quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

O PRAZER DO EXERCÍCIO DE QUALQUER QUE SEJA O PODER



 O PRAZER DO EXERCÍCIO DE QUALQUER QUE SEJA O PODER


Significa que a cada dois minutos uma lata d'água era despejada num metro quadrado, disse o especialista explicando o que significou a tempestade caída nos últimos dias na cidade portuária. Ali, rolaram pedras e barro das encostas atrapalhando o trânsito nas principais vias de acesso ao litoral. 


O coração quase saiu pela boca da mulher que assistiu seu veículo ser arrastado com ela dentro sem poder fazer muito, a não ser ligar para o marido.


Alô! Oi!? Estou descendo a encosta, dá para você vir me salvar? Não estou entendendo. Leia o texto do início que você entenderá. Ah, tá! Você está sendo "personagem literário", é isso? E você também, então cuide de fazer alguma coisa senão os leitores irão ficar contra você. Que se danem! Eu não pedi para entrar nessa história, e digo mais, esse autor toda vez que vai colocar um marido nas suas criações eu sou logo requisitado sem nem me perguntar se aceito o papel. Na última vez, ele me mandou dirigir não se importando nem um pouco se eu possuía ou não habilitação. Mas você tem. Supõe-se que eu tenha, mas nunca precisei fazer os testes. Amor, eu estou caindo. Amor coisa alguma. Quando é para você transar eu sempre fico de fora, portanto "te vira".


Enquanto o casal discutia a relação, um raio caiu na árvore do quintal onde o marido estava. Assim é sacanagem, disse o marido se acovardando. Permaneça com os vidros fechados, disse ele já providenciando o helicóptero para ir sobrevoar o local de onde vinha o sinal soterrado. Eu nem sabia que você tinha helicóptero. E nem eu sabia que sabia pilotar. Estou indo ao seu encontro. Pois traga os paramédicos que Carlão desmaiou. Quem é Carlão? O meu amante. E você diz sem nenhuma cerimônia? Eu já sei que o autor vai me matar assim que você chegar para me resgatar, então não tenho nenhum problema de lhe confessar a verdade. Então eu não vou. Você não tem escolha meu bem. És um pau mandado. 


O marido já tinha pilotado em situações de maior risco até então. No Vietnã, além do tempo ruim, teve que escapar, por várias vezes, de rajadas de metralhadoras até ficar refém, e durante mais de um ano foi retirado da água, uma vez por dia, para que os "vietcongues" se divertissem apagando cigarros na sua pele. 


Por isso que sinto umas coceiras na barriga e nem desconfiava de onde vinham essas cicatrizes, diz o marido levantando a camisa e passando a mão nos lugares onde nunca nasceu cabelos.


O carro parou de ser levado pela água barrenta, mas não estou enxergando nada além de lama.  Aguente firme, estou chegando. Carlão acordou. Mate-o senão eu lhes mato quando chegar aí. Eu não disse!?  O quê? Vou morrer, só não sabia que era pelas suas mãos. Vai ser com tiros que vou matá-los. Você nunca pegou numa arma. Está esquecendo que estive no Vietnã? Virgem! como somos velhos!  Deixe de ser burra! Isso está se passando poucos anos depois de mil, novecentos e setenta e cinco quando a guerra havia terminado. Agora que me lembrei: foi no mesmo ano que conheci você e o Carlão na festa de condecoração. Ah!, quer dizer que Carlão é o meu antigo parceiro de esquadrão antibombas? 

Ele quer fazer sexo antes da gente morrer. Isso é hora de pensar nisso? Mas é ele, meu amor. Venha ligeiro senão tenho que dar. Se ele lhe estuprar é crime, diga isso a esse traidor. Eu quero ser criminalizada por Carlão, sabia? seu bobo! 


Os bombeiros acabam de encontrar um carro soterrado, diz a repórter mostrando o guindaste içando o veículo.  O marido sobrevoa o local no mesmo instante que o casal abraçado está sendo retirado sem vida. Pelo menos eu escapei, diz o marido acionando os controles do helicóptero para voltar para casa. Agora posso ficar com a pensão da falecida e assumir o romance com a governanta. 


Acho que vou provocar um acidente nesse seu helicóptero, diz o autor só para "tirar onda" com o personagem.


Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 22.02.2024 - 09h42min



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