descendência: nenhuma vida animal será novamente exterminada pelas águas de um dilúvio, a não ser pelas bombas, pelos fuzis, pelas metralhadoras e pelas balas perdidas".

E assim Caicó se reergueu, reergue-se Acari, São José se reergueu, reergueu-se Serra Negra, Cruzeta se reergueu, reergueu-se Carnaúba dos Dantas. Currais Novos, também. Também Timbaúba dos Batistas. São Fernando, também. Também Parelhas. Ouro Branco, também. Também São João do Sabugy e Jardim de Piranhas. Só o Jardim do Seridó não fora engolido pelas águas e, com sua Biblioteca de Babel, permanecia praticamente inacessível para os pobres mortais de todas as cores e de todos os credos.

E a humanidade voltou a se espalhar por esse mundão de deus e o diabo na terra em transe, com seus vaqueiros e cantadores, e assim se formaram novos homens, novas mulheres, novas amizades, novas amigações. E a humanidade voltou a se impor: Rosembergue das Amérikas conheceu Carla Brunilda e outras mulheres e de tanto chumbregarem muitos filhos tiveram e muitos filmes fizeram. Chico Antônio do Coco Queimado conheceu Mário dos Andradas e os dois se apaixonaram por Patrícia Gavião, mulher de Oswaldo Pau-Brasil. Sindoval Rodrigo do Grajaú conheceu Rosa Hamburgo e de tanto discutirem as idéias dos livros proibidos da Biblioteca de Babel criaram a Comunidade Arretada do Mundo Novo. Dailor Galo da Madrugada conheceu Civone Completamente Nua e os dois, pássaros errantes, geraram filhos e filhas. Oswaldo Fescenino conheceu Nísia Mata Atlântica e de tanto chamegarem muitos filhos tiveram e muitos livros escreveram. Todos viviam, em média, 69 anos. E todos falavam a mesma língua-mãe: a língua tapuia.

JERRY ADRIANI: UM ÍDOLO, UM REFERENCIAL


JERRY: UM ÍDOLO, UM REFERENCIAL
Inesquecível passagem de Jerry Adriani por Santa Cruz na década de 90. Noite de céu límpido e estrelas fulgurantes, que pareciam uma representação ideográfica da luminosidade do SHOW que logo mais aconteceria no Trairy Clube, principal sodalício da cidade, àquela época.
Tão logo a notícia da chegada de Jerry se confirmou, não pensei duas vezes, já que não iria à festa, por motivos plenamente justificáveis, obviamente. De imediato, tive a iniciativa de ir à residência de nosso amigo Milton Fernandes, onde Jerry se hospedaria, levando em companhia a esposa e dois dos meus três filhos: Dinamércia e Dinamérico Júnior, uma vez que Dinamárcia, a primogênita, encontrava-se em Currais Novos, morando e estudando no Colégio Objetivo, fazendo os anos iniciais naquele estabelecimento educacional, que era o coquetismo do momento na região.
Por favor, permita-me uma pausa para uma breve reflexão. Interessante! Alô, Milton! Naquele tempo, que não era certamente o tempo que fala das condições meteorológicas, e, sim, da sucessão dos anos e dias, naturalmente, já se pressagiava à sua vitaliciedade à frente da Presidência do Trairy Clube, fato que, inexoravelmente, o tempo confirmou.
Volto a falar de Jerry Adriani e daquela noite lendária do undécimo mês do ano de 1992, para imaginar o SHOW contagiante de J.A., com sua voz de tenor, na Festa do Reencontro, confundindo-se com a alegria esfuziante, prazenteira e espirituosa de Zé Pereira (Zezinho de Hozana), de Serafim Nunes e de Betinho (recentemente falecido), todos de saudosa memória. Além deles, outros com os quais, de vez em quando, nos reencontramos para falarmos daquela convivência de irmandade, até então, graças a Deus.
Destaquem-se: Antônio Luiz de Zé Dobico, Bill Boy, Ubiratan e Hitinho de Seu Augusto, hoje de Régia, notoriamente.
Na verdade, o que para mim é mesmo edificante é o fato de, quando em vez, nos encontrarmos, e eles se autoproclamarem “duros na queda” e reprisarem o sucesso musical, também dos anos 90, intitulado “Eu Sou o Bom” entre os Dez Mais, do Tremendão Erasmo, e que fez tanto sucesso na voz marcante de Eduardo Araújo, contemporâneo de Jerry Adriani, remanescente da Década de Ouro da Jovem Guarda Brasileira. Que bom!
De qualquer forma, verdade ou não, o que me apraz e me honra, deveras, é privar da amizade de todos e compartilhar da alegria de termos rebuscado as páginas do livro de nossa história, para, num refrescar de memória, relembrar os agitos inesquecíveis daquele gostoso tal de Flashback! Ok, my friend!
Retornando à casa de Milton, juntamente com a família, fomos carinhosamente recebidos por Jerry Adriani, encontro ansiosamente esperado.
Receptividade marcada pela cordialidade costumeira do anfitrião, e por parte do visitante cantor. Uma aula exemplar de educação, de civilidade e simplicidade em altos níveis demonstrados. Tais requisitos, deveras, contribuíram, sobremaneira, para que nossa condição de admiradores ainda mais aumentasse pelos atributos indiscutíveis do ídolo e cantor Jerry Adriani, de gratas e saudosas recordações.
No final, a pedido, fomos agraciados com 3 autógrafos do Príncipe da Jovem Guarda Brasileira, destinados a Dinamércia, a Dinamárcia, ausente da comitiva familiar, e a Júnior, que Jerry acolheu no colo. Em momento algum, ele demonstrou impaciência. Pelo contrário, parou o ensaio com seu guitarrista-mor, para nos cumprimentar e atender. Foi, de fato, um SHOW de alegria e solicitude.
Quanto a seu falecimento, resta-nos dizer que ficou uma lacuna difícil de ser preenchida no cenário musical, artístico e cultural do Brasil e na memória de todos nós, admiradores, já que a música é, com efeito, de todas as artes, a que mais enobrece e aquela que melhor traduz os anseios de nossas almas.
Afinal, conta-nos a Bíblia que o Rei Davi dançava em procissões religiosas à frente da Arca, desferindo as cordas da arpa. Entre os Gregos e os Romanos, ocupava um lugar preponderante na educação do povo.


