quinta-feira, 13 de março de 2025

O CINEMA DO SERTÃO: DA ESCASSEZ À BONANÇA - Washington Ribeiro

 


O PORQUÊ DESTE CORDEL

A natureza, como um cinema da vida real, me mostrou um filme que, de maneira profunda, ficou gravado em minha mente: cada cena, cada detalhe, cenário, enredo, atuação, emoção... Sentimentos diversos e intensos.

Retratava a saga do vaqueiro para alimentar e proteger o rebanho durante uma seca impiedosa. Essa história se passava no sertão nordestino, onde, em um cenário abrasador, sob uma rotina diária ininterrupta, armado de foice, lança e outros atributos... tudo forjado na garra, na fé e na esperança..., seguia firme o vaqueiro, vencendo, dia após dia, verdadeiras batalhas até o ápice final, quando chega o tão esperado inverno e sana todas as dores.

Como elementos principais destacavam-se: o sertão, o vaqueiro, o rebanho, a seca, a chuva, a natureza, a esperança, a fé... Essa mistura tem uma ligação muito forte, fonte inesgotável de inspiração, material genuíno para o poeta. - Washington Ribeiro

 

 

O CINEMA DO SERTÃO: DA ESCASSEZ À BONANÇA

Ao ver a seca assolando,
O vaqueiro fica alerta.
O laço da angústia aperta,
Com o pasto se acabando.
Reservatórios secando,
O prenúncio é de amargar...
Vendo a esperança acabar,
O tempo desce a ladeira;
A seca fecha a porteira
E não deixa o inverno entrar.

Vê-se o sol, escravizado,
Aguçar sua rotina.
A cor cinza predomina
Sobre o solo esturricado,
Num cenário desenhado
Pela seca impiedosa.
Mas, de forma majestosa,
Forjado em superação,
Segue firme na missão
O vaqueiro em "verso e prosa".

O vigor e a inteligência
Vão andando lado a lado
Para alimentar o gado
Com bravura e competência.
Exercita a paciência
Numa rotina de horário;
Segue firme o itinerário,
Armado de foice e lança,
E, nas chamas da esperança,
Vai queimando o calendário.

No palco vai atuando:
Queima espinhos, corta palmas...
Sem ter plateia, sem palmas
E sem câmeras filmando...
Só a mente registrando
Cada cena dessa lida,
Dia a dia repetida.
E mesmo no anonimato,
Vai cumprindo ato a ato,
Vencendo as secas da vida.

E tem a pele queimada
Pelo sol e pelas chamas.
A seca escreve seus dramas,
Põe em cartaz na jornada.
Embora a mente cansada,
Traça planos pra missão...
Ser forte? A única opção.
De mão dada à experiência,
Abraça a resiliência
Com os braços da razão.

Cansa o corpo, cansa a mente!
Seca traz danos imensos,
Momentos tensos e intensos;
Da paz, sufoca a semente.
O vaqueiro segue em frente,
Sua fé em Deus não cansa.
Segue o ritmo, dança a dança...
Certo do fim desse entrave,
Pois o inverno traz a chave
Que abre as portas de bonança.

Vai tangendo o dia a dia,
Aboiando a persistência.
O vaqueiro é resistência;
Para o Poeta, Poesia.
E vislumbrando alegria,
Na mente vem trovoada,
Apascentando a jornada.
Nessa lembrança sonora,
Que traz um filme de outrora
Com emoções de invernada.

Bons tempos se aproximando:
Previsões são promissoras.
Fauna e flora, detectoras;
Natureza anunciando.
No mandacaru florando,
Na formiga que trabalha,
Cada fator é navalha
Golpeando essa enxaqueca,
Cortando os pulsos da seca,
Datando o fim da batalha.

O vaqueiro faz contagem,
Ansiosamente espera...
Um certo receio impera,
Mas entende ser bobagem,
Pois logo terá pastagem,
A paisagem restaurada.
Segue na mesma pisada,
Reta final "dá o gás"...
Planta a semente da paz,
Sonha em vê-la germinada.

