quinta-feira, 9 de abril de 2020

APÓS O AFASTAMENTO SOCIAL - Por Júlio César, psicólogo




09 de Abril de 2020, véspera da Paixão de Cristo

Estamos entrando numa nova fase do enfrentamento ao COVID-19: o “isolamento social” em tempo de pico da epidemia.

Até agora estávamos no ritmo de “afastamento social”, aquele facultativo, quando ainda podíamos sair, ir e vir ao nosso bel prazer, mas na fase de pico epidêmico temos que tomar medidas mais drásticas, pois o vírus, antes invisível, já pode ser visto a olho nu nas estatísticas da nossa cidade, do nosso bairro e, agora, estamos entrando no “isolamento social”.

No isolamento social passamos a não apenas estarmos impedidos de sair às ruas, mas a voltarmos nossa atenção a nós mesmos, ao que é importante na nossa vida como nossos amores, nossos afetos, nossa sensibilidade, nosso “eu interior” com suas qualidades e seus defeitos. É quando estaremos convivendo, profundamente, com as pessoas que fazem parte integralmente da nossa vida, também com suas qualidades e com seus defeitos. Perceberemos que vivíamos virados de costas para a realidade e vendo apenas as sombras refletidas nas paredes da nossa visão.

A notícia boa é que essa fase, também, passará e em breve estaremos planejando como serão nossas ações, livres das amarras do isolamento e a má notícia é que não voltaremos ao normal (no sentido de que voltaremos a fazer tudo o que fazíamos antes).

O normal na nossa vida cotidiana será totalmente diferente do que fazíamos antes dessa pandemia. Agora sabemos que somos vulneráveis, que estávamos sós e não percebíamos, que necessitamos criar uma rede social ativa, presencial e não virtual, que o ser é maior que o ter e que tínhamos tempo, mas não nos dávamos conta disso e que o discurso da “falta de tempo” era uma forma de racionalizar o fato de que estávamos andando em círculos e não saíamos do lugar, que tínhamos muitas tarefas que não terminavam nunca.

Estamos dando conta de que temos centenas de “amigos” no Facebook e outros tantos contatos no WhatsApp e no Instagram, mas só conversamos com menos que 10 deles, que poucos nos chamam para tomar um café e bater um papo juntos – e presencialmente. Enfim, passamos a nos olhar com os olhos voltados para dentro e aprendendo a conviver conosco, com as pessoas que vivem na nossa casa e que quase não convivíamos. Sim, conviver é muito diferente de morar junto.

O novo normal na nossa vida será gastarmos menos com supérfluos, sermos mais solidários, sermos mais espiritualizados (mesmo sem ter uma religião), sermos mais amorosos e mais prazerosos.

Estamos percebendo, olhando para nós mesmos, que precisamos tomar uma posição ativa em relação ao nosso destino, estamos nos vendo fora da caverna em que vivíamos, ofuscados por uma avalanche de informações desencontradas e que mais confundiam do que esclareciam. Entretanto, essa nova visão está sendo intolerável para muitos de nós, pois está despertando a fera adormecida sob uma existência explorada, torturada e usada pelos poderosos, pois era preciso alimentar a fome de poder da elite dominante.

O novo normal encontrará um cenário social diferente, mais enxuto, mais claro, mais alegre, mais posicionado e, como tudo no universo é regulado pelo equilíbrio, esse cenário terá seu lado mais sombrio, mais violento, mais frio e calculista e cabe a cada um escolher qual cenário será predominante. Lembrem que só podemos dar aquilo que temos, portanto, se vamos dar luz, amor e alegria, temos que alimentá-los em nós ou daremos escuridão e violência se essa for nossa escolha.

Aguardemos.



Um comentário:

  1. Excelente texto, Júlio. Ave, César! Você foi cirúrgico na análise! Parabéns!

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