Dinamérico Augusto de Medeiros

terça-feira, 25 de abril de 2017

XILOGRAVURAS DE JEFFERSON CAMPOS




ELINO JULIÃO

DOMINGUINHOS

LUIZ GONZAGA



Veja também: 

as belas xilogravuras de jefferson campos - apoesc - blogger



SEM SAÍDA - Gilberto Cardoso dos Santos


QUANDO SE CALA UM ARTISTA - Adriano Bezerra


QUANDO SE CALA UM ARTISTA

 Adriano Bezerra

A arte fica sem cor
Quando se cala um artista
Falta rima ao repentista,
Falta voz ao cantador,
Falta texto ao escritor,
E ao poeta inspiração.
Falta a interpretação
Ao interprete de rua
E o mímico não mais atua
Porque lhe falta expressão.

De dor e de comoção,
Fica sem riso o palhaço.
Fica também sem abraço
E sem aperto de mão;
O seu jeito brincalhão
E aquela sua esperteza
Fica faltando a beleza
E no seu rosto pintado
Uma lágrima em cada lado
Revela a sua tristeza.

Fica faltando a leveza
No passo do dançarino,
Ao mestre do violino
Fica faltando a destreza,
Fica também sem clareza
A obra do desenhista.
No palco o malabarista
Fica sem coordenação
E o rapper de emoção
Nem consegue entrar na pista.

Porém sua arte à vista
Ficará por toda a história
Sempre viva na memória
Por mais que o tempo persista.
Nos versos do cordelista,
No quadro de um pintor,
Nos gestos de um ator...
Por onde for a cultura;
Pois sua arte tão pura
Jamais ficará sem cor.



segunda-feira, 24 de abril de 2017

BATE-PAPO COM UM MESTRE DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS




ENTREVISTA COM ANTONIETO PEREIRA, QUADRINISTA

Entrevistador: Gilberto Cardoso dos Santos

GCS.: Caro Antonieto, gostaria que começasse essa entrevista falando-nos um pouco sobre suas origens familiares e geográficas.

