PELOS CAMINHOS PRAZEROSOS DA
LEITURA: TESSITURAS
Francisca
Joseni dos Santos
Pedagoga
e Psicopedagoga
Eis que fui instigada pelo
amigo poeta Gilberto Cardoso para escrever sobre minhas memórias literárias.
Relutei. Depois fiquei pensando sobre as diversas formas de escrevê-las.
Confesso que comecei escrevendo uma onde elencava a minha trajetória pessoal e
profissional interligada às leituras que permearam minha vida, no entanto,
achei um texto chato e enfadonho.
Pensei em fazer um texto
técnico, desisti também, optei então pelo texto livre das amarras impostas pelo
cunho acadêmico e que segue os ditames da famosa e temerária ABNT – Associação
Brasileira das Normas Técnicas. Feito esta escolha, optei também em ressaltar
as minhas leituras para puro deleite.
Fiz muitas leituras técnicas
ao longo da minha vida acadêmica e profissional. Fiz o curso de Pedagogia
(graduação) e pós-graduação em Psicopedagogia e em Gestão Escolar, trabalhei 32
anos em escola, tempos alternados entre sala de aula, coordenação pedagógica e
gestão, então há de convir que o contexto de leituras técnica é muito amplo,
vasto e serviram de alicerce e de arcabouço para que eu faça a minha leitura de
mundo mesmo considerando que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”
como afirmou Paulo Freire em A Importância do Ato de Ler (1988).
Fui alfabetizada aos 4 anos de
idade, pois tive o privilégio de ter na minha casa uma Escola Isolada (Sítio
Ipueira – São Bento do Trairi – RN). Eu era o desassossego da turma, não
deixava a professora e os alunos quietos, subia na mesa, pegava os lápis e
demais apetrechos dos alunos e atrapalhava bastante o desenvolvimento das
aulas. Meu pai vendo tal situação achou por bem comprar material escolar pra
mim e de posse deste rico material a paz reinou no local, fiquei quietinha e
logo fui alfabetizada.
Como nasci em 1965 as lembranças de
tempos difíceis de seca e de dificuldades para viver no meio rural são bastante
fortes dentro de mim, no entanto, tenho lembranças memoráveis sobre a vivência
com os meus tios, primos e com os meus avós, em especial, a minha avó paterna
(Vó Maria Vital) que me inseriu no contexto maravilhoso de contação de
histórias.
Era comum Vó Maria reunir os netos ao
seu redor para à boquinha da noite, sentada no chão com seu cachimbo de fumo
debulhar suas maravilhosas histórias de trancoso, assombração, de princesa e
príncipes, e de “Camonge”.
Tive o privilégio de conviver com uma
contadora de histórias nata na minha infância e em parte da minha adolescência,
adorava estes momentos apesar de muitas das vezes ficar com medo de dormir com
as histórias de assombrações que ela tão sabiamente nos contava. Estes momentos fazem parte do arquivo
especial das minhas memórias.
Então a leitura e o universo
mágico de contação de histórias se fez presente na minha vida muito cedo,
embora tivesse dificuldades em ter acesso aos diversos portadores de textos, e
estas dificuldades estivessem ligadas as questões financeiras, a
disponibilidade de material à venda; pouca variedade, entre outros.
Sem ser saudosista ouso dizer
que tempos atrás não tínhamos as facilidades que temos hoje para ter acesso à
leitura. Os tempos são outros (graças a Deus!). De acordo com as condições
financeiras pessoais podemos adquirir revistas, livros físicos, livros digitais,
e também podemos ler nos tablets e smartphone de forma grátis além de adquirir
livros e revistas em sebos por um preço bem mais barato.
Na minha infância e
adolescência não tínhamos estas facilidades e nem tampouco condições
financeiras para adquirir portadores textuais. Mas isto não foi impedimento
para que eu cultivasse o hábito pela leitura.
