VOLTA POR CIMA
Derna deu muito pequeno
Era mei mal-amanhado
Fui muito apilidado
Ali naquele terreno
Eu ainda era criança
Divido eu ser mei buchudo
Me chamaram burrachudo
Casca-Grossa e Chico Pança.
Mais dispoi fui incoipano
Os cafanhaque apontano
Via os zouto namorano
E doidim pá vê cuma era
Saí um dia bem cedo
Escundidim em segredo
E fui paquerá Quitéra.
Cheguei bem pertim dela
E dixe: “Ou morena bela
Tu quéis sê minha paquera?”
Ela dixe: “Sai de mim
Aimação de caba rim!”
Eu já fiquei mei assim
Sem tê mesmo o que dizê
Ela deu uma rabissaca
Foi lá dentro da barraca
Deu de garra numa faca
O jeito foi eu corrê.
Arrisurví ir mimbora
Passá uns tempo lá fora
Pedi pá Nossa Senhora
Pra ela me ajudá
Peu arranjá um emprego
Esquecê esse chamego
Que minha vontade era
De dá um duro danado
Pá chegá bem estribado
Todo chique e arrumado
Pá fazê raiva a Quitéra
Arrumei o matulão
Me atrepei num caminhão
E saí de mundo afora
Cinco ano eu trabaiei
Um bom dinhêro ajuntei
Pedi as conta e vortêi
Pu lugá que meu pai mora.
Achei tudo diferente
Os véi ficaro contente
Conde um amigo da gente
Dixe em tom de brincadêra
“Adispoi que tu saísse
Queria que você visse
Uma pessoa me dixe
Que Quitéra inda é sortera!”
A nutiça se ispaiô
E eu num sei quem falô
Pá Quitéra “Quem chegô
Foi o rapai injeitado
Aquele que só foi simbora
Puique você deu-le um fora
Num é que chegô agora?
O caba vei estribado.”
E ela ali calada
Cuma quem num ligô nada
Mai na mente da danada
Já tava fazeno um prano
Pensano: “vô visitá ele
Chego lá me agarro nele
Lhe dô um xêro daquele
E nói termina casano.”
Um dia eu tava deitado
Já passava de uma hora
O só quente cuma brasa
Conde arguém dixe: “Ou de casa?”
Arrespondí: “Ou de fora!”
Me alevantei da rede
Pensano: “É arguém cum sede”
E fui lá fora pá vê quem era
Conde fui me aprochegano
Tinha uma véia me oiano
Preguntei: “Cum quem tô falano?”
Ela dixe: “É cum Quitéra”.
Eu dixe: “Tu sois aquela que era
A muié da minha vida
Onde está o teu orgulho?
Ela dixe intristicida
“Vamo esquecê o passado”
Eu dixe: “Muié fingida
Num pense que eu sô covarde
Num acha que agora é tarde
Siga em frente o teu caminho
Que eu tô bem, obrigado
Lembro que fui injeitado
Enquanto eu tiver lembrado
Prefiro viver sozinho.
Pelo jeito que tu vai
Se aparecê um rapai
Veja lá cuma tu fai
Pá vê se num morre só
Num faça o que fei cum eu
Tu num sabe o que perdeu
O castigo já recebeu
É terminá no caritó.
Eu aprendi a lição
Peigunte a teu coração
Se ainda guarda paxão?
Puique no meu num consigo
Hoje estai arrependida
Se lastimano da vida
Será que tais esquecida
De tudo que fei comigo?”
Autor: JOSELITO FONSECA DE MACEDO, vulgo, DAXINHA.
08/05/2005.
O poeta Daxinha sempre gostou muito de escrever em "linguagem matuta", como ele costumava dizer.
ResponderExcluirPenso que é a essência linguística do homem simples do sertão, expressando seus sentimentos mais genuínos.
Obrigada pelo espaço, grande Gilberto!!