AP.: Bom, caro Gilberto, as origens da minha família é uma mistura de espanhóis e portugueses. Os meus avós viviam na região da Paraíba, região aqui próxima da nossa, aqui perto de Nova Floresta. Segundo as informações que minha mãe me contava em vida o avó dela, meu bisavô, era um espanhol que estava fugindo das precariedades na época em seu país, ao vir parar aqui em nosso país se embrenhou nas matas e conseguira formar uma família com uma “Índia Cabocla”. E as origens de meus avós paterno, o que sei é que eles eram descendentes de Portugueses. A minha família é uma Junção de “Pereiras” por parte de meu pai e “Ferreiras” por parte de minha mãe.

GCS.: Até que série estudou? Fez algum curso de desenho ou aprendeu tudo por conta própria?

AP.: Consegui concluir os estudos agora há pouco tempo, em 2013. Não, não fiz nenhum curso, aprendi na marra mesmo até porque na minha época não tinha as facilidades que a garotada tem hoje, livros, vídeos na internet que ensinam facilmente qualquer um aprender a desenhar. Naquela época não tinha nada disso, como a nossa geração sabe. Era uma época em que a gente nem tinha Internet e muito menos sabíamos que ela iria existir um dia. Foi copiando mesmo os desenhos das minhas revistas em quadrinhos que eu colecionava. Elas eram as minhas fontes, meus mestres do aprendizado.

GCS.: Quando começou seu envolvimento com as histórias em quadrinhos?

AP.: Bem, tudo começou quando a minha irmã me presenteou com uma revista em quadrinhos intitulada “O CASAMENTO DO TIO PATINHAS – PARTE 2”, eu tinha uns 9 para uns 10 anos na época, eu estava começando a gostar de ler, mas nunca tinha lido quadrinhos antes. Depois comecei a conhecer um primo meu que desenhava muito histórias em quadrinhos de faroeste para ele mesmo, Francisco era o nome dele, mas era muito conhecido por “CHICO”, um baixinho que desenhava muito e  que morava no Paraíso. Bem, depois que vi os desenhos dele eu comecei a descobrir essa vocação tentando copiar os desenhos das minhas revistas, foi daí que o meu interesse por Histórias em Quadrinhos cresceu ainda mais até me tornar o que sou hoje.  

GCS.: Fale-nos sobre seus primeiros desenhos e da primeira revista que fez.

AP.: Meus primeiros desenhos, ou meus primeiros rabiscos vamos assim dizer, eu comecei no chão, pode parecer estranho, mas foi assim que comecei a ter o prazer de sentir a sensação de rabiscar meus primeiro desenhos. Eu e um colega meu carregava giz da escola e ia para a casa dele fazer desenhos no chão, era um momento bom aquele. Como todos sabem, quando a gente vem tomando gosto por uma coisa a gente não para mais, não é mesmo? Pois bem, aos poucos eu comecei a me interessar pela linguagem das histórias em quadrinhos, foi onde comecei a tentar criar as minhas primeiras histórias, inventar para ser mais claro. Com os meus 16 anos eu e uns colegas resolvemos inventar a nossa primeira revista em quadrinhos em nossa cidade, ela se chamava “A TURMA DO JOCA”, era uma revista infantil onde a gente apresentava nossas primeiras criações infantis que era Joca e sua turma e Cara de China, que foi uma criação de Erinaldo Santos (Neném), um grande desenhista que na época morava aqui e eu admiramos até hoje, apesar dele residir em Natal. O ano em que lançamos  a nossa primeira revista foi em 1991, foi uma produção feita em mimeógrafo eletrônico que era bastante caro na época, mas graças ao apoio do Campus Santa Cruz (UFRN) a gente conseguiu realizar o nosso sonho. Quero aproveitar aqui e agradecer o professor Marinho que na época era o diretor do Campus de Santa Cruz. Ele foi um grande incentivador para a gente nunca desistir de nossos sonhos.


GCS.: Que artistas dos quadrinhos  lhe serviram e ainda servem de inspiração?

AP.: Cara, são tantos viu, mas vou dizer os principais que me influenciaram, começando pelos estrangeiros: Frank Miller, John Byrne, Bilau. Agora os brasileiros: Mozart Couto, Flávio Colin, Watson Portela. Esses são os principais, existem mais, mas esses são os mais que me inspiraram.

GCS.: Você acha que as revistas em quadrinhos poderiam contribuir com a educação do país? Fale-nos sobre isso.

