quarta-feira, 3 de agosto de 2016

A OUTRA MULHER DO BÊBADO - Joel Canabrava



A OUTRA MULHER DO BÊBADO

“O que a bebida não fizer outra coisa não faz”. Frase estereotipada, consagrada e confirmada pela ciência prática de gregos e troianos.  Geralmente, os que se arriscam nessa aventura estão sujeitos as mais variadas peças de Baco – nunca vi bebum com tanta criatividade.
Este introito serviria para incontáveis situações em que a bebedeira proporciona alguma  situação incomum ou poderíamos dizer comum? O certo é que aqueles que se põem a beber para comemorar  a bebedeira do dia anterior, por exemplo,  extrapolando risos e distribuindo felicidade, uma vez na vida, terá a “honra” de entrar para o livro cômico das bobeiras do deus do vinho. Pois bem, vamos a um desses capítulos.
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Samuel, muito calmo, homem metódico, compromissado com o trabalho e com a família. Acorda cedo, vai para o trabalho, é gerente numa loja de carros, almoça, faz as atividades de mais um curso à distancia e, completa o seu rito laboral até as cinco da tarde. É um homem de bem, só tem um defeito: bebe muito. E, se ele tem ritual para o trabalho e compromisso com a família, a fidelidade à saidinha com os amigos todo fim de tarde para “bebeborar” mais um dia de serviço é sagrada. Mais sagrado ainda é estar em casa às sete. Samuel tem uma filha linda e vai ser pai outra vez. Iza está grávida de seis meses.
Iza, alma amorosa, é uma mulher muito religiosa e muito trabalhadora também; dirige uma creche. Tem hábitos milimétricos também; acorda muito cedo, reza, faz o seu papel de mãe e de esposa e vai ao trabalho. Mulher responsável e atenciosa no serviço. Só tem um defeito: ciumenta demais. Fica muito nervosa, por exemplo, se o marido demora a atender o celular e chega um segundo atrasado em casa. E, para completar, detesta bebedeira. Parece uma sina toda mulher “de bem” casar com um pinguço. Imagine a confusão toda vez que o marido chega “melado” em casa.
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Cinco da tarde de uma sexta e os amigos já aguardam “Samu” no bar de Toni. A resenha é grande entre amigos. Zoam uns aos outros, relembram casos da infância, contam piadas, inventam e aumentam histórias, às vezes, as mesmas histórias. É uma bela ocupação para “passar o tempo” como dizem.  
E passou mesmo. A conversa se estendeu muito e  Samu só se deu conta duas horas depois do seu horário habitual de estar casa quando um barulho ensurdecedor adentrava a varanda do bar. Era Iza  abrindo  a bíblia e rezando uma missa de palavrões para cima de Samu e de quem não quisesse ouvir.
– Samuel, seu vagabundo, porque tu não atendeu o celular. Até essa hora na rua com essa cambada de desocupado. Tu ‘tá pensando o quê?  ‘tá pensando em beber a vida toda? Eu não aguento mais. Eu vou embora! Olha, hoje tu vai dormir é na rua! ‘Tá pensando que vou ficar acordada esperando tu chegar e abrir a porta pra ti?!!
Samuel,  olhou para Iza, paciente e ironicamente. –  Ah, é desse jeito?!! Não vai abri a porta pra mim? Vai me deixar na rua? –   Pegando o celular, continua –  pois, eu vou já ligar aqui para uma mulher que eu tenho certeza que ela me deixa dormir na casa dela. Essa sim gosta de mim.
Iza, elevando o seu cosmo de fúria, avançou em Samuel, tomou o celular para si, quebrando completamente o inocente aparelho na calçada. Samuel  olha para a mulher enfurecida e calmamente, mais uma vez, diz:
–  Quer dizer que eu não posso nem ligar pra minha mãe não, é? 
O dono do bar, todos que estavam ali silenciosamente observando aquela cena, Iza e Samuel caem copiosa e ridicularmente na gargalhada. Tudo ficou bem,  muito bem, menos o coitado do celular..






Um comentário:

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