ARMADILHA DO AMOR

 

ARMADILHA DO AMOR

Entre. Não, não vou entrar, vim só trazer este creme dental, se é que ainda usa. Sim claro, uso, e mais ainda quando é entregue por uma mulher tão interessante quanto você, não há como resistir. Fale baixo senão vai acordá-lo. Então coloque ali na pia. Ele estava querendo que ela entrasse no quarto para só assim executar o que havia planejado desde cedo quando a viu saindo da piscina em trajes minúsculos. Suas investidas, ultimamente, estavam sendo frustradas, e ali poderia acontecer novamente, motivo maior de se encontrar um pouco nervoso. 

Não posso querer mudar a trajetória da minha vida fazendo amor com um cara como você, olhou de lado para a janela que dava para a imensidão do mar. Significa minha perdição, se eu passar dessa porta. Desamarrou o roupão amarrando-o novamente a pretexto dele ver que não usava roupa de baixo. Um orgasmo a mais não vale tanto assim. Ele levantou os olhos brilhantes de desejo e... Deixe de artimanha! Convenhamos que é o único objetivo dos seres humanos. Se fosse uma adolescente, até que se tolerava, mas já passamos do cabo da boa esperança. Ele sempre foi um filósofo incompreendido. Venha enquanto temos vigor físico.  

Ela fez menção de ir embora, porém deu meia volta e explicou que não podia fazer o que tanto desejavam. As travas do matrimônio a impediam de ir adiante tendo consciência que naquela relação ela sairia em desvantagem. Você só tem a perder a amizade do meu marido, se é que você valoriza. Claro que valorizo, no entanto estou carente. Seus cabelos longos e agora penteados, transmitia um certo erotismo naquela mulher de classe alta, acostumada com tudo bem arrumado e limpo. Se eu fizer isso, não me perdoarei, além de colocar a paz familiar em jogo, disse lembrando-se dos dois filhos que estudavam fora do país e que sempre ligavam expressando o maior carinho por eles. 

Ninguém vai saber!  Ele continuava passando a língua entre os lábios. É só por uns instantes. Não seria fácil suportar a censura de ser descoberta fazendo amor com um amigo do meu marido no quarto de hóspedes, enquanto dizia isso ele não dava muita importância cuidando apenas em mostrar também o produto da sua excitação. Ela afastou-se um pouco ao vê-lo tão afoito.  

Se não quer algo comigo, por que veio? Ela ficou um pouco sem saber o que responder, contudo... Pode ser amanhã no meu consultório. Tenho um horário que deixo vago para utilizar como quero, e você pode ir à minha procura dizendo que quer marcar consulta. Claro que deve chegar cedo e esperar como se fosse um paciente comum. Não sou de viver em fila. Ela revirou os olhos e puxou o canto da boca ficando em silêncio, pois esperava uma reação menos agressiva. 

Seu marido quer que eu fique morando aqui, o que acha? Por mim tudo bem. Ele se deu bem, e eu um mendigo que guardo as lembranças de tê-lo ajudado quando não tinha onde morar, deve ser essa a causa maior da hospitalidade. Acho que você faz parte do pacote de boas-vindas, ironizou. Ele me falou que você sempre foi de um sarcasmo surpreendente, mas eu não achava que fosse tanto.  

No quarto ao lado, o marido espionava através das câmeras escondidas. Ela sabia que estava sendo monitorada, por isso mantinha-se calma mentindo para aquele homem maduro que o havia conhecido naquela manhã. 

Era uma mulher atraente, não tão bonita, mas tinha o quê que hipnotizava os do sexo oposto. Vou buscar um suco para você. Por favor, traga-me também um cigarro. Ele vivia perambulando até que seu amigo o encontrou dormindo debaixo da marquise do complexo hospitalar onde ela trabalhava. Você vai ficar no quarto de cima e pode usá-lo por quanto tempo quiser, disse-lhe na hora do almoço entregando-lhe a chave que dava para o portão ao lado.

Ela foi, trouxe o prometido menos o cigarro. É melhor você parar de fumar. Eu já parei há muito tempo, só que quando estou empolgado me dá vontade. No momento em que ia devolver o copo vazio, conseguiu puxá-la pelo braço. Ela ainda quis se desvencilhar, mas vendo que aquele homem estava decidido a estuprá-la... Tudo bem! Se está insistindo tanto, deixe-me só ir aqui ao banheiro e já volto. Ele ficou se despindo, porém não resistiu ao sonífero colocado no que acabara de beber. 

O marido abriu a porta encontrando-o em sono profundo. A equipe de enfermagem cuidou de fazer os exames de praxe, com ele sedado, confirmando boa saúde. Os pacientes que necessitavam de órgãos foram avisados para se dirigirem ao hospital, pois haviam encontrado mais um doador compatível, enquanto a médica revisava a lista dos novos amantes tentando encontrar mais um que ninguém sentisse sua falta caso desaparecesse sem deixar vestígios.  

Heraldo Lins Marinho Dantas

Natal/RN, 13.07.2023 – 20h29min.