sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

CADA ÉPOCA MERECE O QUE TEM - Heraldo Lins

 



CADA ÉPOCA MERECE O QUE TEM

 

 

O que você faz da vida? Esta pergunta sendo de um adulto no mínimo se responde com outra um pouco agressiva: por quê? Por que você quer saber da minha vida? É da sua conta? Vindo de uma criança de cinco anos, desarma-se. Onde danado esse garoto aprendeu a perguntar isto!? Qual o interesse em saber em que cada um da família trabalha!? É no mínimo intrigante se o autor não tivesse aprendido a ler aos dois anos de idade. Aos três já orientava a mãe nas compras dentro do carrinho de supermercado. Falava que tal produto estava em promoção por conter sal acima do permitido pela OMS. Aos quatro já dominava três idiomas e aos cinco perturbava a família se passando por orientador dos recursos humanos familiar.

 

Os gênios nascem pronto. Mozart, aos vinte anos, orientava um dos seus alunos quando um deles lhe perguntou como se fazia uma sinfonia. Ele respondeu que o aluno estava muito jovem para pensar em compor uma sinfonia, quando o outro rebateu: é, mas o senhor aos cinco anos de idade compôs a primeira. Ele também de pronto respondeu: compus, mas não perguntei a ninguém como se fazia. Onde Mozart havia aprendido se ninguém ensinou? Há os defensores da reencarnação que dizem que são espíritos evoluídos encarnados. Já trazem o conhecimento de vidas passadas. Lembrei-me do ocorrido com o grande enigma da cultura egípcia. Um estudioso sonhou como decifrar os hieróglifos e hoje, graças a ele, conhecemos a vida social dos construtores das pirâmides. Não sei se foram histórias criadas, mas existe essa conversa por aí. Tendo em vista que os espíritos, segundo essa corrente, são de épocas distantes, os que chamamos hoje de gênios precisam apenas ir se modelando aos tempos modernos para criar soluções práticas para o bem-estar da grande maioria.

 

Perguntei ao meu gênio, o do início da conversa, o que ele pretende ser quando crescer. Ele disse que já cresceu. Nasceu menor do que a cabeça de um alfinete no útero materno e já alcançou mais de um metro de altura.  É um gigante comparado há cinco anos. Logo em seguida quis saber o meu interesse em se preocupar com o futuro dele, já que não consegue ter o domínio de nem um minuto a mais do que está vivenciando. Apenas desconversei e continuei a passear pelo shopping. Parei em frente a uma loja de brinquedos. Perguntei-lhe se ele queria um. Ele fez um discurso onde enfatizava que aquilo eram objetos utilizados por debiloides. Não sentia nenhum interesse em puxar um carrinho. Não via graça em observar um trenzinho andar por controle remoto. Queria que eu comprasse peças para ele montar um sapato onde andasse sozinho. A pessoa calçava e não precisava fazer nenhum esforço. O tênis seria para quem gosta de chegar rápido ao trabalho. Evitaria a fumaça dos veículos, acidentes, IPVA... pedi a ele para não falar com mais ninguém sobre essas ideias. É difícil se manter vivo se for de encontro aos interesses industriais vigentes. Ele entendeu. Ficou triste. Definhou. No outro dia amanheceu morto.                  

 



Heraldo Lins Marinho Dantas (arte-educador)

Santa Cruz/RN, 02/01/2021   09:06  

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