segunda-feira, 3 de junho de 2024

SEM OFENSAS

 


SEM OFENSAS


Tenta-se seguir a cartilha de ser grato, mas o fator comparação deita por terra todos os manuais de humildade. É difícil não se comparar quando se sabe que há pessoas que ganham setenta milhões por mês. Olha-se para si e vem a pergunta: onde foi que errei? 

Percebe-se que o humano não suporta viver sem se comparar, e isso foi pensado ao nível muito acima da nossa compreensão para manter a corrida dos ratos a todos vapor. Quando se cobiça algo, logo aparece a régua da comparação dando pilha para que um norte seja traçado.

A dança compete com exercícios físicos para exemplificar que precisamos seguir os outros tentando espantar a tristeza que se enrosca na cabeça igualando-nos a formigas atrás de açúcar. Você é produto das informações que absorve, dizem os defensores da cultura explicando o porquê de seguir o outro num estilo boiada.

Os pessimistas dizem que basta nascer para ser mais um integrante do reino da falta. Falta alimento, ar puro, água limpa..., de forma que quem nasceu, lascou-se. Desde o momento em que sai do útero, o humano está destinado ao sofrimento, e não adianta colocar o slogan de "tudo bem" quando se é perguntado. 

Viver num mundo gerenciado pelo bem é pura ilusão. A medida do "ter" está aí para misturar conflitos que deságuam num ser inquieto, frustrado e que morrerá sem nunca encontrar sua verdadeira identidade. 

Vivemos num mundo de escassez e medo. Falar no mal é chamar o próprio mal? Ledo engano. O mal vem de qualquer maneira, quer seja ou não invocado. Todos os dias, a dor nos vigia. Basta ficar sem comer e beber que o que chamamos de fome ou sede nos ataca independentemente da classe social, cor da pele ou idade.

Estamos no mundo real dos vivos, e como tal, sentimos dores até na alma, e para compensar somos levados a pagar para alguém nos dizer que somos abençoados. Só que isso é características de quem é impotente diante da complexidade do que é viver sem ter autonomia de voo, e ai daquele que cair nessa conversa fiada que um dia encontrará um lugar de perfeita paz. Tanto é mentiroso quem fala como quem acredita.

Buscamos mascarar a realidade pagando para pronunciarem o que queremos ouvir. Procissões são organizadas, gritos e até um livro com modelos de frases são impressos para que acreditemos que somos filhos do bem, vivendo para o bem e recebendo a graça como se quem seguisse rituais estivesse livre da escassez.  

Templos estão lotados em busca por mensagens de bênçãos com o intuito de despistar a verdadeira realidade humana. Sejamos reais, pelo menos amenizaremos as carências inatas que estamos fadados a carregá-las.

Um dia cheio de alegria é  a preparação para uma tarja preta ser necessário para inibir os neurônios rebeldes. Dizem que a pessoa é feliz e ela não tem nem coragem de dizer que não é. Sim, tenho que acreditar que sou feliz porque o mundo da mentira não aceita ninguém confessando sua angústia.


Heraldo Lins Marinho Dantas 

Natal/RN, 03.06.2024 - 18h40min.

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