Li outro dia sobre uma pesquisa que mostrou maior longevidade para pessoas que cuidaram bem dos dentes, só que, por trás dos dados estava o fato de que quem cuidou bem dos dentes, consequentemente cuidou bem do corpo. Era dente-corpo e assim a parte apontava ou denunciava o todo. Foi no texto recente que li de um educador, em seu pedido explícito para que os professores recém-nomeados no Estado exercessem sua função com AMOR, que não percebi essa relação concatenada da parte com o todo. O que vi na exposição do autor foi mais uma demonstração clara do quanto precisamos repensar nossa educação, pois, num raciocínio bem simplista, se colegas com licenciatura foram submetidos a uma seleção, aprovados num concurso e convocados para o cargo, subentende-se que estão indo à escola para agirem com profissionalismo e, se assim é, as boas vindas dispensam pedir que exerçam sua função com amor, com responsabilidade, com compromisso, com empenho ou com o que quer que seja, pois neste caso me parece redundante, desnecessário, tanto quanto o é fazer pesquisa sobre cuidar bem dos dentes, quando se cuida tão bem do corpo.

Em educação é comum agirmos assim e não teria minha implicância se ao contrário da pesquisa com os dentes, não ficasse evidente a denúncia do olhar desviado do todo, na tentativa de salvá-la nas partes. O pedido também reforça a ideia de que ser professor no Brasil está mais para o exercício de um ofício do que de uma profissão e incomodam-me os discursos que tentam resgatar a auto-estima do professor-coitadinho ou que tenta contê-lo pela sensibilidade no seu despreparo em lidar com sua clientela: trate-os com amor, trate-os com respeito, trate-os com carinho! Não me passa pela cabeça que um profissional aja, se não, respaldado primordialmente pelo conhecimento científico de sua respectiva área de atuação, pelo código de ética do conselho a que pertence, pela legislação em vigor e por um processo humanitário construído ao longo de sua formação. Essa é a lógica.
Mas entendo a rogativa do colega em seu texto, pois tenho exemplos dolorosos de professores discordando de teóricos, de estudiosos, simplesmente por discordarem, sem se dedicarem a uma experimentação e sem nenhuma referência bibliográfica que lhe dêem respaldo. A referência para refutação quase sempre são nossos achismos e assim rotulamos tudo com nossas marcas de descrença, exceto na maneira calejada de fazermos a mesma coisa, da mesma maneira, com o fracasso das estatísticas de sempre. Se o assunto é religião, homossexualismo, prostituição, trabalho infantil, palmadas…, vale muito nossa opção religiosa, nossos preconceitos e a tábua de salvação do senso comum. Enquanto que, estar fundamentado no conhecimento, nas pesquisas, nas ciências da educação, na legislação atual e no complexo emaranhado de situações que permeiam o processo ensino-aprendizagem é fundamental para o exercício da profissão-professor.
Esta semana numa reunião de professores ficou evidente que ali não se conhecia o Plano de Cargo, Carreira e Remuneração deles mesmos e de repente ocorreu-me de imaginar sobre o que sabemos com relação à legislação, normas, decretos educacionais e até Estatuto da Criança e do Adolescente, dos meninos sob nossa responsabilidade. É por isso que educação no país está banalizada e qualquer um pensa poder adentrar numa escola e assumir uma sala de aula, sendo que em muitos casos os danos em pouco se diferenciam e de vez em quando o aluno perde menos.
Falta-nos, portanto, profissionalismo e não adianta apenas atacar as partes nomeando culpados, reivindicando melhoria salarial, amor pelo que faz, empenho, compromisso… ou dedicação. Educação precisa ser vista no seu todo, no bem mais complexo, e esse todo começa por nossa formação. Enquanto não detivermos essa reprodução desenfreada da cultura educacional que temos, enquanto educação não for capaz de atrair as melhores cabeças, com profissionais de uma formação autônoma, norteada pela dedicação ao conhecimento científico e pedagógico, precisaremos de esforço para acreditar em mudanças. Até lá, insistiremos com nossas fórmulas e formas pré-concebidas, cópias reproduzidas, programas revitalizados em suas datas de validade, com uma formação quando muito ali da esquina, que motiva quase sempre somente a ânsia por alguns dígitos a serem acrescidos no nosso contracheque, depois de um longo processo e, por último, lá mais para o final do mês.
Prof. Maciel – Japi/RN.