Lia livros emprestados de
amigas que tinham poder aquisitivo para comprá-los, frequentava as bibliotecas
públicas existentes em Santa Cruz. Li praticamente toda a literatura clássica
brasileira tomando livros emprestados na Biblioteca Municipal, bem como li
muitos livros da Biblioteca Monsenhor Emerson Negreiros da E. Estadual Prof.
Ribeiro. Além dos empréstimos de livros para leitura de deleite e era nestas
bibliotecas que eu realizava, quando necessário se fazia, as pesquisas na
famosa Enciclopédia Barsa, o equivalente ao google de hoje, e em outros livros
e enciclopédias.
Faço parte da turma que para ingressar
na 5ª série ginasial precisava prestar o Exame de Admissão, embora que depois
de fazê-lo e ser aprovada, saiu uma determinação para que todos fossem
matriculados independentemente do resultado alcançado.
Para fazermos este exame precisávamos
estudar num livro grosso de capa verde e que continha umas quatro disciplinas
chamado “Preparatório”, pois bem minha mãe que era costureira colocava-me na
frente dela numa cadeira de balanço para estudar neste bendito livro. Olha o
que eu fazia, na época existia uma revista chamada “Love Story” que tratava de
assuntos voltados para adolescentes e dentro dela vinham 5 contos. O formato
dela correspondia ao formato do já citado livro.
Eu me sentava seríssima diante da minha
mãe colocava a revista dentro do livro e ia ler estes contos. No dia do
concurso me deu uma crise de consciência tão grande que você nem imagina, mas
consegui passar em 4º lugar.
Trabalhei uns 5 anos no comércio local
e o dono do estabelecimento comprava revistas usadas para embalar as barras de
sabão, eu separava os exemplares para ler, tomava emprestado estas revistas,
sem contar que chateava as pessoas que tinham condições de comprar revistas
pedindo-as emprestadas.
Talvez por gostar tanto de ler e de
ter tido dificuldades para ler no período da minha infância e da adolescência e
parte da vida adulta hoje eu compro muitos livros e não faço questão de
emprestá-los.
Sempre tenho livros que não consegui
ler, ainda. E, sempre tenho livros espalhados pelo “mei do mundo”. Sem medo de
ser feliz.
Faço questão de ressaltar que os meus
pais sempre se esforçaram para comprar os livros didáticos para mim e minhas
irmãs, nunca mediram esforços. Nunca tivemos dificuldades neste sentido. Eles
sempre valorizaram a educação. Viam através do acesso a educação nossa melhoria
de vida.
Li muito. De Cassandra Rios a
Jorge Amado. De Zélia Gattai a Antonio Callado. De Gabriel Garcia Marques a
Jojo Moyes. De George Martim a Monteiro Lobato. De Antoine de Saint Exupéry a
Padre Fábio de Melo. De Patativa do Assaré a Hugo Tavares Dutra. Não posso
deixar de citar as revistas em quadrinhos, os famosos gibis, li de Walt Disney
e Mauricio de Souza a Antonieto Pereira. Li diversos gêneros textuais. Como era
difícil a aquisição de livros e revistas, eu lia o que aparecia. Sem
preconceito. Uns eu escondia para que a minha mãe não visse.
Li os clássicos da literatura
infanto-juvenil mundial. Li-os por puro deleite e também por dever
profissional. Li muitos autores regionais, Câmara Cascudo, Marcos Cavalcanti, Gilberto
Cardoso, Rosemilton Silva, Adélia Costa, Jeanne Araújo, Nailson Costa, Salizete
Freire Soares, Jair Eloi de Souza, Hermano Amorim, Chagas Lourenço, Alessandro
Nóbrega, entre outros escritores do RN.
Não sei baseado em que teoria era
comum no meu entorno acreditar-se de que as pessoas que estudavam muito e liam
muito poderiam perder o juízo, tal mito era ilustrado com diversos exemplos de
pessoas que tinham ficado “loucas” por estudarem ou lerem demais. E este mito
fazia com que a minha mãe desligasse as luzes de casa e me proibisse de ler até
altas horas. Como a casa na qual morávamos era enorme eu pegava uma vela ia
para a cozinha e ficava lendo a luz de velas. Fiz muito isto. Não enlouqueci.