AP.: Sim, claro, e muito. Eu vejo que se as escolas vissem a importância das revistas em quadrinhos na alfabetização das crianças, a gente teria gerações de leitores e muitos formados em nosso país, mas como o preconceito ainda é grande do estado em relação em aceitar esse método nas escolas que estamos tendo uma dificuldade imensa em formar gerações de alfabetizados de verdade. É só pegarem uma criança de agora que lê quadrinhos e uma que não lê que veremos quem se sai melhor em nível de leitura. A gente sabe também que um cidadão que lê e é instruído ele tem mais chances de se tornar uma pessoa mais esclarecida sobre o que ocorre ao seu redor. Infelizmente, como todos nós sabemos, isso não é prioridade do estado; sabem eles que quanto mais uma população for analfabeta, melhor ainda para poderem controlar.

 

GCS.: Você tem feito importantes parcerias em suas produções. Conte-nos um pouco sobre elas.

AP.: Bem, sobre algumas parcerias que fiz posso citar algumas como a que Fiz com José Salles de São Paulo, na qual a gente produziu uma série em cinco partes chamada de “TIRAS vs MONSTROS”, onde a gente apresentou as aventuras de dois policiais que enfrentavam monstros. Outras mais foram com Alcivan Gameleira de Pau dos Ferros, no qual eu ilustrei algumas histórias de seu personagem o “CORCEL NEGRO” e o “PABLO RATO”. Outro que tive uma parceria foi o também pau ferrense Francinildo Sena, em que ilustrei histórias do seu personagem “CRÂNIO”, um alienígena que veio parar em nosso planeta Terra. Para terminar, gostaria de mencionar as grandes parcerias que tive com Jalmir Bezerra, apesar de ele ter procurado o ramo da publicidade em busca de sua sobrevivência, Marcos Cavalcanti, onde ilustrei “TIRAS e CHARGES” para o saudoso Jornal “MEMORIAL SANTACRUZENSE”, ao qual ele editava, e sem falar em ilustrações e capas para livros tanto de sua autoria e coletâneas poéticas. E por fim, Alessandro Nóbrega, de quem tive a honra de ilustrar seu primeiro livro infantil “O BESOURO E A BORBOLETA”, que foi lançado em 2016. Ótimas parcerias, e espero muito mais.




GCS.: Quantas revistas você já produziu? Cite-as e nos diga quais delas acha mais interessantes.

AP.: Bem, contando com a primeira revistinha que lançamos em 1991 para cá, foram exatas 6 produzidas. São elas: “A TURMA DO JOCA”, “IMPACTO QUADRINHOS”, “TIRAS vs. MONSTROS”, “CRÂNIO”, “O VIGIA” e por última “SANTA RITA DE CÁSSIA EM QUADRINHOS” que lancei em 2015. Eu gostei de todas; as que mais tive apego foi a de “SANTA RITA”, por ser uma produção feita em cima de pesquisa e a outra foi “TIRAS vs. MONSTROS”, por ser uma produção diferenciada dos padrões super-heróis.


GCS.: Você também é ilustrador. Fale-nos da experiência que teve com a produção do livro de Alessandro Nóbrega e de alguma outra que fez, além dos quadrinhos. Lembro-me que você também ilustrou a capa de alguns cordéis.

AP.: Bem, o livro infantil que ilustrei de Alessandro Nóbrega foi uma honra enorme, pois se trata de um tema para crianças no qual fiz ilustrações infantis. Foi o meu primeiro livro desse gênero que fiz. Confesso que foi uma experiência ótima, espero que a gente possa produzir mais projetos em parcerias no futuro. Em relação às outras produções que tive foi capas, ilustrações internas para livros, tanto para coletâneas poéticas quanto para produções particulares, inclusive quero ressaltar aqui que foi boa a parceria com todos. Sim, sem falar em capas para alguns cordéis que fiz, principalmente para o poeta Adriano.


GCS.: Além de sentir a satisfação de produzir obras de qualidade, você tem sido recompensado financeiramente com seus trabalhos?

AP.: Em partes sim e em partes não, como todos nós sabemos a produção cultural em nosso país ainda não suporta condições para que os artistas possam sobreviver diretamente de suas produções. Teve alguns trabalhos que fui recompensado, outros foi como colaborador em parcerias com outros artistas sem remuneração. Infelizmente a gente tem que sobreviver por fora para poder manter nossas produções culturais em forma de voluntariado, como posso assim dizer.