Com emoção, faz pedido
A Deus Pai, o Criador.
Reza com todo fervor,
Vendo o torrão ressequido.
Feito filme repetido,
De carona com a hora,
Esperanças indo embora...
Mas, no horizonte, acenando,
Alegre nuvem, chorando,
Alegra o peito que chora.

E chega a chuva esperada!
Então, a saga se encerra...
Vê-se a paz vencendo a guerra,
Vê-se a seca derrotada!
Trovão fazendo zoada,
O relâmpago frequente;
Inverno chega imponente,
Abraçando a natureza...
Desce verso em correnteza
Pelo riacho da mente.

As nuvens no firmamento
Despejam bênçãos divinas.
Da seca, fecha as cortinas,
Decretando encerramento.
É fim do mau elemento,
Bonança entende o recado.
O Sertão é transformado,
Pois chuva derrama graças;
Da paz, retira as mordaças,
Nosso inverno é decretado.

Numa descarga medonha,
Relâmpago no horizonte
Risca o céu, clareia o monte —
Tudo que o vaqueiro sonha.
É como a dizer: disponha!
Por seu ato de bravura.
Refazendo-se a Natura,
O vaqueiro fica vendo
As mãos da chuva tecendo
Um tapete de fartura.

Com a chuva justiceira,
Canta em festa a passarada.
Seca bate em retirada,
Cabisbaixa, sai ligeira.
Vibra a natureza inteira,
O suplício terminou...
Pastagem se restaurou,
Reservatórios enchendo...
Inverno vem devolvendo
Tudo que a seca roubou.

Vem a chuva, vão-se as dores,
As mazelas da estiagem.
Pinta de verde a pastagem,
Pondo a paisagem em cores.
Natureza, rindo em flores,
Canta canção afinada,
Partitura desenhada
No tinido da biqueira,
No chorar da cachoeira,
No cantar da passarada.

A chuva que lava o chão
Também lava a mente, a alma,
E, ao mesmo tempo que acalma,
Acelera o coração.
Na goteira da emoção,
O sertanejo faz prece,
Com devoção agradece
Pela graça recebida.
— Natureza abastecida
De tudo nos abastece.

Washington Ribeiro
Barcelona-RN

 



Nascido em 04 de março de 1976 na cidade de Barcelona, RN, José Washington Ribeiro da Silva é um apaixonado pela arte da palavra. Filho de José Francisco da Silva e Maria do Socorro Ribeiro da Silva, Washington reside em sua terra natal e dedica-se à educação do município.

Washington participa ativamente de eventos culturais como saraus e feiras literárias, tanto em escolas municipais quanto estaduais. Sua voz ecoa nos palcos, recitando poemas e incentivando a leitura.

A paixão pelas palavras o acompanha desde a infância, quando, como um ouvinte atento, absorvia a beleza da linguagem e, em momentos de inspiração, construía versos soltos. Foi em 2013 que Washington decidiu dar forma aos seus pensamentos, transformando suas ideias em poemas. Seus versos abordam temas como a enigmática natureza, a complexidade do ser humano, e a busca pela essência da beleza em sentimentos que brotam da mente e do coração.

Em 2019, Washington descobriu o mundo mágico da literatura de cordel, encantando-se com o desafio de construir poemas que obedecem à disciplina da rima, métrica e oração.

Para entrar em contato com Washington Ribeiro e conhecer mais sobre sua obra, você pode utilizar o

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Facebook: Washington Ribeiro; 

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Email: washingtonribeiro76@gmail.com 

2 comentários:

  1. Um cordel magistral, Washington, a voz da natureza. - Gilberto Cardoso

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    1. Feliz pelo valoroso feedback, Nobre Poeta, Gilberto Cardoso. E, muito obrigado pelo espaço em tão renomada página. (Washington Ribeiro).

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