A CORAJOSA
I
Peço atenção dos senhores
Para narrar este fato
Falar de uma senhora
Que correu dentro do mato
Meia légua de carreira
Com uma foice roçadeira
A fim de matar um gato.
II
Era um gato vermelho
Da raça maracajá
Que vinha fazendo estragos
Nos terreiros do Jucá
Peru, galinha ou guiné
Que ele botasse o pé
Não conseguia escapar.
III
O tamanho desse gato
Causava admiração
A cabeça muito grande
O rabo arrastava no chão
Que visse ele tremia
Porque só se parecia
Com um filhote de leão.
IV
Aqui nesta região
Ele se tornou freguês
Ninguém pode avaliar
Os estragos que ele fez
Numa continha que fiz
Só das galinhas de Assis
Ele pegou dezesseis.
V
Todo bicho respeitava
A faxina de Daxinha
O gatão pulou por cima
E agarrou uma galinha
Pulo pra trás novamente
Com a bichinha no dente
A mais bonita que eu tinha.
VI
No terreiro de Ione
Ele deu um grande abalo
Só pegava no pescoço
Chega se ouvia o estalo
Por incrível que pareça
De uma doze cabeças
Agora só resta o galo.
VII
Foi nas galinhas de Lila
Desceu pra João Xavier
E lá em Manuel de Lila
Devorou até guiné
Chegou em dona Geralda
Deixou galinha de fralda
Nas barbas de jacaré.
VIII
Dedé fez uma tocaia
De clavinote na mão
O gatão desconfiou
Seguiu noutra direção
Falou, ao chegar do mato:
Quem vai matar este gato
São os filhos de Capitão!
IX
Foram chamar os meninos
A tocaia foi formada
Capitão veio também
Que é prático em emboscada
Nenhum avistou o gato
Voltaram tristes do mato
Porque perderam a caçada.
X
Assim, emprejuizado,
Foi à casa de Dedé
Disse: quero a espingarda
De dois canos eu tenho fé
Viu o gato logo cedo
Mas quando puxou o dedo
Só fez quebrar catolé.
XI
Ficou muito chateado
Lamentando o que se deu
E disse: esse caningado
Não come mais o que é meu
Pegou um resto que tinha
De pinto, frango e galinha
Levou pra feira e vendeu.
XII
Esse gato transformou-se
Num verdadeiro terror
Dando um grande prejuízo
Nas criações do setor
Mas o ditado não passa:
Que tem o dia da caça
E o dia do caçador.
XIII
Um dia, dona Geralda,
Escutou uma zoada
Deu de garra numa foice
E entrou na mata fechada
Viu o gato em sua frente
Rosnando e mostrando os dentes
Ficou toda arrepiada!
XIV
Ela chamou o cachorro
O gato se escapuliu
Jacaré pegou o rastro
Com pouco tempo latiu
E a velha ali na costela
Mas o gato avançou nela
Que até a foice caiu.
XV
Ela pegou um porrete
Com coragem e muita fé
O gato correu de novo
Ela gritou: Jacaré!
Com tanta disposição
Que o gato tirava a mão
E a velha botava o pé.
XVI
Quanto mais ela corria
Aumentava sua ira
Com o rosto todo arranhado
A roupa só tinha tira
Não respeitou pau-a-pique
Touceira de xique-xique
Palmatória e macambira.
XVII
O gato viu-se apertado
Parou e ficou em pé
Partia para o cachorro
E a velha com muita fé
Avançou com um porrete
E dizia: tome cacete!
E pegue o bicho, Jacaré!
XVIII
Com meia hora de luta
O gatão esmoreceu
Jacaré criou coragem
Com os gritos que a velha deu
Agarrou-se no gogó
Com uma mordida só
Caiu no chão e morreu.
XIX
Ela arrastou este gato
O sol quente como brasa
Subindo e descendo serra
Coitada, quase se arrasa!
Foi grande a sua agonia
Gastou quase meio dia
Pra poder chegar em casa.
XX
Tiraram o couro do gato
Dedé foi quem espichou
Como não tinha medida
Uma base se tirou
Seu Severino é quem diz
Era menor do que Zé Luiz
E maior do que João Arnô.
XXI
Aqui termino a história
Não pensem que foi boato
Também não fiquem zombando
Se não vão pagar o pato
Acredite quem quiser
Mas não brinquem com esta mulher
Pra não morrer como o gato!
XXII
Eita, que mulher disposta!
Isso é que é mulher valente!
Mulher que entra na mata
Luta e vence uma serpente
Eu faço até promessa
Pra nunca ver uma dessa
Com raiva na minha frente!
Autor: JOSELITO FONSECA DE MACEDO, vulgo DAXINHA.
JOSELITO FONSECA DE MACEDO, mais conhecido como poeta Daxinha, nasceu em Cuité/PB, em 14/08/1938. Filho de José Adelino de Macedo e Maria Marieta da Fonseca, nasceu na zona rural de Cuité, mais precisamente no Sítio Boa Vista do Cais, popularmente conhecido como Sítio Pelado. Aos 20 anos, viajou para os estados de Minas Gerais e Goiás, onde trabalhou como agricultor e vaqueiro. Mas foi no estado de São Paulo que se fixou, trabalhando como metalúrgico nas principais usinas siderúrgicas da região do ABC paulista. Retorna à Paraíba em 1985, retomando suas funções de agricultor. Sempre gostou de poesia, sobretudo, do gênero cordel no qual, ainda menino, já escrevia seus primeiros versos. O retorno a Cuité aproximou-o ainda mais de suas raízes, fazendo-o mergulhar com mais fervor no mundo da poesia. Sempre convidado a se apresentar em eventos culturais da cidade, seus versos focavam, principalmente, no cotidiano das pessoas simples – como ele mesmo o era. Tem como obras publicadas um CD de poesias intitulado: “Poeta Daxinha – Um Amante da Poesia”, o cordel “O batente de pau do casarão” e uma participação póstuma no livro “APOESC em Prosa e Verso”, do também poeta Gilberto Cardoso dos Santos. Casado, pai, avô e bisavô, o poeta Daxinha faleceu em 04/05/2016, em Campina Grande/PB, vítima de insuficiência cardiorrespiratória. (Jaci Azevedo, filha)
Kkkkkk maravilhoso!!! Fatos verídicos, viu? Eu me lembro dessa história...
ResponderExcluirGratidão, Gilberto!! ❤️