O
POETA DO BRASIL
Diógenes da Cunha Lima
Se o País escolhesse, por sufrágio
popular, o seu Poeta, certamente Vinícius de Moraes seria vitorioso. Ninguém viveu
e tratou o amor tão singularmente quanto ele. Por outro lado, ninguém se
enganou tanto. Teve incontáveis namoradinhas e casou-se nove vezes. A
sensualidade e o amor da vida são refletidos em poemas, letras e músicas que
encantam o povo.
Drummond
reconheceu nele o fôlego dos românticos, a espiritualidade dos
simbolistas e a perícia dos parnasianos. O cronista Antônio Maria, que tinha
casa, comida e roupa lavada no seu coração, consagrou-lhe o apelido de “Poetinha”.
A qualificação carinhosa serviu, muitas vezes, à crítica que tenta apequenar
suas virtudes poéticas.
O
acadêmico Paulo de Tarso contou-me ter ouvido de João Cabral, mais de uma vez, que
Vinícius não era o maior poeta da língua portuguesa porque não quis.
Diplomata
de carreira, boêmio informal por natureza, com a arte da palavra conquistou amigos
sem preocupação com as suas crenças e ideologias, mas que importavam ao Brasil.
Entretanto, assim não pensava o curto e grosso presidente Costa e Silva. Em memorando
ao Ministério das Relações Exteriores, ordenou: “Demita esse vagabundo”. O diplomata
concursado teve aposentadoria aos cinquenta e um anos.
Pablo
Neruda foi uma das amizades mais próximas. Mútua admiração, conviveram e
trocaram poemas. Neruda define o seu fazer: “a celebrar o divino e o humano/e a
viver de verdade a poesia”.
Em
1974, Vinícius e Toquinho hospedaram-se em residência de Ponta Negra. O jovem
repórter Vicente Serejo foi destacado para entrevistá-los. Também participantes
o escritor Machadinho, João Batista Machado e o fotógrafo Clóvis Santos. Durante
a visita, tomou um litro de uísque Vat 69. Revelou que Natal lhe inspirara uma
nova música. Sabedor que o repórter estava casado há três meses, pergunta a
Rejane: “Gostou da profissão?”.
O
grupo foi, literalmente, abandonado quando por lá passaram duas meninas bonitas,
uma delas com um saguim no ombro. O Poetinha, embevecido, bebeu a cachaça que
elas ofereceram. Muito depois, Vinícius registrou que a melodia aqui criada
ganhara nova roupagem e passou a se chamar “Carta a Tom 74”.
Vinícius
viveu intensamente a sua arte. Nunca abandonou a poesia de excelência, mesmo quando
se dedicou a fazer letras e músicas de gosto popular. Estimulou vocações, produziu
crônicas, críticas de cinema, contos, dramas. O poeta teve muitos momentos de epifanias
e, em um desses momentos de singular inspiração, colocou o mito grego de Orfeu em
uma favela carioca, “Orfeu da Conceição”. Com música de Tom Jobim, foi encenada
no Teatro Municipal do Rio. A adaptação cinematográfica francesa, de Marcel Camus,
ganhou Oscar, Globo de Ouro e Palma de Ouro em Cannes.
O
Poeta viveu para ser lembrado. Com tantas amizades, ninguém se candidatou ao
seu desejo: “quem dentre os amigos, tão amigo para ir no caixão comigo?”.
Diógenes da Cunha Lima (poeta, prosador e compositor) é advogado e presidente da ANL (Academia Norte-rio-grandense de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
Foi Presidente da FJA, Secretário de Estado; Consultor Geral do Estado; Reitor da UFRN; Presidente do CRUB. Atualmente, dirige o seu Escritório de Advocacia e preside a ANL (Academia de Letras). Alguns de seus livros: “Câmara Cascudo - Um Brasileiro Feliz”, “Instrumento Dúctil”, “Corpo Breve”, “Os Pássaros da Memória”; “Livro das Respostas” (em face do “Libro de las preguntas”, de Pablo Neruda); “A Memória das Cores”; “Memória das Águas”; “O Magnífico”; “A Avó e o Disco Voador” (infantil).
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