GCS.: Cite um ou mais produtores de histórias em quadrinho que deveriam servir de modelo para todos os que produzem quadrinhos no Brasil. Que pensa sobre a indústria construída por Walt Disney?

AP.:  Os artistas de histórias em quadrinhos brasileiros temos vários, que hoje produzem quadrinhos tanto para os Estados Unidos quanto para a Europa. O brasileiro mais influente, acredito que todos nós sabemos quem é, o velho Maurício de Souza, que hoje tem uma indústria de quadrinhos que consegue competir com a de Wat Disney. Segundo algumas matérias que li sobre a indústria de Wat Disney é que, o crescimento se deu com o aumento do mercado de entretenimento americano quando se expandiu por todo o mundo.

GCS.: Com que empecilhos você se depara nesta carreira? Julga-a espinhosa?

AP.: Um dos maiores empecilhos que encontro em produzir meus trabalhos é a falta de apoio por parte de projetos culturais que praticamente não existem; a falta de verbas para poder conseguir algumas impressões; tenho que conseguir apoio de uns e outros empresários, que às vezes não veem com bons olhos as histórias em quadrinho. E como é espinhosa viu, nem imagina como. Veja bem, tenho três projetos prontos para ir para a gráfica, mas por falta de verbas eles estão por enquanto engavetados.

GCS.: Fale-nos do trabalho que está a produzir sobre Fabião das Queimadas.

AP.: Bem, sobre o projeto que estou trabalhando sobre Fabião das Queimadas o que posso adiantar é, que estou romanceando a sua história sem perder o foco principal de sua biografia. Pretendo lançar no próximo ano, se Deus quiser. Não posso detalhar muito aqui o roteiro, o que posso adiantar é que toda pesquisa fiz sobre uns escritos que Hugo Tavares fez sobre toda a vida de Fabião. Estou gostando muito do projeto sobre a vida de Fabião das Queimadas em Quadrinho que estou trabalhando; espero que todos gostem de ler a sua história através da linguagem dos quadrinhos.


GCS.: Em que seus quadrinhos se diferenciam dos demais produzidos no Brasil?

AP.: Antes de eu responder gostaria de lhe dizer que, todos nós quando começamos a gostar de quadrinhos sempre temos aquelas grandes influências do mercado norte-americano através do universo de super-heróis. No início, quando comecei as influências eram os quadrinhos de super-heróis, depois aos poucos fui descobrindo o meu universo de produzir meus quadrinhos. Hoje, os meus quadrinhos são diferenciados dos demais devido ao tema regional que resolvi trabalhar, empregando a linguagem dos quadrinhos como forma de facilitar a informação dinâmica.

GCS.: Conhece outros desenhistas que, como você, fazem um bom trabalho aqui no Nordeste, mas não recebem a devida atenção?

AP.: Sim, vários. Além, é claro, de alguns que conseguem sobreviver produzindo para os Estados Unidos e a Europa. Os que produzem por conta própria como eu, são: Francinildo Sena, Alcivan Gameleira, Rodrigo Fernandes, todos de Pau dos Ferros. Emanoel Amaral, Gilvan Lira, Carlos Alberto, Marcos Guerra, Marcos Garcia, todos de Natal, e outros mais que não posso descrever aqui, devido o espaço de tempo. Mas há muitos no Nordeste que, como eu, com todas as dificuldades, conseguem produzir e divulgar seus próprios quadrinhos.

GCS.: Alguns acham que os quadrinhos têm por objetivo único divertir. Que outras funções poderiam ter tais produções?

AP.: Acredito que além da diversão que o universo dos quadrinhos proporciona, através de sua linguagem, podemos passar mensagens de superação, respeito, fé, dramatização, histórias e infinitos temas que podemos abordar empregando a linguagem das histórias em quadrinhos. Sem falar no emprego da alfabetização, incentivando os alunos do início do fundamental a gostarem mais da leitura. Todos que sabem ler até hoje, não todos, mas a grande maioria, aprendeu a gostar da leitura através da linguagem das histórias em quadrinhos.

GCS.: Diga-nos os meios de entrar em contato com você para encomendar revistas ou algum trabalho de ilustração. (E-mail, Facebook, Whatsap, Fone etc)

AP.: O meio mais fácil de conseguir encomendar algumas revistas minhas que produzi é através do Facebook ou do meu Email: antonietopereira@hotmail.com.

