INTERESSES DESVIADOS
Saí desconfiado do consultório, logo eu que tenho o costume de ser pontualíssimo, nesse dia "pisei na bola" dormindo além do cantar do galo. “E não foi pra menos.” No dia anterior, aconteceu minha despedida de solteiro onde “apaguei” nos braços de uma que se eu não tivesse compromisso seria com ela que me casaria. Que mulher! Assim que chegou, já foi arrancando os cabelos dos meus ouvidos tentando evitar comentários maldosos dos que vão à igreja só olhar os defeitos dos noivos.
Confesso que cochilei em seus braços, entretanto logo fui despertado por um espirro quando ela começou a puxar os do nariz. Nessa sessão de tortura capilar, quase não se pode dormir. Entre espirros e beijos, ela desceu a pinça. A ordem da futura patroa era para que não ficasse sequer um fio pendurado nas partes mais requisitadas em uma lua-de-mel. A especialista arrancou, com os dentes, os que ficavam escondidos debaixo do "armazém de bebês," e as contrações e alívios foram responsáveis pelo sono "atrasador."
Cheguei ao dentista suando frio e com um grande tremor nas pernas. Uma fraqueza ainda está me acompanhando aqui no trânsito. Neste momento a noiva liga. Alô!? Venha! O pessoal está esperando para o ensaio.
Chegue aqui para que eu possa ver se a depilação ficou boa. Arriei as calças a mando da minha noiva. O que é isso? Isso o quê? Parece que seu saco foi mordido. Estranho... Deve ter sido muriçoca. Hum...! Vamos voltar para o salão.
O "ensaiador de cerimônia” parecia querer terminar logo aquela chatice. O noivo fica no altar com a mão no bolso segurando a vontade de "pegar" a noiva, dizia ele andando "pra lá e pra cá" enquanto jogava o cachecol para trás, mesmo com um calor de "quarenta graus."
Vê se consegue se separar e tenta logo um outro noivado para que possamos fazer mais uma daquelas, disse o organizador de bacanais. O que vocês estão conversando?, perguntou minha querida. Nada não, estamos só recordando o tempo que pulávamos cerca para assistir circo de graça. Vamos "passar lá em mamãe," ordenou ela puxando-me pelo pescoço chupado.
Oi minha sogra, tudo bem? Tudo bem nada! Hoje pela manhã veio uma mulher dizer que a filha dela está “buchuda” de você, o que me diz!? É mentira, eu já fiz vasectomia há mais de um ano. Quer dizer que você não vai me dar netos? Mamãe, eu que sugeri porque também não quero ter herdeiros. Então, puxem daqui!, falou brava apontando o dedo em direção à saída, e “matracou:” vocês dois deviam ter vergonha de querer só viver viajando. Um dia alguém tem que tomar conta das empresas, e vai deixar nas mãos dos de fora, é? Mas basta decidirmos pela cirurgia de reversão. Vou transferir cinco milhões para a conta de vocês, mas esse neto tem que sair. Faço por dez! Nove e ninguém fala mais nisso.
O menino de nove milhões nasceu com sete meses de gestação oficial. Deu muito trabalho para minha noiva esconder os dois de gravidez, mas precisávamos explorar a velha bilionária. Ela se apossou do menino e continuamos como sempre, a diferença é que agora as viagens estão sendo realizadas no nosso próprio barco.
Vovó, os meus pais me abandonaram, foi? Não meu neto, eles estão trabalhando em alto mar. Inventaram de criar um canal de viagens e vivem postando luxo “com caras e bocas.” O meu coleguinha disse que a senhora parece um homem. Mande esse seu coleguinha ir para a casa da “mãe de pantanha.” Quem é essa, vovó? Mande, e deixe comigo!
A senhora foi chamada aqui porque seu neto... Ele mandou o coleguinha e eu mando você. Vou comprar a escola e botar você pra fora, está ouvindo seu safado. Aqui está a transferência. A senhora pode comprar outra porque esta não está à venda. Esse menino não tem pai não? E mãe também, só que está sob minha guarda, e outra: não devo satisfações a você. Passe bem!
O diretor ficou quieto olhando para a jovem que fazia a limpeza da sala. Aquela menina nem precisou trazer currículo para trabalhar no seu gabinete, e naquele momento ele estava com vontade de esquecer as agressões sofridas há cinco minutos. Fechou as cortinas e mandou ver.
Na sala dos professores, os comentários rolavam em torno daquele "amancebo". A menina, filha da secretária, fora apresentada em uma festa de final de ano. Chegou com o namorado a convite da mãe, mas logo deixou de amá-lo a pedido do diretor. Seu vestido preto em forma de tubinho colante mantinha aquele coroa “babando” todos os dias.
Numa noite qualquer, aquele senhor de bigode "hitleriano" precisou ser socorrido pelo excesso de estímulos eróticos. Atualmente, já separado da esposa, mantém a jovem fingindo que limpa o chão para despertar nele as fantasias adormecidas desde o tempo de adolescente quando o pai viúvo o deixava sozinho com a diarista.
Seu império já havia sido maior, porém depois das quatro separações, aquele homem de cinquenta anos e quatro filhos sentia-se injustiçado pelas ex-mulheres que dilapidaram seu patrimônio. Restava apenas seu jeito esquisito de fazer tudo por uma novinha, e por esse motivo estava sendo alvo dos comentários.
Tem coragem de bater na porta e pedir aumento? perguntou um dos professores ao que sempre organizava as assembleias. Vá você! Brincadeira tem hora e não quero ser demitido, logo agora que estou construindo no terreno que comprei ainda solteiro. Todos os que estavam lanchando, empolgaram-se em saber sobre o projeto do colega sem nem dar mais ouvidos aos barulhos ritmados vindos da sala vizinha.
A conversa dos professores foi interrompida e direcionada para a reportagem de um casal que estava completando sua segunda viagem ao redor do mundo. Eles já tiveram o filho estudando nesta escola, disse a secretária saindo às pressas junto com os socorristas que foram chamados para levar o diretor infartado para o hospital.
A jovem da limpeza permaneceu na sala reprisando a reportagem. Tentava com isso vivenciar o quanto foi maravilhoso depilar aquele que se apresentava na tela como sendo o “explorador dos sete mares.”
Heraldo Lins Marinho Dantas
Natal/RN, 24.03.2023 - 21h45min.
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