terça-feira, 20 de janeiro de 2015

CONFISSÃO DE UMA FOLHA DE PAPEL


Autor: Jonh Morais

Eu sou o simples papel de branco tom
Que oferece suas folhas para escrita,
Sou rascunho nas obras de um artista
Lugar vago que muitos mostram dom
Porto as marcas de um beijo com batom
Numa carta bem feita pela amada
Faço jus a palavra digitada,
Trago textos bonitos e cumpridos,
Guardo feitos e fatos ocorridos
Sendo arquivo de data já pasada.

Quantas vezes na noite iluminada
Companheiro me fiz aos bons poetas
Que escreveram histórias bem completas
Pela linha que em mim se fez grafada,
Mas por vezes suponho valer nada
Quando sou desprezado na lixeira
Amassado na mão que foi parceira
E que agora me atira desprezível,
Perco essência, valor e baixo o nível
Sinto ser nada mais do que poeira.

Mas eu passo de fato a vida inteira
Entre os muitos cadernos de sua escola
Me corrompo por vezes sendo cola
Repassada nas provas tão faceira,
Nos diários eu provo a verdadeira
Amizade e me faço confidente,
Pelos livros me torno tão envolvente,
Levo a mente a vagar pelas histórias
Encantadas, de guerra, drama e glórias
Que você se entretém saudosamente.

Quantas vezes também me fiz presente
Nos projetos e plantas de engenheiros,
Nos malotes de cartas dos carteiros
Na receita prescrita ao paciente,
Nas agendas eu fiz corretamente
Os arranjos de tempo e de horários,
Nas gavetas morfadas dos armários
Quantas vezes me senti tão inútil
No dinheiro, porém, me sinto útil
Quando sou recebido nos salários.

De papel se produzem dicionários,
Cadernetas, os atlas, as passagens,
No papel se escrevem as linguagens
As receitas, as contas, formulários
Contra-cheques de muitos funcionários
Os recibos, convites, os recados
Redações, as resenhas, os ditados
Os jornais, as revistas, as grafias,
E se estuda também infindos dias
Pra ganhar de papel, certificados.

No papel é que alguns advogados
Buscam brechas nas folhas de um processo,
E que a senha abre a porta para o acesso
Numa festa ao chegar os convidados,
Nos papéis que se tornam carimbados
Se confirma o valor e a garantia,
Nos panfletos se chama a freguesia,
De papel, um barquinho se balançaZa
Pra trazer o sorriso pra criança
Estampando seu rosto de alegria.

Quantas resmas se vão no dia-a-dia
Na impressão de apostilas, manuais,
E nas Xerox, nas fotos quantas mais
São findadas sem ter muita porfia,
Bibliotecas tais quais de Alexandria,
De papel a formar grandes jazidas,
Com estantes infindas, divididas
Tem-se a bíblia que é feita de papéis
E as histórias escritas nos cordéis
São papéis pelas cordas estendidas.

Sou papel entre mãos estarrecidas
Que pontuam um simples desempenho,
Sou papel onde se faz um desenho
De momentos ou coisas já vividas,
Sou papel nas paredes exibidas
Que decora castelos e salões,
Que compõe a figura dos cartões
Onde lê-se: FELIZ ANIVERSÁRIO!
Sou papel em argolas de um fichario
Transitando nas grandes multidões.

Sou figura notável das junções
Das paredes de pura celulose,
Que aparece também na apoteose
Em confetes e em mil decorações,
No origami me viro entre dobrões
Pra atingir os anseios de um pedido,
Pelas traças me vejo corroído
E assim morro na tal putrefação,
A seguir minha vil contradição,
Feito simples papel embranquecido.

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