GCS.: Dê alguns conselhos aos que pretendem seguir esta carreira e deixe-nos suas palavras finais.

AP.: Para os que pretendem seguir essa espinhosa carreira dos quadrinhos, eu gostaria de dizer o seguinte: Primeiro, tenham bastante paciência; segundo, conhecimento de narrativa e algumas técnicas de desenhos básicos e terceiro, leiam bastante, pois quem trabalha com quadrinhos tem que ler de tudo, de uma bola de remédio a filosofia, pois tudo é informação para o cérebro. E através de bastante informação conseguiremos imaginar muitos traços e histórias contadas através das narrativas das histórias em quadrinho. Por fim, gostaria aqui de agradecer ao Blog da “APOESC”, que vem realizando um excelente trabalho em prol da cultura de nossa cidade e região através desse blog e do programa “APOESC EM CANTO E VERSO” veiculado todos os sábados pela Rádio Comunitária “SANTA RITA – FM”. A todos um grande abraço e um grande sucesso.

quinta-feira, 20 de abril de 2017

LOUCURAS DA MODA - Gilberto Cardoso dos Santos


ENTREVISTA COM GILBERTO CARDOSO DOS SANTOS - Oliveira Caruso

ENTREVISTADO:  GILBERTO CARDOSO DOS SANTOS
 ENTREVISTADOR: Paulo Roberto de Oliveira Caruso (pseudônimo: Oliveira Caruso)Servidor público; revisor de textos; organizador de concursos literários, antologias e eventos literários. Administrador e advogado pela Universidade Federal Fluminense. Integrante de Academias de Letras e Artes. Entre suas  funções em Academias encontram-se: atual presidente da Academia Brasileira de Trova; vice-Presidente da Academia Evangélica de Ciências, Artes e Letras do Brasil e secretário de Diplomacia e Comunicação da Academia de Letras do Brasil (seccional Minas Gerais). 
Oliveira Caruso

Gilberto Cardoso
  1. De onde você é? Quando você começou a se aventurar na literatura? Sofreu influência direta de parentes mais velhos, amigos, professores? O que aprendeu na escola o instigou a criar textos?

Nasci em Cuité, capital do Curimataú paraibano. Mudei-me muito jovem para Santa Cruz/RN, a fim de fazer faculdade; neste lugar onde hoje se ergue a maior estátua da cristandade, fui agraciado com o titulo de cidadão e até o momento resido.

Comecei a produzir alguma coisa ainda muito jovem. Quando adolescente, escrevi uma peça humorística intitulada “A Morte de Jesus Cristo no século XX", encenada e bem apreciada em minha cidade. Escrevi diversos poemas que traziam a marca de autores modernistas.

Independentemente da escola, desenvolvi gosto pela leitura ainda muito jovem. Lembro-me de pessoas sentadas – eu entre as tais - nalgum batente à noite, ouvindo histórias de Trancoso e leitura de cordéis. Violeiros e vendedores de cordel circulavam por nossas feiras; como era bom ouvi-los a cantar ou a ler histórias rimadas que até hoje povoam o imaginário nordestino!

Amigos – alguns deles hoje figurantes e fulgurantes na história literária de Cuité e de Santa Cruz - exerceram positiva influência sobre mim, mais que os professores. Ramilton Marinho, Dinamérico Soares, Aécio Cândido, Zé de Luzia, Hélio Crisanto, Naílson Costa, Adriano Bezerra, Marcos Cavalcanti e Zé Acaci são alguns dos muitos nomes que me vêm à memória no momento. Em amplo sentido, crescemos juntos!

Por falar em professores, recordo-me de dois episódios que alimentaram meu amor pela leitura e pela escrita. Vivíamos num tempo em que livro era artigo raríssimo. Uma vez fui premiado por Doutor Orlando, professor de português, com uma antologia escolar de crônicas e fiquei muito feliz. Lembro-me, também, de uma vez que fiz um trabalho em versos e o professor, diante de toda a classe, colocou em cheque minha honestidade. Num tempo em que não havia Internet, achou ele que eu havia copiado de algum livro de poemas e demorou a crer que de fato fosse meu. Isso de algum modo me levou a acreditar que meus textos tinham alguma qualidade.