Lembro-me das revistas de fotonovelas
em preto e branco, semelhantes aos gibis, o mesmo formato editorial. Depois veio
as fotonovelas coloridas, uma verdadeira revolução, um deleite para os olhos. Lia
os livros de Barbara Cartland publicados pelas Edições de ouro em formato de
livro de bolso, depois as edições da Harlequim (Sabrina, Julia, Bianca).
Revistas Tex. Sim, li muitas revistas TEx. Li também uns livros de faroeste que
vinham em formato pocket. Eram leituras maravilhosas, eu fazia viagens
estupendas pelo mundo do Texas. Como diria a contemporânea cantora de funk era
“tiro, porrada e bomba”.
Também li muitos cordéis. Por dominar
a leitura era costume ler cordéis para as pessoas da família quando nos
reuníamos. Adentrávamos nas sagas nordestinas
e no mundo romanesco presente nos escritos dos expoentes desta
literatura.
A leitura me proporcionou e me
possibilita viagens incríveis.
Ainda hoje continuo diversificando a
minha leitura. Leio jornais, revistas, encartes, bulas, textos na internet,
aliás, tudo o que publico na página do meu facebook, eu leio.
No momento estou com diversos títulos
de autores contemporâneos para ler, estou de licença prêmio do meu trabalho,
portanto, com tempo livre para me dedicar a leitura e, elegi como prioridade,
leituras de romances leves da editora Harlequim. Sempre estou visitando os
sebos aqui em Natal e adquirindo novos exemplares.
Meu sonho de consumo é fazer uma
releitura dos clássicos da literatura brasileira. Um dia eu farei. Terei um
novo olhar sobre estes grandes escritos do acervo bibliográfico brasileiro.
Considero ler uma das coisas mais
gostosas da vida.
Inclusive defendo que a leitura deve
ser incentivada e não obrigatória; tenho um filho de 12 anos que adora ler
gibis, mangás, literatura de ficção científica e Júlio Verne, Harry Potter, entre
outros. Nunca o obriguei a ler um livro. O processo pelo gosto de ler foi
natural, possivelmente me viu como exemplo e está incentivando o pai a ler.
Leiam. Leiam sempre. Leiam por prazer.
Leiam por necessidade. Leiam romance, poesia, cordéis, revistas, artigos
científicos, ficção, novelas, artigos informativos, textos de autoajuda, autores
contemporâneos, autores clássicos, leiam. Leiam o que lhes convier. Afinal, a
leitura nos proporciona viagens inimagináveis.
Natal(RN), 15 de setembro de
2019
Muito bela sua história de envolvimento com o mundo da leitura! Parabéns! Isso explica a pessoa maravilhosa que vc é.
ResponderExcluirQue maravilha amiga! Saber, ou seja, confirmar que também és amante da leitura. Naquela época lá no Zilá Mamede víamos um pouco deste teu lado leitor. Eu continuo trabalhando em sala de leitura/ biblioteca, e amando o que faço. Vejo em sua história leitora,algumas semelhanças entre nós. Até porque somos interioranas( cidade do interior). Saudades. Até mais...
ResponderExcluirQue texto delicioso, professora. Eu vi minha juventude em muitas de suas leituras.
ResponderExcluirParabéns pela maneira como conduziu o mesmo, nos mostrando o verdadeiro sentido de uma leitura prazerosa. Beijo, que Deus a abençoe sempre. E boas leituras!!
Que lê aprende a pensar. Quem pensa sabe o que faz. Parabéns pela história de vida contada numa texto irretocável! E obrigado por ter me lido, fico muito feliz com a citação entre tantos bons mestres da nossa literatura.
ResponderExcluirSeu gosto pela leitura lembra o meu. Vários trechos de seu texto se aplica na íntegra a minha vida. Como você, também "virei' professor. Como essas coisas estão conectadas, não é? Quem busca conhecimentos tem o prazer de reparti-los!
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