  1. Você já leu muitas obras e lê frequentemente? Que gêneros (poesia, contos, crônicas, romance) e autores prefere?

Li e leio muito, sim – hoje menos por causa das muitas ocupações e fatores de desatenção próprios dessa época. Tive a sorte de residir próximo à casa de Miguel de Almeida, irmão do ex-governador da Paraíba José Américo de Almeida, autor de A Bagaceira. Em sua rica biblioteca tive acesso a ótimos livros. Também pegava livros na biblioteca local. Obras de José Lins do Rego, Jorge Amado, Gabriel Garcia Marques, Drummond, Padre Antônio Vieira, Manuel Bandeira, Fernando Sabino, Rubem Braga, Ariano Suassuna... Gosto dos quatro gêneros. Posteriormente li Crime e Castigo, de Dostoiévsky, obra fantástica. O contista potiguar Ney Leandro de Castro tem textos excelentes. Rubem Fonseca, Luís Fernando Veríssimo, são todos escritores dignos de recomendação.


  1. Costuma fazer um glossário com as palavras que encontra por aí (em livros, na internet, na televisão etc.) e ir ao dicionário pesquisá-las?

Quando escrevo algo, às vezes tenho dúvidas sobre alguma expressão ou vocábulo. Nestes momentos empreendo alguma pesquisa até certificar-me de que farei correto e bom uso do termo.


  1. Há escritores de hoje na internet (não consagrados pelo povo) que admira? Em sites, Academias de que de repente você participa etc.

Sim, há muitos. Zé Acaci, Hélio Crisanto, Marciano Medeiros, Zé Ferreira, Mariana Teles, Rosemilton Silva, Francisca Araújo, Carlos Fialho, Hélio Alexandre e muitos outros. O Ramilton Marinho, por exemplo, escreveu uma coletânea de contos muito boa: Ninguém matou Baltazar. O Luiz Berto publicou um romance envolvente, de cunho regionalista, intitulado O Romance da Besta Fubana.  Na Internet e fora dela, com e sem publicações, conheço escritores valiosos que mereceriam uma maior projeção entre o público leitor.


  1. Você costuma participar de antologias? Acha-as algo interessante? Participaria de uma se eu a lançasse?

Costumo, sim. Já participei de uma antologia em prosa e verso intitulada Cantos e Contos do Trairi, organizada pela ASPE. Acho as antologias tão interessantes e úteis a quem se inicia na escrita que organizei e participei da coletânea APOESC em verso e prosa, publicado este ano; por último, tive a honra de figurar com um de meus cordéis numa antologia organizada pela ANLiC (Academia Norte-rio-grandense de Literatura de Cordel) batizada de O Cordel da Nossa Gente. Figurar entre nomes de peso da literatura popular para mim foi motivo de muita alegria. Também fui convidado pelo poeta e grande ativista cultural Antônio Cabral a participar de duas antologias de trova, uma organizada por ele e outra pela UBT. Regozijei-me com o convite e certamente poderei fazer parte de alguma organizada por você e sua equipe.


  1. Você é membro de Academias de Letras? Aceitaria indicações para ingressar em Academias de Letras como membro?

Não sou membro de nenhuma academia. No passado recusei o convite para ingressar em uma devido a empecilhos geográficos. Sou membro e um dos fundadores da APOESC – Associação de Poetas e Escritores de Santa Cruz, que costumo divulgar como Associação de Poetas, Escritores, Simpatizantes e Colaboradores. Aliás, desde quando sugeri essa sigla tive em mente essa dubiedade de sentido.


  1. Tem ideia de quantos textos literários já escreveu? Há quanto tempo escreve ininterruptamente?

Tenho muita coisa escrita em pastas do computador, principalmente em versos. Daria vários livros. Desde a adolescência escrevo. Também tenho crônicas e contos que pretendo publicar.


  1. Você tem dificuldade de escrever em prosa, em verso? 

Às vezes surge uma ideia que nos parece interessante e não sabemos em que gênero expressá-la. Prosa e poesia me parecem difíceis, dependendo do momento. Às vezes acalento o sonho de escrever um ou mais romances.


  1. Você possui algum lugar onde publica textos virtualmente? Qual? 

Publico textos no Blog da APOESC e no Blog do Gil (http://apoesc.blogspot.com.br/ e http://bloggcarsantos.blogspot.com.br/ )


  1. Que temas prefere escrever? Prefere ficção ou o que vivencia e vê no dia a dia?

Gosto de temáticas extraídas de minha vivência, mas exploro temas que nascem da imaginação. A mescla de ficção e realidade me fascina.


  1. Aprecia outros tipos de arte usualmente? Frequenta museus, teatros, apresentações musicais, salões de pintura? Está envolvido com outro tipo de arte (é pintor, músico, escultor?)

Moro num interior onde não há muitas apresentações culturais. Temos, todavia, um teatro onde sempre que há algo vou assistir e onde também vez por outra me apresento cantando e declamando. Temos um projeto chamado APOESC Recitando o Sertão, eu e outros membros da associação, que já contou com patrocínio do BNDES. Admirador doutras expressões artísticas, vez por outra entrevisto algum artista local, seja no programa de rádio APOESC em Canto e Verso, seja em vídeos divulgados no Youtube. Ex.: https://www.youtube.com/watch?v=pC4I378UAbI


  1. Que retorno você espera da literatura para si mesmo no Brasil? E a nível de mundo?

Escrevo primeiramente pelo prazer de registrar algumas coisas que me encantam. Percebo que a vontade de ensinar ou filosofar sobre determinados temas é o que me guia. Tenho tido algum retorno financeiro e reconhecimento com os cordéis que publiquei, com os musicais que escrevi (auto de Santa Rita e Auto de São Sebastião) e isso é muito satisfatório. Ser saudado na rua por alguém que para pra comentar sobre algum texto meu é bem prazeroso. Sinto-me a cumprir uma missão.  Não tenho grandes pretensões. No entanto, conforme detalhei em minha dissertação de mestrado, desejo muito que a cultura regionalista dos meus estados (PB e RN) não venha a desaparecer nem seja relegada à marginalidade como consequência da globalização. Antes, com as possibilidades criadas pelo avanço tecnológico, que possa universalizar-se sem perder nenhuma de suas características. Mediante o processo de globalização o cordel e a cantoria de viola, por exemplo, poderão subsistir no mundo moderno e ganhar a repercussão nacional e mundial que deveriam ter.


  1. Você acha que o brasileiro médio costuma ler? Acha que ele gosta de literatura tradicional ou só de notícias rápidas e sem profundidade?

Infelizmente, amigo, a parte dominante dos brasileiros é constituída por iletrados e analfabetos funcionais, conforme indicado por pesquisas do INEP. A maior parte dos poucos que leem, dedica-se a “notícias rápidas e sem profundidade”. A Internet nos proporciona novos modos de ler, mas em geral os internautas não aproveitam bem as grandes riquezas literárias e científicas que têm ao dispor. Há uma onda de leitores de best sellers, o que não é de todo mal, mas bem reduzido é o número dos que valorizam a literatura de boa qualidade.  


  1. Você costuma registrar seus textos na FBN antes de publicá-los? Sabe da importância disso?

Não. Acabo de ter minha atenção despertada para esta necessidade. Vou pesquisar a respeito e desde já conto com sua orientação.


  1. Já tem livros-solo publicados? Consegue vendê-los com certa facilidade?

Tenho cordéis publicados, opúsculos com poemas mais ou menos longos que contam alguma história ou dissertam sobre algum tema. Tenho “certa facilidade” em vendê-los, sim. 


  1. Já conhecia o poeta-escritor Oliveira Caruso (desculpe-me... Esta pergunta é padrão para quem participa de meus concursos literários)?

Não. Ao ser abordado por você, recorri ao Antônio Cabral e ele me passou excelentes e admiráveis informações a seu respeito. Com o aval dele, dei continuidade a este contato. Como a melhor propaganda é um “cliente” satisfeito, vou ler suas produções baseado no que me disse o Antônio, certo de que terei razões para me encantar.


  1. Você trabalha com literatura inclusive para aumentar sua renda ou a leva como um delicioso hobby?

Como hobby e para aumentar a renda. Vez por outra eu e outros da associação somos remunerados para ministrar algum curso, apresentação ou seminário e o hobby se torna duplamente satisfatório.


  1. Você trabalha(ou) fora da literatura?

Sim. Sou professor da rede estadual do RN, com dois vínculos.


fonte: http://reinodosconcursos.com.br/entrevista-com-gilberto-cardoso-dos-santos